"Vou mostrar que erraram"

Jadson vê falta de respeito na saída do Corinthians e se diz motivado para provar que ainda joga em alto nível

Brunno Carvalho Do UOL, em São Paulo Miguel Schincariol/Getty Images

Jadson fala sorrindo, mas a chateação fica evidente no rosto quando o assunto é a saída do Corinthians. Ele não queria sair. Seu desejo era ficar e encerrar a carreira no clube em que conquistou cinco títulos.

Mas a diretoria e o novo técnico tinham outros planos. Assim que Tiago Nunes foi anunciado, os torcedores e a imprensa foram comunicados que nem o camisa 10 nem o volante Ralf ficariam em 2020.

Jadson se incomodou com o tratamento, achou falta de respeito. Aos 36 anos, sente que ainda pode jogar em alto nível. "Minha motivação é mostrar que eles estavam errados e que eu ainda poderia atuar com a camisa do Corinthians".

O meia conta nesta entrevista ao UOL Esporte o que planeja para o futuro. Seu empresário conversa com times do Oriente Médio, mas a ideia de permanecer no Brasil o agrada mais.

Sobre o Corinthians, não crê que a história esteja encerrada. Ainda falta um jogo de despedida, o último tchau.

Quero receber o carinho da torcida e ver como eu e o Ralf éramos queridos.

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À espera da despedida

"O Duílio (Monteiro Alves, diretor do Corinthians) falou com meu empresário em dezembro e disse que o treinador não me queria no elenco e que era para ele começar a conversar com outros clubes.

Mas o que me deixou mais chateado foi o que fizeram na reapresentação. Pelos anos que eu e o Ralf passamos no clube, a maneira como a gente defendeu o Corinthians, poderiam ter deixado a gente se reapresentar com o restante do grupo. Faltou um pouco de respeito.

Eu e o Ralf nunca fomos de atrapalhar grupo nenhum. A gente poderia se reapresentar normalmente lá, continuar fazendo os treinos. Do jeito que eles fizeram, achei um pouco errado. Acabaram meio que querendo queimar a mim e ao Ralf no mercado da bola.

Não cheguei a me sentir humilhado com a situação, mas chateado você fica. Poderiam ter programado um último jogo, alguma coisa. Uma despedida.

Ainda tenho esperança de que lá no fundo as pessoas vão ver que erraram e vão nos chamar para uma despedida honrosa. Quero reencontrar a torcida do Corinthians e dar um adeus para ela, ver que a gente é querido e que poderia ter dado ainda mais ao clube.

Se não for essa direção, vai ser outra que reconhecerá isso."

Eu vi que o ano não estava sendo bom e pensei: 'se eu não for bem, vão se aproveitar disso'. Foi o que aconteceu. Não fui tão bem e se aproveitaram. O treinador novo não me queria, mas tenho certeza de que por trás tinham pessoas que também não queriam que eu ficasse lá no Corinthians.

Jadson

Gabriel Aponte/Getty Images Gabriel Aponte/Getty Images

Jadson contrariou o pai e confiou em Carille

Jadson teve duas passagens pelo Corinthians. Se a primeira marcou pela qualidade do futebol apresentado em 2015, foi na segunda que ele conquistou mais títulos. Com Fábio Carille no comando, o camisa 10 levantou três Paulistas (2017 a 2019) e o Brasileirão de 2017. Mas se dependesse do pai dele, Ismael, a história seria outra.

O Corinthians terminou 2016 sem técnico e sem vaga na Libertadores. A situação de incerteza motivou um conselho em casa para pensasse bem na ideia de voltar. "Meu pai achava que o time poderia não estar muito legal, que seria melhor fechar com outra equipe. Eu falei para ele: 'pai, o negócio é o seguinte, eu quero voltar pra lá, acho que vai dar certo. Vamos ver'".

E Jadson estava certo. Fábio Carille foi efetivado como treinador, e o Corinthians deslanchou. A "quarta força" do Paulistão terminou campeã estadual. Meses depois, ainda levantaria a taça do Brasileirão após passar o primeiro turno todo invicto.

Esse negócio de quarta força mexeu um pouco com o brio de cada um. A gente foi para cima e terminou campeão."

A volta de Jadson foi um pedido do próprio Carille. Ainda na China, o meia disse ter recebido uma ligação do treinador, que já o conhecia da época em que era auxiliar de Mano Menezes e depois de Tite.

"O Carille é um cara especial na minha vida. Ele me ligou e disse: 'Jadson, eu quero você aqui. Estou precisando que você volte. Você vai entrar, vai se encaixar no meu jogo'. Ele é um cara sensacional, ouvia bastante os jogadores, dava espaço para todo mundo falar".

