Você cumpre a quarentena?

Pesquisão UOL: nem todos os jogadores estão ficando em casa. Alguns, porém, têm boas justificativas para isso

Do UOL, em São Paulo Alessandra Torres/AGIF

Você está em casa? Fique tranquilo: a maioria dos jogadores do seu time do coração também está. É isso que mostra o resultado do Pesquisão que o UOL Esporte fez sobre os efeitos da pandemia do coronavírus sobre o futebol brasileiro.

A reportagem ouviu 56 jogadores e técnicos da elite do futebol brasileiro para saber sua opinião sobre três temas: calendário (eles querem o Brasileirão completo, com estadual encurtado), redução salarial (a maioria aceita negociar) e quarentena (eles são a favor da medida sugerida pela Organização Mundial da Saúde). Neste sábado, a pergunta é mais direta: você está cumprindo o distanciamento social? A maioria dos esportistas ouvidos disse que sim. Entre todas as respostas que a reportagem recebeu, apenas um disse que não está cumprindo a quarentena — as respostas são anônimas.

Mesmo minoria, existem atletas que se negam a ficar em casa e são criticados por isso. Conheça agora alguns casos. E, spoiler, nem todos estão na rua sem um motivo justo...

Divulgação

Neymar foi criticado, mas quarentena com "parças" está liberada

O período de quarentena reservou mais uma polêmica para Neymar. O atacante postou fotos nas redes sociais em sua casa em Mangaratiba, no Rio de Janeiro, e foi criticado pelo jornal espanhol "Mundo Deportivo", que acusou o atacante do PSG de não estar respeitando o isolamento. As críticas incomodaram o jogador, que não estava infringindo as normas de distanciamento social como muitos pensam.

Neymar está confinado com seu preparador físico, que também trabalha com o PSG, Ricardo Rosa. Ele é o responsável por elaborar os treinamentos seguindo orientações do clube francês. Na foto que postou exausto após realizar as atividades também estão o filho Davi Lucca, o empresário Humberto Paiva e os amigos Joclécio Amancio e Vinicius Martinez.

Vinicius Martinez é casado com Carol Dantas, a mãe de Davi Lucca. Os três já estavam na casa em Mangaratiba antes da chegada de Neymar. Junto com o jogador ainda vieram o pai, Neymar da Silva Santos, o fotógrafo e melhor amigo, Gil Cebola, o mordomo, Jonathan Andrades, e o cozinheiro, Mauro Leitão. Aqueles que estavam na capital francesa já estariam em isolamento ao lado do jogador.

Em Mangaratiba, o condomínio Portobello que Neymar tem casa está fechado para hóspedes por conta da proliferação do coronavírus. O local foi o escolhido pelo jogador para a quarentena por conta da estrutura. Há campo futebol, quadra de futevôlei, academia e piscina, em uma área total de quase 12 mil m².

Assim que chegou ao Brasil, Neymar evitou postar fotos em casa e a assessoria do jogador trabalhou com a divulgação de quarentena em "lugar secreto". O receio era o de atrair fãs, torcedores, imprensa ou curiosos em um momento inicial da discussão do confinamento no país. Neymar tem se mostrado favorável à campanha "fique em casa" com postagens em redes sociais. O jogador também já publicou vídeo em que aplaude aos profissionais da saúde.

Andew Couldridge/Action Images via Reuters

Mourinho levou bronca por desrespeitar isolamento

As orientações para o isolamento não são apenas no Brasil. No Reino Unido, o técnico José Mourinho e três jogadores do Tottenham levaram uma bronca do clube inglês por descumprirem as regras adotadas pelo governo. O país europeu já soma mais de 7 mil mortes por causa do Covid-19.

Mourinho foi fotografado treinando em um parque de Londres com o meia Ryan Sessegnon. Além deles, o meia Tanguy Ndombele e o zagueiro Davinson Sánchez foram vistos juntos em outra parte da cidade.

