O que você fazia aos 13?

Rayssa Leal dança na final olímpica, zoa repórteres e se torna a mais jovem medalhista brasileira da história

Felipe Pereira e Talyta Vespa Do UOL, em Tóquio (Japão) e São Paulo Ezra Shaw/Getty Images

Os brasileiros acordaram hoje (26) com uma pergunta: o que faziam da vida quando tinham 13 anos? É o efeito Rayssa Leal. Na idade em que a maioria não tem coragem de convidar o/a coleguinha para dançar, ela mostrava como é que se faz: dançava na final olímpica do skate street como uma tik-toker.

Na idade em que quase ninguém tem algum feito notável, Rayssa conseguiu o que nenhum brasileiro jamais fizera: se tornou a medalhista olímpica mais jovem da história do esporte brasileiro. A garota de 13 anos, e aparelho nos dentes, ficou com a medalha de prata na prova de street do skate —que estreia no calendário dos Jogos.

Para se ter uma ideia do quão precoce ela é, o COI (Comitê Olímpico Internacional) teve que abrir uma exceção na bolha anticovid para que sua mãe, Lilian, pudesse viajar ao Japão —lembrando que o país está fechado para estrangeiros por causa da pandemia e só os poucos credenciados (que tiveram seu número reduzido em relação ao plano inicial, também por causa da covid) receberam autorização para entrar. Sorte do Brasil.

O patamar de Rayssa é tão diferente do resto do mundo que, antes da prova, ao pegar uma garrafa d'água, trocou uma ideia com o ícone Tony Hawk. A relação entre os dois mostra que a dancinha na final olímpica não é marra: Rayssa chama o maior skatista da história de "Toninho" —e ele tuíta sobre a menina desde 2015, quando ela tinha sete anos.

Espontânea, ela não escondeu a tristeza em ter que dar mais entrevistas ao ver um bando de jornalistas esperando na zona mista. Já tinha gastado muito a palavra falando com as TVs e preferia seguir direto. Entrevistas são um preço a pagar pela medalha —elas são obrigatórias para todo mundo que sobe ao pódio olímpico.

E não tem essa de passar pano. Quando um repórter mencionou uma foto dela com a camisa do Grêmio que torcedores do time estavam compartilhando, Rayssa respondeu na hora. "Ah meu Deus, misericórdia, não". Personalidade de campeã.

Ezra Shaw/Getty Images

A prova

No meio da final olímpica no Ariake Park, em Tóquio, uma voz brasileira saiu do alto-falante. Chorão, vocalista do Charlie Brown Jr., cantava que "só os loucos sabem". Foi a senha para Rayssa. Ela mostrou todo seu talento e superou quase todas as concorrentes para ficar com a segunda colocação (14,64 pontos). O ouro ficou com a japonesa, também de 13 anos, Momiji Nishiya (15,26), que ainda viu a compatriota Funa Nakayama (14,49) levar o bronze.

No skate street, os skatistas se apresentam sete vezes. Duas, em voltas completas de 45 segundos, com várias manobras. As outras cinco são apenas uma manobra. Cada passagem vale pontos, de 0 a 10. E valem os quatro melhors placares. Rayssa foi bem nas duas primeiras, mas brilhou mesmo nas manobras isoladas. Em sua terceira volta, fez 4,21 pontos. Foi o suficiente para assumir a liderança com dois saltos para o fim.

Na penúltima manobra, acertou em uma rodada em que a maioria das competidoras errou: 3,39. Porém, a japonesa Momiji Nishiya brilhou e roubou a ponta, deixando a decisão para o último salto. A brasileira foi para o tudo ou nada. Precisava de pouco mais de três pontos para superar a rival, mas não completou o movimento e teve que esperar o restante das competidoras.

Momiji Nishiya, que já era líder, acertou a última chance. A compatriota Funa Nakayama, atrás de Rayssa e única ainda com chance do ouro, errou. A prata era da brasileira.

Rayssa deitou no chão e ficou olhando o céu antes da tentativa derradeira de voltar ao ouro. Não conseguiu, mas nem por isso deixou de comemorar. Chorou logo na primeira entrevista. As palavras não saíam e ela cobriu o rosto com a camiseta.

Estar dançado ali é muito engrado porque desde ontem a gente fez um TikTok, e ficou ali se divertindo. Eu tento o máximo fica mais leve

Rayssa Leal

Desde o começo das minhas redes sociais o sonho foi ter meu primeiro milhão. Ontem eu ganhei um milhão e hoje tenho dois milhões

Rayssa leal

Feliz porque minha história e a de muitas outras skatistas quebrou toda esta barreira de que skate era só para meninos.

