O futuro já começou

Novo torcedor perde interesse por futebol, troca 90 minutos de jogo por memes e quer ser ouvido

Gabriel Carneiro Do UOL, em São Paulo Ari Ferreira

Existe um consenso entre pessoas que trabalham com futebol sobre 2020 ter sido um ano de mudanças no hábito de consumo dos torcedores no Brasil. O ponto mais levantado é como a distribuição de conteúdo se diversificou, já que ao longo dos campeonatos uma pergunta virou regra: "onde o jogo vai passar?"

A proliferação de canais e plataformas foi acompanhada de outras novidades que aceleraram a mudança do perfil do próprio torcedor — cada vez mais conectado e presente nas mídias sociais (e, se for jovem, mais longe da TV). Ele está propenso a encontrar novas formas de entretenimento e busca afinidade com seu time ou ídolo além do campo.

Um estudo bancado por clubes europeus, que também pesquisou o mercado brasileiro, mostrou quem é o fã de futebol do futuro. E o time que não estiver preocupado vai sofrer no bolso, dizem especialistas ouvidos pelo UOL Esporte.

Enquanto os clubes brasileiros oferecem ao público produtos licenciados caros e dificultam o acesso às plataformas de transmissão de seus jogos, o torcedor se distancia. Ele prefere memes e melhores momentos a jogos inteiros, segue mais seus ídolos do que os clubes, quer mais bastidores e experiências únicas e foge de quem se omite na discussão de pautas sociais.

É impossível saber onde esse movimento vai chegar. Mas hoje é um novo dia de um novo tempo que começou.

Ari Ferreira
AMA/Corbis via Getty Images

Direitos de TV em debate

Pela primeira vez na história, o tempo médio estimado de consumo diário de internet, seja no computador, celular ou tablet, foi maior que o da TV, de acordo com um relatório da agência de mídia "Zenith" do ano passado. Isso muda um panorama de décadas e gera inúmeras discussões sobre o futuro da comunicação.

Essa pauta chegou ao Brasil também graças ao futebol. Com prejuízos financeiros causados pela pandemia, grandes detentores de direitos de transmissão romperem contratos. Depois da Medida Provisória 984, a "MP do Mandante", assinada em junho pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) - e que perdeu validade em outubro -, uma grande revolução na forma como o público vê o futebol foi inaugurada.

Mais canais abertos colocaram futebol na grade de programação, além de plataformas de streaming e de transmissões na internet financiadas pelos próprios clubes. Mas será que essa pulverização de possibilidades num tempo em que o torcedor se distancia é positiva para o negócio?

"A forma como a MP foi elaborada é questionável, mas abre uma série de alternativas relevantes, uma vez que a chance de apenas um player travar o mercado, como já aconteceu, diminui", diz Lucas de Paula, consultor da "OutField Consulting".

"A lógica como o produto está formatado é antiquada. O produto 'quarta e domingo' teve o seu valor, mas hoje necessita de atualização. Ter mais de um fornecedor para transmissão dos jogos não implica em menor audiência, pelo contrário. Marcar presença em mais plataformas, com outros formatos de transmissão, significa aumentar capilaridade e, através de outras narrativas, mitigar o risco de perder potenciais consumidores para outras nuances de entretenimento. Apenas em caráter de comparação: grande parte do novo consumidor da indústria de esportes eletrônicos já está acostumado a ser multicanal e multiplataforma", diz o especialista.

Lucas Figueiredo/CBF Lucas Figueiredo/CBF

O estudo que baseia várias teses presentes nesta reportagem foi divulgado em agosto pela ECA (European Club Association) e está disponível on-line em inglês. A pesquisa quantitativa gerou um relatório de 50 páginas a partir de entrevistas com 14 mil pessoas entre 8 e 64 anos em sete mercados (Reino Unido, Espanha, Alemanha, Polônia, Holanda, Índia e Brasil).

As pessoas que se declararam fãs de futebol no estudo foram divididas em seis categorias, que vão desde os fanáticos pelo esporte em si até quem acompanha "por tabela", porque dentro de casa tem alguém mais interessado. Repare no gráfico abaixo que a maioria dos brasileiros vê o futebol como um compromisso social, para ter um assunto no papo com os amigos.