"Aceito que minhas atitudes não estão de acordo com o protocolo do governo e nós devemos ter contato apenas com pessoas da nossa casa. É vital que cada um faça seu papel e siga as regras do governo para apoiar nossos heróis da NHS (Serviço Nacional de Saúde) e salvar vidas", disse Mourinho, depois da bronca levada.

LEE SMITH

Lateral fez festa sexual e acabou punido

A punição ao lateral Kyle Walker, do Manchester City, foi mais dura que uma simples bronca. De acordo com o jornal "Daily Star", o jogador deixou de fazer parte dos planos da seleção inglesa do técnico Gareth Southgate.

Walker teria promovido uma festa com prostitutas durante o período de confinamento, o que vai contra as recomendações das autoridades de saúde no combate ao Covid-19.

A repercussão negativa fez com que Walker publicasse um vídeo pedindo desculpas à sua família, seus amigos, seu clube, aos torcedores e ao público por "decepcioná-los". E disse entender que sua posição como jogador profissional "traz a responsabilidade de ser um modelo".

Jogadores "furam" isolamento por boa ação

Alguns jogadores estão desrespeitando a ordem de ficar em casa, mas por uma boa causa. D'Alessandro, meia do Inter, se uniu ao ex-jogador Tinga e ao técnico Dunga para a arrecadação de 10 toneladas de alimentos para ajudar famílias carentes em Porto Alegre (RS).

Ação semelhante aconteceu no Maranhão. Os jogadores do Juventude local distribuíram cerca de 40 cestas básicas para moradores de bairros carentes da cidade de São Mateus (MA).

A atitude de doar alimentos para famílias carentes tem sido repetida por outros atletas. No Corinthians, Gil, Pedro Henrique, Danielo Avelar, Michel Macedo, Ramiro, Janderson e Everaldo se juntaram a Jadson, Madson, Lucca e Malcom, ex-atletas do clube, e compraram mais de 2 mil cestas básicas para distribuir a famílias carentes em São Paulo.

No Rio, o volante Souza, ex-Vasco, São Paulo e Grêmio, doou 210 cestas básicas para o bairro Monjolos, em São Gonçalo (RJ), onde viveu a infância e a adolescência.

Thiago Ribeiro/AGIF Thiago Ribeiro/AGIF

Do jeito que dá

Apoio à quarentena é quase unânime, e jogadores usam criatividade para ficar em forma

A orientação da Organização Mundial da Saúde (OMS) pela redução do contato social como forma de prevenir a contaminação pelo novo coronavírus alterou a rotina de quase todo mundo. Jogadores de futebol também vivem experiências diferentes da normalidade: os campeonatos estão paralisados, mas eles não podem ficar inativos durante o isolamento.

Enquanto treinam e mantêm a forma a partir de soluções criativas, eles reconhecem quase unanimemente a necessidade deste período de recolhimento para diminuir a propagação da covid-19 no Brasil. O UOL Esporte conversou com 56 atletas e treinadores da elite do futebol brasileiro, sob condição de anonimato, e 89,2% manifestaram concordância com a medida.

Entre os ouvidos pela reportagem, 50 são favoráveis à quarentena e apenas seis manifestaram não estar de acordo com a medida tomada por muitos Estados e Municípios brasileiros. O número de quem é contra a medida é de 10,8% dos jogadores consultados.

Essa é a terceira de quatro perguntas que o UOL fez para os atletas dos principais clubes do futebol brasileiro.

Agora que estão casa, como são os treinos à distância?

"Quando aconteceu a paralisação, muitos atletas me procuraram na hora para não ficar parados. Mas são dois problemas: está todo mundo em casa e muitos não têm material de academia", conta o educador físico Guilherme Henrique. A personal trainer Jéssika Kovatch passou pela mesma situação e chegou à mesma conclusão: "Para passar essa quarentena em movimento só depende da criatividade do professor."

