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Um italiano nascido nos EUA é o novo homem mais rápido do mundo

Lamont Marcell Jacobs comemora com a bandeira da Itália a medalha de ouro nos 100 m rasos dos Jogos Olímpicos de Tóquio - Ian MacNicol/Getty Images
Lamont Marcell Jacobs comemora com a bandeira da Itália a medalha de ouro nos 100 m rasos dos Jogos Olímpicos de Tóquio Imagem: Ian MacNicol/Getty Images

Beatriz Cesarini

Do UOL, em Tóquio (Japão)

01/08/2021 11h42

O silêncio ensurdecedor do Estádio Olímpico de Tóquio sem torcedores foi preenchido por um show de luzes no centro da pista. Todos estavam atentos à maior e mais nobre prova das Olimpíadas que, desta vez, não teria Usain Bolt: os 100m rasos.

Em uma arena onde tudo acontece ao mesmo tempo, tudo para, até mesmo o ar, para ouvir o tiro que dá a largada para descobrir quem é o homem mais rápido do mundo. Sim, mesmo sem Bolt, e sabendo que ninguém ali era capaz de bater o recorde mundial de 9s58 do jamaicano, o vencedor da corrida que iria acontecer dali a minutos receberia esse título.

Pelo menos, aconteceu algo inesperado.

No meio do favoritismo dos norte-americanos e de uma surpresa chinesa que correu os 100m em 9s83 uma hora antes, um corredor vestido de azul que denunciava sua origem italiana surgiu do nada para ganhar a medalha de ouro —o nome do vencedor, Lamont Marcell Jacobs indicava outra coisa, mas deixamos isso para depois. Sim, tínhamos agora um ragazzo mais rápido do mundo.

E lembra daquele silêncio? Não existia mais e os italianos cumpriam à risca o que a gente espera do povo barulhento que nós também somos. Entre gritos, pulos e soluços chorosos, eu ouvi um "Isso não é possível." Era o jornalista Luca Lovelli, que assistiu à prova ao meu lado. "Eu não consigo acreditar até agora! Ninguém de nós esperava por isso".

Não importa que o italiano que venceu os 100m rasos tenha nascido nos EUA, na nada italiana cidade de El Paso, no Texas, e tenha escolhido chamar seus filhos de Anthony e Jeremy. Aquele azul era italiano, aquele barulho era italiano e o comportamento de Lamont Marcell era italiano.

Nem o próprio Jacobs acreditava. Quando perguntamos se ele esperava aquela medalha, ele respondeu: "Não, é incrível. Meu verdadeiro sonho era chegar aqui e correr a final e vencer a final. É incrível, sem palavras para descrever este momento. Eu acho que preciso cinco ou quatro dias para entender o que está acontecendo, mas é realmente incrível. É inacreditável. Eu trabalhei muito duro para estar na melhor condição. É incrível", disse.

Tão italiano quanto Jacobs, Gianmarco Tamberi foi vencedor da medalha de ouro no salto em altura poucos minutos antes da glória dos 100m. O abraço dos dois, que pareceu um final natural da corrida de Jacobs, também foi italianíssimo. "É fantástico porque ontem à noite eu joguei Playstation com o Marco no meu quarto e nós falamos: 'Você imaginou se nós ganharmos?'. 'Não, não, não... É impossível, não pense nisso'. E hoje, quando nós nos vimos cinco minutos antes de eu ganhar a medalha de ouro eu disse: ok, eu acredito. Eu quero acreditar e fiz", disse Jacobs quando perguntei a ele sobre as duas medalhas em entrevista logo após a prova.

Quem também foi ao abraço foi Luca, o jornalista que estava ao meu lado. Enquanto eu olhava a reação dos agora homens mais rápidos do mundo, ele invadiu a área de competição para abraçar os dois italianos. Nessas horas, o código de conduta não vale muito. Acho que são momentos assim que fazem alguém sonhar em ser jornalista esportivo.

E, para manter um padrão mínimo de objetividade jornalística que nós aprendemos na faculdade, é preciso explicar sempre ao leitor o que aconteceu. Aqui vai: Jacobs, filho de uma mãe italiana que se mudou dos EUA para a Itália com um ano (e só conheceu o pai, que vive no Texas, nesse ano e por mensagem), venceu os 100m nos Jogos Olímpicos de Tóquio com o tempo de 9s80. Em segundo lugar veio o norte-americano Fred Kerley, com 9s84, e em terceiro, o canadense Andre de Grasse, com 9s89. Os três nunca tinham corrido tão rápido em suas vidas.

Esse é o resumo, mas o mais divertido foi o que você leu acima. A história foi feita hoje, em Tóquio, e o imprevisível deu ainda mais magia aos Jogos Olímpicos.