Futebol como "moeda social"

Viu? Quase 25% do total de brasileiros que se declaram fãs de futebol na verdade não estão tão interessados assim. São moderados, tratam o esporte como "moeda social", só acompanham para ter assunto com amigos, colegas de trabalho ou familiares. O estudo trata esse grupo pela sigla "Fomo", que significa "fear of missing out" (medo de ficar por fora, em tradução livre).

Pessoas do grupo acabam, dessa forma, consumindo notícias, resultados e memes via redes sociais. São pessoas que gostam do lado mais leve do futebol e não conseguem mais ver 90 minutos de bola rolando. Isso faz com que o sentimento delas pelo esporte não seja profundo. Muitos podem substituir o futebol por qualquer outra forma de entretenimento.

Daí nascem duas conclusões possíveis:

1) quanto mais escondido o futebol estiver da TV aberta ou fechada, da grande mídia e da internet, mais ele ficará de lado;

2) o interesse dos "Fomo" pode ser impulsionado por comunicação e marketing eficientes.

Um caso de sucesso brasileiro é o trabalho da "SPFC tv", canal de vídeos do São Paulo na internet, que constrói narrativas poderosas para humanizar personagens do elenco e mudar reputações. Um episódio da série "Em Foco", no Facebook, mostrou reações do técnico Fernando Diniz na vitória sobre o Corinthians de 30 de agosto. As imagens viralizaram e ajudaram a mudar o perfil do técnico nas redes sociais.

FRANCK FIFE / AFP

Importância dos ídolos

Os jogadores de futebol podem ser motivadores importantes para as pessoas torcerem por um time, diz o estudo europeu. Em números: um em cada cinco fãs de futebol só apoia determinado time porque seu jogador preferido veste aquela camisa.

Torcedores mais jovens são ainda mais influenciáveis. Entre 8 e 12 anos, 32% deles gostam de futebol simplesmente por admirar um ídolo. Mais de 70% se sentem fortemente conectados com um jogador específico, seja um astro internacional ou local.

A conclusão óbvia é a necessidade de investimento dos clubes e entidades na força da imagem dos ídolos, dos quais se exige posicionamentos e boa reputação.

"É uma tendência que tenhamos jogadores mais conscientes a partir de agora. O ano de 2020 foi muito ruim em muitos aspectos, mas acelerou discussões, como as questões raciais e a comoção após a morte do George Floyd, por exemplo. O próprio confinamento fez com que as pessoas fossem obrigadas a encarar questões das quais não dá mais para fugir", diz Eliana Alves Cruz, escritora, jornalista e colunista do UOL Esporte.

"As novas gerações ficarão cada vez mais conscientes e com acesso mais qualificado à discussão porque ela saiu dos guetos, das nossas bolhas, ganhou o país, ganhou o mundo. Neymar, que sempre fugiu da pauta racial, puxou um monte de gente com ele. Esses posicionamentos forçam mudanças de atitude ou no mínimo uma reflexão mais aprofundada."

David Klein/Reuters

Richarlison

Nos últimos meses, o atacante do inglês Everton e da seleção brasileira tem usado sua visibilidade para se posicionar em defesa da saúde, do meio ambiente, da luta antirracista e do combate à violência contra a mulher. Até o apagão no Amapá, em novembro, virou assunto pra ele: "Peço que as autoridades se pronunciem."

Visionhaus/Visionhaus

Rashford

Jogador do Manchester United é mencionado por Richarlison como exemplo em relação à ação social de jogadores. Ele é líder de campanha que fornece refeições gratuitas a mais de um milhão de crianças de famílias carentes muito atingidas pela pandemia e teve contato com o primeiro-ministro britânico, Boris Johnson.

Divulgação/Epic Games

As faces do desinteresse

O fanatismo por futebol é maior entre as crianças. Apenas uma a cada seis que têm 8 e 15 anos diz que não gosta ou não tem interesse no jogo. Dentro do grupo dos que gostam, metade se define como fanática. O interesse pelo futebol cai na adolescência e no início da vida adulta, entre 16 e 24 — a tendência foi verificada em todos países estudados.