De casa, esportistas entram em contato com preparadores e são orientados à distância. Um recurso muito comum são as chamadas de vídeo no celular. O fisiologista Gustavo Jorge, que já trabalhou nas comissões técnicas de Corinthians e Santos, comanda treinamentos diários e remotos com três jogadores da Série A. "Na época da greve dos caminhoneiros [em 2018], eu cheguei a fazer atendimentos por vídeo porque estava em São Paulo, os alunos em Santos e as estradas paradas. Mas agora têm sido todos assim", diz.

"Estar junto com o atleta na sessão não tem comparação com nenhum outro estímulo. Mas com o avanço da tecnologia, temos oportunidade de acompanhar em tempo real. Eu vou contando as séries de exercícios e de acordo com a velocidade da internet não tem delay. É a grande saída para os atletas conseguirem manter uma característica de treinamento mais próxima do que teriam no clube", comenta.

Reprodução/Instagram

Preparador de David Luiz: treino para 3 mil pessoas e 8 novos clientes

Em alguns casos, estes treinos por meio de chamadas de vídeo se transformaram em transmissões ao vivo no Instagram.

Lucas Kruel, treinador brasileiro que vive em Connecticut, nos Estados Unidos, chega a juntar mais de 3 mil pessoas simultaneamente em transmissão de treinos com o zagueiro David Luiz, do Arsenal.

"Começamos a trabalhar e ele queria divulgar no Instagram para as pessoas em casa treinarem também. Eu não posso esperar que tenham bola suíça, peso ou borrachinha, então fazemos exercícios só com o peso do corpo. O grau de dificuldade é bem alto e está sendo bem produtivo. Já trabalho online há três anos, mas nos últimos dez dias, duas semanas, aumentou o número de procuras. Sete ou oito jogadores me chamaram. Aí tu faz o cálculo: 40 treinos a mais na semana."

Assim como David Luiz, o santista Yuri Alberto também transmite treinos ao vivo, orientado à distância por Gustavo Jorge: "Esse tipo de atendimento individual ao atleta é algo que já funciona, é uma característica do futebol moderno. O clube não consegue priorizar o individual de cada um quando tem 30 profissionais no elenco. Aí quando as pessoas que estão em casa assistindo ao treino percebem que conseguem fazer algumas coisas que atletas profissionais fazem todo mundo ganha."

O Instagram virou uma febre. Lá tem aula de dança, pilates, funcional... Tem todo o tipo de atividade que dá para fazer em casa. Eu nunca fui de ficar postando aula e fazendo vídeos, mas meus alunos pediram e estou muito surpresa

Jéssika Kovatch, personal trainer

Eu faço lives de terça e quinta e nos outros dias publico exercícios. No WhatsApp, dou treinos online para três amigas, cada uma na sua casa, mas fazendo as mesmas atividades e de certa forma socializando. Isso é prazeroso

Jéssika Kovatch, sobre novas formas de atendimento

Treino delivery de Gabigol e Sánchez

Sergio Peres, preparador físico que trabalha individualmente com Gabigol, do Flamengo, e Carlos Sánchez, do Santos (veja no vídeo abaixo), além de mais cinco atletas, acredita que os jogadores entenderam a necessidade do momento.

"No fim do ano, eles [jogadores] curtem 20 dias de férias e nos últimos dez [dias] antes da apresentação acabam procurando para fazer algo de força e prevenção de lesões para não sofrerem tanto na pré-temporada. Agora é diferente, é indefinido. Então, é de suma importância, presencial ou à distância, no jardim ou na sala de casa, se adaptar e manter condicionamento físico. A maioria entendeu e está se cuidando."

Ele ainda orienta trabalhos presenciais, mas com cuidados redobrados: "Eu atendo de luvas e de máscara."

