Amuleto verde

Artilheiro de decisões nos anos 90, Oseas diz por que acredita no tri do Palmeiras na Libertadores de 2021

Aurélio Nunes Colaboração para o UOL, em Salvador Aurélio Nunes/UOL

Gols, ele não sabe dizer ao certo quantos fez. Calcula que foram mais de 200. Se foi muito mais, ou menos, não importa. Quantidade nunca foi problema para Oseas Reis dos Santos, autodenominado Oseinha da Bahia. Para ele, bastam os dedos das mãos para resumir sua incrível presença de espírito nos momentos mais decisivos.

Nas finais da Série B de 1995 pelo Athletico-PR, das Copa do Brasil, Mercosul e Libertadores pelo Palmeiras, entre 1998 e 1999; e da Copa do Brasil de 2000 pelo Cruzeiro, o artilheiro das trancinhas estava lá. E em todas as partidas que definiram esses títulos, Oseas balançou as redes. Decisão era com ele!

"Nos gols decisivos papaizinho do céu sempre me abençoando. Fazer um gol como aquele da final contra o Cruzeiro, papaizinho me abençoou. Acho que fazer um gol da virada da Libertadores, que levou a decisão pros pênaltis, foi uma decisão bacana, estava iluminado naquele momento", relembra, puxando a brasa para a sardinha do Palestra Itália, onde viveu seu apogeu técnico.

As lembranças desses momentos estão estampadas nas paredes do memorial que construiu para si, na área social da casa onde vive, em Salvador, no minitrio elétrico que mandou fazer para animar as reuniões familiares à beira da piscina e até mesmo na plotagem feita na porta do elevador - sim, a casa de Oseas tem um.

Oseas não esconde sua torcida pelo Palmeiras na busca pelo tri. Depois da angustiante classificação diante do Atlético-MG na semifinal, os campeões de 1999 e 2020 estão em mais uma decisão. A equipe dirigida pelo português Abel Ferreira encara o Flamengo em 27 de novembro, em Montevidéu, no Uruguai.

O Palmeiras vem numa crescente. E cresce quando joga o favoritismo para o outro lado. Foi a mesma coisa contra o Atlético-MG. Todo mundo achava que o Atlético, um time que está jogando bem, em primeiro lugar no Brasileiro, era o favorito. Mas dentro de campo só jogam 11 e o Palmeiras teve a capacidade de, mesmo perdendo de 1 a 0, ir buscar o resultado. E com torcida. É a mesma coisa agora. Flamengo tem uma seleção, mas o Palmeiras sempre cresce".

Na última decisão da Libertadores, postou fotos em seu perfil no Instagram ao lado do filho Lucas vibrando com o título diante do Santos, depois da final disputada em janeiro deste ano no Maracanã.

Em 1999 Oseas brilhou com um gol no jogo decisivo contra o Deportivo Cali no antigo Palestra Itália, ajudando a levar a disputa para os pênaltis. Será que a torcida alviverde contará desta vez com mais um artilheiro de decisões?

Aurélio Nunes/UOL

Oseas conta quem são seus técnicos 'queridinhos'

Joel Silva/Folhapress

"Ah, que bom seria... se o Oseas voltasse pra Bahia"

Os gols que eram fartos começaram a rarear para Oseas nos anos seguintes, com passagens menos memoráveis por Santos, Internacional e por dois clubes do futebol japonês, o Vissel Kobe e o Albirex Niigata. Em 2005, com apenas 34 anos de idade, o atacante decidiu pendurar as chuteiras depois de passar pelo Brasiliense.

"Parei com 34. Poderia continuar, mas sei lá, pra querer enganar? Eu curti mais a família, teve tudo isso, entendeu? Mas acho que eu poderia ter jogado um pouquinho mais", reconhece.

Negro, baiano e com tranças no cabelo, Oseas disse que nunca foi alvo de preconceito no futebol. E minimiza o coro nada elogioso que teve de ouvir calado da própria torcida do Verdão.

"Passei quase três anos no Palmeiras, não é só gloria e teve um protesto realmente, os caras foram lá no centro de treinamento protestar e o meu [coro] era esse: 'Ah, que bom seria... se o Oseas voltasse pra Bahia'. E eu quietinho, só pensando: tô doido pra voltar pra Bahia, tô doido pra ir pra Salvador curtir."

Oseas saiu do Palmeiras há mais de duas décadas. Mas o Palmeiras nunca saiu de Oseinha da Bahia. Dia 27 de novembro contra o Flamengo, mais uma vez o herói de 1999 vai estar na torcida.