Está aí o grande desafio do mercado do futebol. É com essa idade que o jovem passa a tomar as próprias decisões e define como aproveitar seu tempo livre. Em 2020, por exemplo, houve um aumento exponencial no consumo de esportes eletrônicos que ameaçam o "reinado" dos tradicionais.

De acordo com um levantamento da "Enthusiast Gaming" publicado pela "Forbes" em novembro, hoje o público dos Estados Unidos assiste mais a conteúdo de e-sports do que das ligas de basquete (NBA), basebol (MLB) e hóquei (NHL). No Brasil, onde se estima que haja 60 milhões de consumidores de esportes eletrônicos, campeonatos de CS:GO, League of Legends, Free Fire ou Fortnite ocupam a grade de canais esportivos na TV e ampliam alcance ano a ano.

No ano passado, em uma reunião de acionistas, a Netflix informou que seu principal concorrente não era o Amazon Prime Video ou o Disney+, e sim o game Fortnite. Se a maior plataforma de entretenimento da atualidade está tão preocupada com o futuro, imagine os clubes de futebol brasileiros. As faces do desinteresse por futebol são múltiplas.

Ricardo D'angelo/Riot Games Ricardo D'angelo/Riot Games
Anderson Mendes/Divulgação

"Meu pai ouvia futebol no rádio, eu sou da TV e meus filhos estão no videogame"

Entrevista com Eduardo Tega, consultor em desenvolvimento e inovação no esporte, fundador da "Universidade do Futebol" e CEO da "Sportheca".

UOL Esporte: Este ano de 2020 representou alguma mudança na indústria do futebol brasileiro, no modo como os clubes arrecadam dinheiro?

Esse modelo tradicional de se fazer futebol sofreu uma grande transformação, sim. Não houve o dinheiro de bilheteria, também há discussões mais profundas sobre o patrocínio de camisa, além do fatiamento dos direitos de transmissão, a dificuldade que os clubes vão enfrentar com o que tradicionalmente recebiam nos [torneios] regionais e hoje a TV perdeu interesse. A linha de sócio-torcedor tradicional também caiu, porque o mercado dá muita importância ao aspecto físico, ao ir ao estádio, mas tem uma parte enorme e principal da torcida que não mora na mesma cidade ou no Estado.

E qual a solução? Qual a discussão atual em termos de inovação?

Não só da indústria do esporte, como do entretenimento, a discussão é no sentido de engajamento e monetização dos torcedores. A pandemia acelerou essa necessidade de os clubes se observarem como organizações de mídia e entretenimento que fazem gols. Há muitos clubes digitais fora do Brasil, são aqueles que fazem receitas dos torcedores independentemente do jogo. Você precisa chegar na pessoa que tem a paixão e quer consumir o clube em seu smartphone. Ele quer ter voz, poder de decisão, e essa transformação é cada vez mais rápida.

E o momento é quente para esse tipo de discussão?

Tudo isso que eu falei te impulsiona a enxergar que o clube precisa ter controle de conteúdo e de dados para fazer suas estratégias digitais. Alguns se anteciparam e notaram que é preciso ter uma plataforma proprietária para construir estratégia. Em ações em redes sociais, o conteúdo é da rede social. O próximo passo é construir canais diretos com o torcedor. Os torcedores do São Paulo escolheram o layout do ônibus oficial no app do clube. São quase 200 mil usuários ativos. No Atlético-MG, por exemplo, torcedores mais engajados trocaram moedas no app por uma conversa com o Éder Aleixo.

O novo torcedor busca algo além de ver jogos e torcer? A busca dele é por participação, engajamento?

Exatamente. Eu tenho filhos de 17, 12 e 8 anos e a forma como eles consomem futebol é completamente diferente. Meu pai ouvia futebol no rádio, eu sou da TV aberta e da TV fechada e meus moleques são os que não querem assistir 90 minutos. Eles estão vendo jogo e ao mesmo tempo jogando videogame, falando com gente de todo o mundo. Não é que isso do engajamento vai impactar a indústria. Já está impactando no modo de distribuição de conteúdo quando você tem plataformas de streaming e os games fisgando a atenção do torcedor. O jovem não quer só um time de futebol, ele quer outros tipos de consumo, segundas, terceiras, quartas telas, mescla de universos, fantasy game, ter voz, conseguir recompensas. Os clubes que demoraram a se enxergar dessa forma vão sofrer demais.