Acervo pessoal

Desafios tecnológicos da quarentena

"O que o cara tem que tentar fazer é minimizar a perda física trabalhando o peso do corpo e usando o que tiver em casa: um aparelho, uma borracha, uma bola, o que tiver. Aí é improvisar. A variedade de exercícios com o peso do corpo é muito grande e pode reforçar tua musculatura de maneira que vai o beneficiar quando voltar ao clube", explica Lucas Kruel, que também trabalha com Douglas Costa, da Juventus, entre outros jogadores. Os maiores desafios são tecnológicos.

"Tu tem que estar 100% ali. Se estiver um pouquinho distante é ruim, tem que estar presente naquele momento. Na presença do aluno, tu pode tocar, mexer na ponta do pé. Na chamada de vídeo é só comando de voz. Mas prestando atenção e olhando tu consegue uma correção boa."

Guilherme Henrique, que trabalha com os corintianos Mateus Vital e Janderson, acha que o acompanhamento do exercício tem relação com o papo com o jogador: "Dependendo da posição do celular, você não consegue ver completamente. Então, tem que pedir para arrumar, aí você vê o posicionamento. Tem que falar muito com eles, 'abre mais o peito', 'coloca pressão no calcanhar'. É diálogo. Se o atleta já conhece o seu trabalho, o celular é favorável, não se perde muito, não".

Outro recurso usado além das chamadas de vídeo são os aplicativos. O profissional de educação física prescreve o treino, as séries, repetições e cadência e cede ao aluno uma senha de acesso, como conta o personal Milton Tadeu: "Fica mais fácil a demonstração dos exercícios através dos vídeos explicativos do próprio aplicativo. E muitas vezes o personal inclui os seus vídeos, que não estão na biblioteca. Depois tem um feedback e, se o aluno teve alguma dificuldade, você pode alterar o exercício."

Algumas das últimas dicas servem para todos, não só atletas de futebol.

Os exercícios físicos melhoram a função imune do ser humano, são o estímulo necessário para que o seu sistema imunológico permaneça com níveis altos e continue protegendo o seu corpo. Inclusive da ameaça do coronavírus.

Fernando Moreno/AGIF Fernando Moreno/AGIF

Diálogo aberto

Maioria dos jogadores e técnicos ouvidos aceitaria negociar redução salarial durante pandemia

A pandemia do coronavírus suspendeu todas as atividades futebolísticas no Brasil e secou a fonte de receitas dos clubes. Desde a segunda quinzena de março, uma desgastante negociação tomou conta dos bastidores do esporte no pais em torno de uma necessidade de redução de salários dos jogadores como alternativa para garantir a sobrevivência das equipes.

As negociações até agora não avançaram, e não há nenhum acordo uniforme. Clubes e atletas realizam conversas particulares, procurando consensos que se ajustem às suas particularidades. O UOL Esporte conversou com 56 atletas e treinadores da elite do futebol brasileiro, sob condição de anonimato. Há muitos que são contrários a qualquer redução, mas a maioria dos nomes ouvidos mostra abertura ao diálogo.

Das pessoas ouvidas pela reportagem, 19 são totalmente contra reduzir os salários — 36% do total. Já outros 16 (30%) afirmaram que topariam negociar uma potencial redução, mas isso dependeria muito da oferta que fosse apresentada.

Por outro lado, 18 pessoas, entre atletas e técnicos, disseram topar uma redução nos seus vencimentos mensais. O número corresponde a 34% dos ouvidos, quase o mesmo percentual dos que foram totalmente contrários à uma medida do tipo. Apenas três dos nomes consultados preferiam não emitir nenhuma opinião sobre o assunto — e por iso não entram nas porcentagens citadas acima.

Essa é a segunda de quatro perguntas que o UOL Esporte fez para os atletas dos principais clubes do futebol brasileiro. Até o sábado, você ainda saberá a opinião dos boleiros sobre as medidas de quarentena que estão sendo impostas pelos governos estaduais.

