Modelo mais rápida do mundo

Vitória Rosa sonha em representar bem o Brasil na Olimpíada de Tóquio, enquanto descobre amor pelas passarelas

Roberto Salim Colaboração para o UOL Alexander Hassenstein/Getty Images for IAAF e Divulgação

Qualquer prova de velocidade feminina, em qualquer pista do mundo, tem sempre duas particularidades:

  1. A maioria das competidoras finalistas é negra;
  2. Sempre usam penteados diferentes e requintados.

A largada de uma corrida de 100 ou 200 metros concentra habilidade, destreza e beleza em níveis iguais.

Entre campeãs e estrelas reconhecidas como a jamaicana Shelly-Ann Fraser Pryce, uma brasileira se destaca. É Vitória Rosa, com suas tranças à box braids e maquiagem feita com cuidado antes de ir para a pista. A vaidade é um ponto importante, algo que a acompanha desde sempre. E que, agora, está virando uma carreira.

A atleta de 24 anos, com Olimpíada (2016) e Jogos Pan-Americanos (2019) no currículo, está criando um portfólio consistente, também, como modelo. Sempre com incentivo da mãe, que não se cansa de dizer como a filha é linda, Vitória fez ensaios para marcas como Avon. O mais recente é esse aí em cima, da marca de calçados Shutz.

Alexander Hassenstein/Getty Images for IAAF e Divulgação

Treinos e ensaios

É possível ser atleta de alto rendimento e modelo profissional? O técnico de Vitória, Katsuhiko Nakaya, preocupa-se com o foco, mas diz não ser contra a carreira paralela.

"Que eu me lembre, o atletismo teve a Sueli Pereira, do lançamento do dardo, que estrelou algumas campanhas, recebeu convites para fazer propaganda de produtos femininos, depois posou para a Playboy. Eu não tenho nada contra, não. Só acho que nada pode atrapalhar os treinamentos. Se as fotos são feitas e não se perde o horário do treino, eu não faço qualquer objeção. Ela é que tem que saber qual é a prioridade dela", comenta. Por enquanto, as duas opções estão na mesa.

No esporte, os treinos tiveram de ser adaptados com a quarentena. "Estava pronta para os Jogos de Tóquio, mas a pandemia mudou meus planos e do meu técnico Nakaya. Eu estava treinando em São Paulo e acabei voltando aqui para a minha casa no Rio, junto com o meu noivo, o Robson dos Santos, que me ajuda nos treinos", conta.

Com a flexibilização do contato social, que o estado do Rio de Janeiro começou há algumas semanas, ela voltou a se mexer. Um pouco. "Dá para fazer saltos e exercícios de coordenação e assim ela vai mantendo a forma. A Vitória já tem índice olímpico para os 200 metros. Vai fazer com certeza para os 100 metros. E é titular do revezamento 4x100", diz Nakaya.

Entre treinos improvisados, cuidados com a pandemia e as conversas em família, Vitória admite que a carreira de modelo seduz. É um velho sonho da mãe e das irmãs que ela começou a colocar em prática aos 14 anos, quando resolveu fazer um book para levar a algumas agências de modelos cariocas.

Sempre gostei de fotografia. Gostava de me ver. E um dia falei com a minha mãe, peguei umas roupas em casa, pedi um vestido branco para minha irmã Jéssica e um maiô da minha mãe e fui fazer o álbum. Ficou muito bonito. De todas as fotos que tenho no álbum, as que gosto mais são as que fiz com o maiô e com o vestido da Jéssica."

Arquivo pessoal Arquivo pessoal

Perda da irmã aos 14 anos

A mãe Sônia não se cansa de elogiar a beleza da filha Vitória e ressalta que moda e esporte sempre estiveram presentes na família predominantemente feminina. A própria Sônia foi atleta e sabe como as coisas são.