E como saber onde esse novo torcedor estará para tentar fisgá-lo?

Quando o fã permite que tenhamos acesso aos dados, dentro de todos os protocolos da Lei Geral de Proteção de Dados, conseguimos entender coisas ricas: onde ele mora, que horário ele usa o telefone, onde trabalha, se ele está correndo, se tem hábitos saudáveis, se anda de ônibus, o que dá para ver quando ele está a 20 km/h em via expressa, se está com a segunda tela aberta. Isso pode fazer o clube fechar uma parceria com uma pizzaria que manda um push: 'Peça sua pizza agora, ela chega no intervalo do jogo'. Essa jornada do fã de futebol rende oportunidades.

Paul ELLIS / AFP

Responsabilidade social dita interesse do novo público

O estudo identificou barreiras de penetração do futebol. Um número mostra a existência de erros na forma como o esporte é administrado e comercializado: 40% das pessoas que declararam não ter interesse no esporte disseram que em outro momento já tiveram, mas não foram fisgadas e acabaram ocupando o tempo com outras fontes de entretenimento.

Dentre as demais pessoas que não ligam para o futebol aparece um aspecto ainda pouco explorado pelos clubes: 11% dizem que rejeitam o futebol porque ele não tem função social. E 7% não se interessam porque não há diversidade. Outros 5% afirmam que o futebol não é inclusivo — estes últimos estão no grupo mais jovem.

É um movimento como na política. Quando o público do futebol para de se ver representado ele perde o interesse. Isso está relacionado à falta de responsabilidade social em vários aspectos, não só em campanhas contra o preconceito. É o que acontece quando você vê clubes gigantes cobrando preços absurdos no ingresso. Ou quando o centro de treinamento da base do maior time do Brasil pega fogo e mata jogadores jovens. Ou quando as políticas de segurança pública e de educação falham a tal ponto que torcidas rivais não podem frequentar o mesmo estádio nos clássicos paulistas. Tudo isso é falta de responsabilidade social e quebra a confiança das pessoas."

João Abel, autor do livro "Bicha! Homofobia estrutural no futebol"

De acordo com um levantamento da página "O Contra-Ataque", até o ano de 2016 nenhum dos 20 clubes mais populares do futebol brasileiro se posicionava institucionalmente em datas como o dia orgulho LGBTQIA+ (28 de junho) ou o dia da luta contra a LGBTfobia (17 de maio). Em 2017, quatro clubes se manifestaram (Bahia, Flamengo, Grêmio e Internacional). O movimento cresceu tanto que neste ano apenas dois clubes ignoraram as duas datas: Athletico-PR e Ceará.

"Os principais clubes do Brasil estão começando a se atentar a causas sociais, isso talvez seja benéfico para reverter a queda de interesse. Estão engatinhando, começando a dar atenção a um público antes invisibilizado, como se não tivessem torcedores gays, bissexuais, transexuais e lésbicas. Mas é preciso tirar esse discurso da rede social e levar para a prática. E isso só alguns clubes estão fazendo", diz Abel.

Lucas Lima/UOL

Mulheres ainda têm dificuldade de comprar camisas de times

Os torcedores querem clubes e ídolos mais alinhados a seus valores, com participação em grandes discussões e ações contra o preconceito. Um exemplo: 30% dos fãs de futebol são mulheres, que também representam 34% dos torcedores leais a seus clubes. Mesmo assim, elas ainda têm um desafio muito grande na hora de compras produtos licenciados, como as camisas dos times. Clubes e fornecedores costumam ter estoque baixo de camisas femininas, com pouca variedade de tamanhos e modelos.