Negociações coletivas fracassaram

Logo que a suspensão do calendário brasileiro aconteceu, na semana do dia 15 de março, a Comissão Nacional de Clubes começou a se reunir com entidades sindicais e a dialogar com atletas sobre uma redução de salários. A primeira oferta, de redução de 50% dos vencimentos, foi rejeitada por jogadores — o movimento pelo "não" teve protagonismo de vários nomes da elite, donos de alguns dos maiores salários do país.

Uma nova oferta foi feita, desta dez de reduzir em 25% os valores — mais uma vez, a resposta foi não. O UOL Esporte apurou que uma das razões preponderantes na discussão foi a enorme quantidade de atletas com salários atrasados nos seus clubes. Os sindicatos e os jogadores não estavam dispostos a abrir mão de vencimentos futuros sem que dívidas abertas do passado fossem equacionadas.

Sem acordo, a decisão acabou sendo de conceder férias antecipadas aos jogadores. Neste momento, clubes negociam individualmente com seus elencos propostas de redução, procurando ajustar os números à realidade de cada um. Enquanto isso, as negociações coletivas acontecem nos bastidores.

Bruno Cantini/Divulgação/Atlético-MG

Opiniões sobre o assunto oscilam

Ninguém se salva sozinho. Isso acontece no mundo, em uma sociedade, em uma equipe ou em um clube. A realidade indica que um momento de entender o que está acontecendo e colaborar. Decidimos diminuir nosso salário. Isso vai além de ser solidário ou não: existe uma situação no planeta que se reflete na situação do clube e, como sou privilegiado, posso contribuir para tentar superá-la da melhor maneira

Jorge Sampaoli, treinador do Atlético-MG

Quando a gente observa esses dirigentes que vêm a público pedir para jogadores diminuírem salário... Mas, por que vocês, durante mais de cem anos, nunca foram profissionais? (...) E agora vocês querem fazer isso? Por que vocês não dão os bens de vocês para resguardar o clube? Vocês estão pensando no umbigo de vocês

Neto, ex-jogador e apresentador

Não me lembro de nenhum dos grandes jogadores brasileiros ajudando o movimento do Bom Senso, que defendia os jogadores de classe mais baixa e que ganham pouco. Não houve solidariedade entre eles. Por isso você só pode esperar um caso ou outro. Infelizmente, o brasileiro não é muito solidário não

Mauro Cezar Pereira, blogueiro do UOL Esporte

JOSEP LAGO/AFP

Discussão chegou até nos clubes mais ricos do mundo

Os movimentos para a redução de salários dos jogadores não acontecem só no Brasil. Em outros países, onde ficam os clubes mais ricos do mundo, a situação se repete. O Barcelona reduziu em 70% os vencimentos dos seus atletas, e Lionel Messi encabeçou a aceitação da medida. Já no Real Madrid, a proposta foi menos drástica (corte de 25% a um terço), e mesmo assim encontrou resistência antes da aceitação.

Em entrevista ao podcast SWR Sport, o meio campista alemão Toni Kroos criticou a iniciativa. "Uma redução de salário é como uma doação em vão para o clube. Sou a favor que se pague o salário completo e que cada um faça coisas sensatas com ele. Se pede a todos que ajudem quem precisa, e há muitos lugares em que é necessário".

Na Inglaterra, a ideia de reduzir salários também tem sido mal recebida pela maioria dos atletas. "É ridículo que os clubes adiem suas obrigações com os jogadores para depois, no futuro, gastarem fortunas com transferências" disse Gordon Taylors, presidente da PFA, associação de jogadores da Inglaterra.

A Alemanha é uma exceção, com atletas de alguns clubes grandes como o Borussia Dortmund aceitando, de forma voluntária, reduzir seus salários. Já na França o caminho tem sido subsídios do governo para que os clubes possam bancar os atletas.