Não só o Paulo Nunes, como o grupo em si. O elenco inteiro faz parte. Felipão, não, ele é mais reservado, mas a galera tá lá.

Oseas, sobre o grupo de Whatsapp do elenco alviverde campeão da Libertadores de 1999

Reprodução/Athletico Paranaense

De artilheiro-faxineiro à seleção

Criado no Alto da Teresinha, subúrbio ferroviário de Salvador, Oseas é um dos oito filhos de Manoel e Ana Reis dos Santos. Começou jogando no campo de várzea do bairro, de onde um olheiro o levou para o Galícia, time local, depois de se recusar a fazer teste em três oportunidades.

Do Galícia partiu para uma insólita experiência de um ano emprestado ao desconhecido Juvenil de Ponteareas, clube galego que disputava a terceira divisão do Campeonato Espanhol. O time era profissional, mas o salário, não. Tanto assim que ele teve de dividir as tarefas de artilheiro do time no domingo com as de faxineiro no dia seguinte.

"O interessante é que todos os meus colegas de pelada achavam que eu tava ganhando dinheiro, mas eu não tava. O Juvenil era da terceira divisão, ganhava pouco e, pra ajudar, no lugar que eu dava espetáculo no domingo, eu e o Gildo, a gente tava lá na segunda-feira pra limpar os bancos, pra ganhar um dinheirinho a mais. Não vou me esquecer nunca desses fatos", relata.

Antes da fama, Oseas ainda jogou por empréstimo no Maruinense, de Sergipe, onde recebia R$ 400, e depois foi negociado ao Uberlândia para receber R$ 1.000 mensais. Quando finalmente foi contratado pelo Atlético-PR, por um salário de R$ 7 mil, achou que tinha chegado ao paraíso.

"Daqui eu não saio mais", dizia. Saiu, não sem antes conhecer a fama e realizar o sonho de ser convocado para três amistosos da seleção brasileira. Jogou apenas uma partida com a camisa verde e amarela, mas não reclama da sorte. "Não tinha como não, só tinha cara bom. Ronaldo tava voando, ai é covardia. Só de estar do lado do homem tava bom demais."

Evelson de Freitas/Folhapress Evelson de Freitas/Folhapress

Gols a favor e contra

No Palmeiras, Oseas consolidou a fama de artilheiro das decisões, com gols marcados em três conquistas até então inéditas para o clube. A primeira delas é a mais marcante. A decisão se encaminhava para os pênaltis quando, aos 44min do segundo tempo pegou um rebote do goleiro do Cruzeiro e, mesmo quase sem ângulo, decretou o gol do título da Copa do Brasil 1998.

Seria a redenção para um jogador até então marcado por um gol igualmente inexplicável - só que contra, e diante do maior rival: uma cabeçada fulminante contra a meta defendida por Velloso, para a alegria dos corintianos.

Uma história que se repetiria no Cruzeiro. "Eu fiz gol contra no Cruzeiro, mas esse não foi tão ... quanto o do Palmeiras. Eu subi pra tirar de cabeça, raspei e desviei do goleiro André. Em seguida eu chutei de fora da área (no ataque), coisa rara pra mim, e fiz o gol em Clemer. Final do jogo 1 a 1, dois gols meus. São histórias, né", ri.

Gol contra antes, título depois. Também no Cruzeiro, Oseas voltou a ser campeão da Copa do Brasil, em 2000. Não marcou na decisão contra o São Paulo, é verdade, mas terminou a competição como artilheiro, com 10 bolas na rede. Aliás, o ex-atacante ostenta ainda hoje a condição de quarto maior goleador da história da competição, com 28 gols marcados. Este ano, só pode ser ultrapassado por Gabigol, que tem 24.

Reprodução/Instagram

Cento e tantos quilos

Quem é o Oseas hoje? Depois do futebol, o antigo goleador conseguiu se estabelecer como empresário do ramo imobiliário. Fora isso, mantém como principal adversária a balança.

Aos 50 anos, Oseas calcula que pesa "cento e tantos quilos", contra os 78kg que ostentava no auge da forma física. Ele briga contra a balança participando de babas (peladas) com ex-colegas de ofício que vivem em Salvador e tentando seguir os conselhos da nutricionista Cristiane, paranaense que conheceu em São Paulo e com quem é casado há 21 anos.

"Ela pede para eu evitar feijão e moqueca, que é muito gordurosa, pra eu comer mais salada e reclama que não me vê comendo legumes. Mas eu sou baiano, sabe como é, se eu não comer feijão com farinha eu não almocei", brinca.

Matthew Ashton/EMPICS via Getty Images Matthew Ashton/EMPICS via Getty Images

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