Alexandre Schneider/Getty Images Alexandre Schneider/Getty Images

"Jogava feio, mas ganhava"

O primeiro turno invicto não blindou o Corinthians de críticas em 2017. Era comum ouvir que o time não encantava e que jogava feio, mesmo conquistando 47 dos primeiros 57 pontos do Brasileirão daquele ano.

"Muita gente criticou, falando que a gente jogava feio. Mas jogava feio e vencia. 1 a 0, 1 a 0, 1 a 0, mas eram três pontos. O que vale no futebol é a vitória. Não adianta querer jogar bonito, futebol moderno, futebol inovador e não vem resultado. A pressão vai ser bem maior. Nossa equipe estava fazendo arroz com feijão, mas conseguiu um título importante", defende Jadson.

Na mesma intensidade em que disparou no início, o Corinthians despencou na metade do Brasileirão daquele ano. As vitórias ficaram escassas e o que parecia um título garantido virou medo de perdê-lo para o rival Palmeiras, como bem pontuou Neto, durante uma das edições do "Donos da Bola".

"Aquele jogo contra o Palmeiras foi fundamental. A torcida foi até o treino na Arena para apoiar. Entramos muito concentrados e saímos com a vitória por 3 a 2. Se a gente perdesse ali, e depois o Brasileiro, a torcida ia nos cobrar muito. Pela forma que começou o campeonato, terminar sem ser campeão ia ter uma cobrança muito grande."

Eu achava que dava para o Carille continuar, mas foi uma opção da diretoria. Futebol é feito de resultados e a equipe não estava bem

Jadson

Mauro Horita/AGIF/Mauro Horita Mauro Horita/AGIF/Mauro Horita

"Sua hora chegou"

Uma conversa dentro do ônibus do Corinthians em 2015 foi fundamental para que Jadson construísse sua história no clube. Ali, Tite avisou que o meia viraria titular da equipe após a saída do uruguaio Nico Lodeiro para o Boca Juniors.

"O Tite falou comigo ainda dentro do ônibus antes do jogo com o Marília: 'sua hora chegou. Abraça sua chance'. Depois daquilo, as coisas foram fluindo e não perdi mais a titularidade".

Tite havia acabado de voltar ao Corinthians, substituindo Mano Menezes. O treinador queria jogar com dois meias. Renato Augusto era um deles. O outro seria Jadson ou Lodeiro, que aparecia como favorito na pré-temporada.

"Foi importante a confiança que o Tite depositou em mim. Outras equipes estavam interessadas, mas ele não me deixou sair: 'Não vou te liberar. Você vai ficar aqui e pronto. Você é meu jogador e acabou'. Ele era como um pai para mim no futebol".

A aposta de Tite rendeu a Jadson um dos melhores anos em números pelo Corinthians. O camisa 10 fez 16 gols e deu 24 assistências na temporada. No fim do ano, levantou o troféu de campeão brasileiro.

Daniel Augusto Jr./Agência Corinthians Daniel Augusto Jr./Agência Corinthians

"Renadson" levou Tite à seleção

O time montado por Tite em 2015 fez com que o treinador, enfim, fosse chamado para comandar a seleção brasileira. As atuações daquele Corinthians, liderado por Jadson e Renato Augusto, transformaram o gaúcho em unanimidade para substituir Dunga após o fracasso do Brasil na Copa América de 2016.

A dupla encantava os torcedores. Nas redes sociais, o personagem "Renadson" foi criado pela dificuldade em apontar qual dos dois teria sido o melhor jogador do Brasileirão. Renato Augusto acabou eleito pela CBF, mas não quis levar o prêmio sozinho.

"Acho que esse título não é só meu. Queria dividi-lo com o Jadson. Não teria ganho esse prêmio sem ele. Queria, pelo menos, uma salva de palmas para o Jadson", disse durante a cerimônia.

"Eu joguei com muitos jogadores importantes na minha carreira, mas aquele 2015 ficou marcado. Eu tenho uma amizade muito boa com o Renato, desde a época em que eu cheguei lá. Ele é um cara sensacional", relembra Jadson.

Bruno Domingos/Mowa Press Bruno Domingos/Mowa Press

"Seleção me fez voltar ao Brasil"

Tite e Renato Augusto estiveram na Copa do Mundo de 2018. Mas, no caso de Jadson, a maior esperança havia se voltado ao Mundial disputado quatro anos antes, por aqui. Integrante do elenco campeão da Copa das Confederações de 2013, ele ficou fora da lista final de Felipão.