Alessandra Torres/AGIF Alessandra Torres/AGIF

Encurtem os estaduais

Jogadores são favoráreis a estaduais menores para manter fórmula do Brasileirão após pandemia

O calendário do futebol brasileiro pós isolamento social não deve impor o fim dos Estaduais, pelo menos essa é a promessa da direção da CBF aos presidentes de federações. Se dependesse da vontade de jogadores ouvidos, porém, esses torneios seriam os sacrificados caso seja necessária uma adaptação para as competições, como reduções ou até cancelamentos.

O UOL Esporte perguntou a 56 jogadores de times da Série A e do Cruzeiro, que responderam anonimamente: prefere que o Brasileirão ou os Estaduais sejam encurtados? 29 deles, ou 50%, responderam que preferem os Estaduais mais curtos. Outros três atletas disseram preferir que os torneios regionais sejam cancelados.

Por que os estaduais devem seguir?

Com o calendário apertado, os Estaduais parecem ser o elo mais frágil do universo competitivo do futebol brasileiro. Afinal, todos enfrentam críticas anuais a respeito de seu nível de competitividade e função para os clubes. Mas o cancelamento das edições de 2020 do evento está fora de cogitação neste momento.

A CBF vê, inclusive, que os campeonatos mais fáceis de serem disputados logo após o fim do isolamento social, ainda sem data, são os justamente os Estaduais. Por quê? Por causa do deslocamento.

A logística de disputar um torneio dentro do estado é infinitamente mais simples. Eles já estão em suas retas finais, as distâncias são mais curtas e, na maioria das vezes, não há necessidade de avião para chegar ao local das partidas, como acontece no Brasileiro ou Libertadores.

Há inclusive uma proposta na mesa de que alguns Estaduais sejam concluídos com sede fixa. Pegando o Paulistão como exemplo, todas as partidas seriam realizadas na cidade de São Paulo, com portões fechados. E os atletas ficariam isolados em hotéis para serem testados, evitando assim contaminação entre eles durante as partidas - isso é importante porque um atleta contaminado pode obrigar todo um time a ficar em quarentena por duas semanas, sem poder disputar partidas.

Bruna Prado/Getty Images

E o Brasileirão?

O que vai ocorrer com o Brasileiro é uma incógnita. Vai depender, obviamente, de quando a bola vai poder rolar, mesmo que sem aglomerações — ou seja, sem torcedores nos estádios. A Globo, que detém os direitos de transmissão da maioria dos clubes da Série A, é contra neste momento qualquer mudança no regulamento, como trocar os pontos corridos por um sistema que finalizasse a competição em jogos eliminatórios, os mata-matas, como ocorria até 2002.

Isso, na visão dos executivos da emissora, afetaria diretamente as receitas com o pay-per-view, já que seriam menos jogos realizados. Se a bola voltar a rolar até junho, entende-se que pode haver ajustes no calendário, inclusive prolongando a marcação de partidas em dezembro, para terminar a competição até o fim do ano. A CBF não pretende estender a temporada 2020 por 2021, como chegou a ser cogitado, porque interferiria no calendário do ano que vem.

Há chance de o Brasileiro nem ocorrer? Vai depender, é claro, de como o surto do novo coronavírus vai atuar no Brasil nos próximos meses. Quanto mais tempo o isolamento social for recomendado, mais curto fica o calendário para encaixar campeonatos que precisam de 38 datas como são os casos das Séries A e B do Nacional. Pelo menos um cartola da CBF cogitou, em conversa com alguns presidentes de clubes, que não descartassem um cenário desastroso em que o Brasileiro 2020 tivesse que ser cancelado para começar tudo zerado em 2021. Isso hoje é improvável, mas não impossível.

@Flamengo/Twitter

Sindicatos querem Brasileirão menor

No final de março, o UOL Esporte explicou qual era a visão da Fenapaf (Federação Nacional de Atletas de Futebol Profissional) e do Sindicato dos Atletas de Futebol em relação ao assunto. As entidades que representam os jogadores sugeriam um novo modelo de disputa para o Campeonato Brasileiro 2020, com menos datas que o normal, para tentar acomodar todas as competições.