Das oito mulheres da casa, todas praticaram esporte em algum momento da vida. Hoje, somente Vitória Rosa e Natália continuam na ativa. Aos 21 anos, Natália é a mais jovem das irmãs. Ela chegou a receber convite para defender a equipe brasileira de bobsled (aqueles trenós que ficaram famosos no filme "Jamaica Abaixo de Zero").

Na verdade, na casa do seu Genário, o pai, as meninas tinham sempre dois sonhos: a carreira esportiva e a carreira de modelo. Umas tinham mais queda para as provas de velocidade, outras gostavam muito mais da fotografia. Era o caso de Suellen, que morreu aos 14 anos, de repente.

"Ela treinava e também vivia escrevendo cartinhas em que dizia que seria modelo, que conheceria o mundo", comenta Sônia. "Mas um dia, depois de tomar o café, a minha pretinha saiu para o treino com a irmã mais velha e, no caminho, assim do nada, teve um aneurisma cerebral que explodiu, e ela morreu. Nunca tinha tido nada, a minha pretinha... Alta, de 14 anos, que sonhava com as medalhas do esporte de alto nível e com as passarelas da moda. Vivia colocando roupinhas nas bonecas e dizendo que ia desfilar como ela. Magra, alta, muito alta. Eu imagino até hoje ela desfilando".

Divulgação

Vitória nasceu em um caminhão e agora realiza o sonho da irmã

O caminho que Sônia tinha imaginado para Suellen veio para outra filha, que nasceu na cabine de um caminhão. As dores do parto vieram de madrugada e o pai Genário, como não tinha carro, saiu desesperado pelas ruas do bairro de Paciência, em Santa Cruz, atrás de ajuda. Conseguiu parar um caminhão. O motorista concordou em levá-los a um hospital, mas como a menina nasceu para ser rápida, acabou nascendo no caminhão, mesmo.

"Foi uma vitória", conta, sempre emocionado, o pai Genário. Daí o nome da filha número seis, que realiza o sonho da irmã e da própria mãe. O primeiro trabalho na moda foi para a revista Glamour, quando tinha 21 anos.

"Era uma revista de moda. E eu fiquei animada, porque desde que treinava com o Robson Alhadas, no Cefan, já pensava em ser modelo. Era uma coisa que estava em minha mente. E tinha o incentivo de minha mãe em casa, porque ela sempre teve o pensamento aberto e nos animava bastante. Na verdade, naquele tempo, eu nunca achava que ia ser a atleta que hoje eu sou. Mas está aí o resultado!", comemora Vitória Rosa.

Depois veio o convite para uma campanha da Avon. Mais recentemente veio o lançamento da coleção de bolsas e sapatos da Schutz, empresa que usou mais duas atletas como modelo de sua campanha outono-inverno: Nathalie Moellhausen, da esgrima, e Gabriela Nicolino, da vela.

"Agora, estou até esperando as datas para uma nova campanha. Já fizeram até contato para mais fotos", conta Vitória, que vê paralelo entre as duas carreiras. "Eu já tenho essa vaidade de me arrumar para as provas. Eu gosto de me ver em cores neutras. Naturais. As outras meninas são mais coloridas, não é? Usam verde, rosa. Eu procuro também usar as tranças diferentes. Levo normalmente 40 minutos para me aprontar, mas também depende de como está a autoestima no dia. Se eu estiver lá em cima, eu me enfeito mesmo! Mas se estiver em baixa, ajeito o cabelo, uma maquiagem rápida e pronto".

No sobrado da rua Trinta e Sete, casa 2, no Conjunto Urucânia —no bairro de Paciência, Zona Oeste no Rio—, todos esperam a próxima campanha a ser estrelada pela filha. Seu Genário adorou a última. "Ele achou tudo grandioso e minha mãe ficou toda boba. Eu mesma não acreditava que faria tanto sucesso como modelo".

A família também espera o fim da pandemia para torcer para Vitória brilhar também nos Jogos Olímpicos de Tóquio.

Washington Alves/COB Washington Alves/COB

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