"Os clubes já começaram a perder dinheiro nessa briga por atenção, narrativa e espaço na mídia. Eu participei de uma live com o Grêmio, por exemplo, que já teve problema gravíssimo em questão racial. Os clubes já estão se mexendo porque já estão perdendo dinheiro. Tem patrocinador que não se aproxima de determinadas marcas e grupos. O órgão mais sensível do corpo é o bolso", ironiza Eliana Alves Cruz.

A visão de João Abel vai na mesma direção: "O posicionamento social dos clubes também é visando aumento da receita para recuperar o interesse das pessoas no futebol, tentar trazer público para manter o negócio lucrativo. Os clubes se comportam como empresas, disputam espaço com empresas nas redes sociais e olham para o que essas empresas fazem."

Algumas ações recentes causaram forte impacto nas redes sociais, como o programa de trainees do Magazine Luiza apenas com candidatos negros e a campanha de Dia dos Pais da Natura estrelada por Thammy Miranda. Também houve atos no futebol. O Guarana Antárctica criou uma estratégia comercial que uniu outras dez marcas em apoio ao futebol feminino. Uma delas é a Puma, que tem um acordo histórico de patrocínio ao feminino do Palmeiras.

Clubes como Bahia e Internacional têm sido reconhecidos pelo mercado como exemplos de realização de ações afirmativas que comprovam responsabilidade social. Porém, os desafios e maus exemplos ainda persistem.

Divulgação

Santos

Reconhecido por ações sociais nos últimos anos, o Santos inverteu a lógica na atual gestão. Em 10 de outubro, anunciou a contratação de Robinho mesmo consciente da sua condenação por violência sexual na Itália. O contrato foi suspenso após pressão de patrocinadores, mas o atacante segue hoje vinculado ao clube, mesmo condenado em segunda instância.

Divulgação

Corinthians

No dia 15 de dezembro, ao responder um torcedor sobre o tabu de vitórias do São Paulo na Neo Química Arena, a conta do Corinthians no Twitter publicou a imagem de um panetone para se referir ao Morumbi. A publicação homofóbica diz respeito a uma antiga piada sobre frutas. O São Paulo contestou o post, e o Corinthians pediu desculpas e apagou a publicação.

Reprodução/SporTV

Atlético-MG

Em fevereiro, o Atlético-MG apresentou seu elenco feminino no gramado do Mineirão. Em meio ao evento, um homem vestido como galo, mascote do clube, segurou a mão da jogadora Vitória Calhau e a fez girar. Ao ver a atleta exibir o corpo, saiu esfregando as mãos e passando a mão na boca. O assédio foi condenado publicamente e admitido pelo clube.

#FãDoFuturoFacts

  • 45% do público brasileiro que gosta de futebol torce para mais de um clube. No mundo a marca é de 37%. Quanto mais jovem, maior o índice;
  • 82% dos fãs de futebol acham que os clubes precisam ter mais responsabilidade social, ajudar as comunidades;
  • O comportamento futebolístico mais popular da atualidade é ver jogos ao vivo na TV. A seguir vêm: consumir notícias online, compartilhar vídeos e memes nas redes sociais, ir a estádios, jogar videogame, jogar futebol, ouvir podcasts, comprar produtos e apostar;
  • Fantasy games, simuladores de campeonato, são considerados experiências digitais relevantes para manter o torcedor dentro da narrativa, além de bastidores exclusivos do dia a dia dos clubes;
  • Crianças de 8 a 12 anos que disseram não gostar de futebol argumentam que isso acontece porque o esporte e monótono e cansativo;
  • Os esportes mais populares do Brasil são, nesta ordem: futebol, vôlei, automobilismo, MMA e basquete.
Carine Wallauer/UOL

Palomino: "Informações hoje são a partir dos próprios gostos"

Bate-papo com João Palomino, jornalista com 40 anos de carreira, sendo 25 na ESPN Brasil. Fundador da empresa de streaming Live Sports.

UOL Esporte: O que leva um profissional da mídia tradicional a abrir uma empresa que dialoga com inovação?