A ideia seria reduzir o número de datas do Brasileirão - o torneio tem início previsto para o primeiro fim de semana de maio e conta com 38 rodadas. No entanto, para que o calendário deste ano se encerre até em dezembro, os sindicatos entendem que só a redução de partidas viabilizaria o campeonato.

"Nós já conversamos várias possibilidades. Vai depender como a epidemia vai andar. Se tudo voltar ao normal até maio, dá para encaixar tudo. Se não voltar, vai ter que mudar o modelo de competição", disse Alfredo Sampaio, representante do Saferj (Sindicato dos Atletas de Futebol do Estado do Rio Janeiro) e da Fenapaf, ao UOL Esporte. "Só que aí isso também passa por alguns problemas contratuais. A Globo tem contrato para transmitir 38 partidas. Se diminuir o número de partidas, a Globo pode não querer pagar. A gente falou sobre diversas formas [diferentes de tocar o Brasileirão]."

Esse é um dos grandes impasses para serem solucionados pelas partes envolvidas —federações, clubes, TVs e jogadores. Um exercício em cima das datas que a CBF tem até o final do ano, dependendo do avanço ou contenção da pandemia no Brasil, mostra o quão complicada é a logística para acomodar os estaduais e um Brasileirão de pontos corridos, com turno e returno.

O calendário divulgado pela CBF em outubro do ano passado previa uma temporada com quase 11 meses de duração, de 22 de janeiro a 6 de dezembro. Com a suspensão dos campeonatos devido à pandemia do novo coronavírus, restam oito meses para o término das atividades (ou 35 semanas), ou 70 datas disponíveis. Nesse espaço, seria necessário acomodar seis datas para os Estaduais, 38 para o Brasileirão, 11 para Libertadores e Sul-Americana, 13 para Copa do Brasil, oito para Eliminatórias da Copa 2022 e duas para amistosos data Fifa (dois). A soma é 78. Dessa forma, já existe um deficit de oito datas.

Marcello Zambrana/Agif

Que times vão disputar os estaduais se eles voltarem?

A definição da sequência dos torneios, porém, tem outro detalhe: os times. Os clubes grandes, que disputam as séries A, B e C do Brasileirão, por exemplo, podem ter de jogar mais vezes na semana do que o normal. Mas existem casos em que os clubes podem simplesmente não ter elenco para entrar em campo.

É o caso do líder do Campeonato Paulista. Após dez rodadas, o Santo André soma 19 pontos e lidera, além do Grupo B, a classificação geral. O Palmeiras tem a mesma pontuação, mas uma vitória a menos. De 28 jogadores inscritos pelo Santo André no Campeonato Paulista, 21 têm contrato somente até o fim deste mês de abril, outros quatro entre maio e dezembro e apenas três até 2021.

"É inviável para o clube renovar contratos sem saber até quando [vai o torneio]. Não temos condição de arcar com mais três ou quatro meses, além do estabelecido quando recebemos o calendário de competições e vimos que o Paulista terminava em 29 de abril. A gente aguarda, espera que o campeonato volte respeitando esse problema grave [o coronavírus], e que seja em prazo curto, para pelo menos tentarmos renovar com boa parte do elenco. Mas vejo que se for algo que passe de maio, o retorno fica inviável não só para nós, mas para a maioria dos clubes", disse Edgard Montemort Filho, diretor executivo da equipe, ao UOL quando o Paulistão parou.

O caso se repete em outros estados. O Rio Branco, que fechou a primeira fase do Campeonato Paranaense em sétimo lugar, por exemplo, liberou todo o elenco e comissão técnica com a paralisação — o time não tinha calendário previsto para o segundo semestre e pagou apenas o que estava acordado inicialmente.

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