"Em 2013, eu estava no São Paulo e a gente brigava contra o rebaixamento. Acho que isso acabou pesando um pouco para 2014. Comecei o ano muito bem no Corinthians, mas o Felipão optou por outros jogadores. Eu fiquei na expectativa, mas já disputei uma Copa América, uma Copa das Confederações. Sou grato por isso".

Jadson foi presença constante na seleção brasileira entre 2011 e 2013, primeiro com Mano Menezes e, depois, com Felipão. Das sete partidas que fez, cinco foram como titular, dando uma assistência e marcando um gol.

O sonho de disputar uma Copa do Mundo foi um dos fatores que pesaram para Jadson deixar a idolatria que tinha no Shakhtar Donetsk e fechar com o São Paulo, em 2012.

"Eu fiquei sete anos e meio no Shakhtar. Às vezes, ouvia alguns comentaristas: 'pô, o Jadson. O Jadson não aparece'. O futebol ucraniano não era muito divulgado naquela época mesmo. Isso foi algo que pesou para eu voltar ao Brasil. Eu queria voltar para mostrar que tinha condições de defender a camisa da seleção. Quando o São Paulo me abriu as portas, foi a chance para que o pessoal conhecesse um pouco mais do meu futebol."

Buda Mendes/LatinContent via Getty Images

São Paulo

"Meu primeiro ano foi muito bom, nos classificamos para a Libertadores. Quando o Ganso chegou, eu estava muito bem e acabei não dando brecha. Mas sabia da pressão que era disputar posição com ele, porque era um grande jogador. Quando o Muricy chegou, ele optou pelo Ganso e não tive mais chances. Por isso não pensei duas vezes quando surgiu a proposta do Corinthians."

Tony Marshall - EMPICS/PA Images via Getty Images

Shakhtar Donetsk

"Ali era uma vitrine muito boa para outros clubes. Fui muito feliz lá, a minha família se adaptou bem. Foram anos importantes na minha vida e na minha carreira, sempre jogando Liga dos Campeões, Liga Europa. Um dos jogos que me fez chorar na carreira foi justamente o do título da Copa da Uefa, contra o Werder Bremen. Fiz o gol e acabamos campeões. Tenho muito respeito por eles."

Futuro entre a Ásia e o Brasil

Jadson ainda não quer se aposentar. Mostrar que erraram em tirá-lo do Corinthians é combustível para mais uns anos de futebol profissional. Ele vai seguir enquanto o corpo aguentar.

"Enquanto conseguir jogar bem e sem lesões, vou indo. Mas se me machucar muito e não conseguir atuar bem, aí em dois ou três anos já começo a pensar em cuidar das minhas coisas e seguir a minha vida".

A grande dúvida agora é saber onde Jadson passará os últimos anos da carreira. Depois de uma negociação frustrada com o Coritiba, o empresário dele, Marcelo Robalinho, afirmou ter conversas com clubes dos Emirados Árabes Unidos e do Qatar. Permanecer no Brasil, porém, agrada mais.

"Falo com o Marcelo Robalinho diariamente. Estou no aguardo das negociações, porque tudo parou por causa da pandemia. Se for uma coisa boa, poderia ir para o Oriente Médio, mas ainda penso em seguir jogando aqui no Brasil. Minha família já está estabilizada, está todo mundo aqui".

A estabilidade no Brasil aumentará no próximo mês, com a chegada do terceiro filho do casamento dele com Renata. Maria Helena será a primeira menina do casal. Com ela, o camisa 10 espera acompanhar o crescimento que o futebol impediu com os outros dois.

"Isso vai ser importante para mim. Nesse período que estou em casa, consegui ter mais tempo para os meus filhos. E você começa a perceber o valor da família. Esse contato maior no dia a dia é uma coisa diferente para mim".

Reprodução

Churrasquinho faz parte da vida

Jadson bebe e não esconde. Aos 36 anos, ele não liga para as críticas que tentam relacionar isso a algum tipo de comportamento pouco profissional. "Eu bebo uma cervejinha, mas não vou para balada, não fico fazendo festa até 4h da manhã na rua. As pessoas têm que saber diferenciar".

Os gostos quando não está trabalhando foram mudando com o tempo. A balada da época de jovem foi substituída pelo churrasquinho com os amigos e a família. "Isso faz parte da vida. Tem que saber diferenciar a parte profissional da parte familiar para poder viver também. Senão você morre e tem que enterrar o dinheiro junto com você e nem viveu a vida".

A bebida não era a única coisa que colocava Jadson na mira dos críticos. A forma física era fiscalizada de perto. "Mas eu sempre levei de boa, sempre fui muito brincalhão. As críticas que vinham eu trazia para o lado positivo. Abalar, ficar nervoso com esse negócio, jamais. Sou um cara tranquilão".

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