João Palomino: Na época em que eu estava na ESPN, e mesmo em outras empresas, sempre houve barreiras para essa discussão de como seria o modelo de distribuição com a chegada forte do streaming, das TVs conectadas, da possibilidade de o consumidor escolher a hora e o produto que quer assistir. As operadoras com as quais as empresas têm contrato não permitiam essa discussão porque a mudança de modelo de negócio era um risco. Mas sempre foi um tema. Até que em setembro fui procurado pelo Nilson Fujisawa, um cara de tecnologia, que tinha uma inquietação parecida e decidimos partir para o mundo do streaming com algo mais parrudo.

E o que dá para fazer de novo ou diferente?

Eu venho do jornalismo, então acredito muito em produção, em histórias bem contadas que vão provocar o engajamento com o consumidor. Os torcedores precisam de uma experimentação favorável, precisam se sentir pertencendo a algo. Um exemplo fora do futebol é o ciclismo. Tem uma gama de pessoas que se interessam pelas voltas, pelos equipamentos, pelos circuitos. Mas não há uma canalização do conteúdo do ponto de vista de produtos e nem algo que chame atenção de pessoas que praticam o ciclismo. Pertencimento é uma palavra feia, mas diz muito. Dar informações sobre equipamentos, equipes e atletas em segunda, terceira tela, é uma forma de cativar. Isso não é geracional, isso é hábito. Quando estou vendo um jogo e tem um lance polêmico em que a transmissão não chegou a qualquer conclusão, eu abro o celular para ver o que as pessoas estão falando, é imediato. Como transformar isso em um ecossistema bacana, em que você possa ter não o controle, mas coparticipação? É o desafio atual.

Você falou anteriormente sobre ciclismo. Acha que existe uma realidade de segmentação, de as pessoas pagarem para consumir especificamente aquilo que interessa e descartarem pacotes mais generalistas de conteúdo?

Não tenho dúvida. Existe uma demanda reprimida, uma carência, uma necessidade de as pessoas se informarem mais sobre o que acontece na região delas, na cidade delas, no clube delas, no esporte delas. Elas querem mais informação disponibilizada a partir dos gostos delas. A base de dados hoje é tudo. TV aberta nem se fala, mas a TV fechada também limitou a presença de outros esportes que não o futebol pós-Olimpíada, não houve legado. O torcedor fanático vai atrás disso.

E a partir da segmentação, o foco será a experiência?

Essa palavra "experiência" é muito poderosa. Tem uma frase que gosto demais e usei narrando um jogo da NBA uma vez, falando de tudo que acontecia paralelamente: "O jogo é um mero detalhe". Falei no aspecto de organização, preparação, cultivo de novos fãs. A experiência anterior do cara na arena é muito importante, como ele chega, como é recebido, o banheiro, o preço das coisas, o que come, o que bebe, o lugar que senta, como encontrar o lugar, se chega rápido em casa, se não chega rápido, quais são os atrativos para aumentar a permanência dele no local, como é o app que traz informações adicionais. Tudo isso faz com que a experiência seja bacana e o cara queira voltar. Mas se ele chega no estádio e toma bordoada da policia, não tem onde fazer xixi, a comida é azeda ou cara, o lugar para sentar não está lá, estão todos de pé e você sentado, na hora de ir embora não tem transporte e chega tarde em casa... tem que ser muito fanático para voltar. On-line é igual.

Fernando Moreno/AGIF

Mudança de regras? Qual o caminho? Para onde vamos?

Em julho, o ex-lateral-direito Belletti causou polêmica no Twitter. Ele sugeriu uma nova regra no futebol, em que a cada quatro escanteios, seria garantida uma cobrança de pênalti para o time no ataque. Isso geraria mais pênaltis, gols e emoção.

A publicação foi ironizada por diversos usuários da rede social. "Tirar o goleiro também seria uma ótima ideia", foi uma das respostas.

Mas num tempo em que as pessoas já não têm mais paciência para ver jogos inteiros, parece saudável rediscutir regras para dar mais emoção e mobilizar o público, antes que o futebol se torne um esporte de nicho. Segundo apurou o UOL Esporte, já há debates sobre caminhos. Grupos de ex-alunos do mestrado de governança da Uefa formaram um painel que discute a tendência de que o jogo tenha que se adaptar a sua forma de consumo.

Se o novo tempo já começou, a festa é de quem quiser, quem vier.

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