Rayssa Leal

Currículo curto, mas vitorioso

O currículo de Rayssa Leal é um fenômeno, apesar da pouca idade da atleta. Aos 11 anos, Fadinha foi campeã brasileira e, aos 13, acumula diversos títulos entre torneios nacionais e internacionais.

Um dos mais importantes deles, até a medalha olímpica, é a etapa da SLS (Mundial de Skate Street), em Los Angeles, conquistada pela menina também aos 11 anos, no mesmo ano em que levou o brasileiro. Rayssa é a atleta mais jovem a conseguir o título.

Aos 12, a jovem skatista foi indicada ao Prêmio Laureus, considerado o Oscar do Esporte. Ela foi, ainda, vice-campeã mundial em 2019, ano em que chegou a ser líder do ranking, e 4ª colocada no XGames. Em 2020, Rayssa chegou à terceira colocação no mundial.

Tá bom pra você?

Eles respondem o que faziam aos 13

  • @octaviobuzz

    A Rayssa é muito especial. Um ser humano iluminado. Com 13 anos eu tava comprando o pacote grande do fandangos atrás do mega tazo.

    Imagem: Reprodução/Twitter
  • @GIFZONE1997

    E pensar que com 13 anos eu tava jogando café mania no Orkut

    Imagem: Reprodução
  • @cornetatoquio

    Rayssa Leal é braba demais. Cê é loco, que história. Com 13 anos eu tava matando aula pra jogar fliper.

    Imagem: Divulgação
  • @marianaspinelli

    Eu com 13 anos tendo piriri antes dos jogos pela escola na copa mercantil e a fadinha fazendo VAPO nas OLIMPÍADAS 100% TRANQUILONA

    Imagem: Divulgação
  • @brunozor

    com 13 anos eu só conseguiria ir pra Olimpíada se fosse na competição de instalar vírus no meu próprio computador.

    Imagem: TodaTeen
  • @taelovelyboy

    Gente, a menina com 13 nas Olimpíadas. Eu com 13 anos, tava defendendo o Justin Bieber no Facebook.

    Imagem: Getty Images
Patrick Smith/Getty Images Patrick Smith/Getty Images
Instagram
Rayssa e o pai, Haroldo

Filha de guerreiros

Os pais de Rayssa foram imprescindíveis para que a filha chegasse às Olimpíadas aos 13 anos —e já medalhasse no primeiro ano em que o skate se tornou esporte olímpico. Parafraseando Charlie Brown Jr., "filho de guerreiro, a família vem primeiro".

As condições financeiras da família eram complicadas, mas a mãe de Rayssa se esforçava para ajudar a filha a praticar o esporte que tanto gostava. "Minha esposa assistia a vídeos na internet, de skate, e mostrava para ela. Ela assistia e tentava copiar. Tentava, treinava, treinava, treinava. Daí a mãe dela ajudava a aperfeiçoar -depois de aprender pela internet como ensinar a filha a fazer as manobras. E assim seguiam as duas até ficar tudo bem redondinho", diz Haroldo Leal, o pai, em entrevista ao UOL Esporte.

Não é à toa que, com a medalha no peito, o carinho de Rayssa foi direcionado aos pais. "Não consigo explicar essa sensação. Depois de todo o esforço que minha mãe fez, essa medalha é muito especial para mim. Ela e meu pai me apoiaram desde o início", disse, ao ganhar a prata.

"Meu pai e minha mãe estiveram nos melhores e nos piores momentos [da trajetória]. Saíram com a cara e a coragem para estar aqui, no meu primeiro campeonato olímpico, estreia do skate no evento. Estou com uma medalha na mão. É muito especial."

A condição para permanecer no skate, imposta por eles, é que a filha estude. A escola é adaptada à rotina de competições, mas a atleta precisa conciliar as duas coisas.

Por que fadinha?

Patrick Smith/Getty Images

Rifas para competir

Rayssa nunca foi de boneca, segundo o pai. O negócio dela sempre foi o skate, com o qual Fadinha teve o primeiro contato por meio de um amigo da família.

"Nosso amigo deu um skate para ela de presente, e ela começou a brincar o tempo todo. Ele ficava apreensivo, com medo de que ela caísse, se machucasse -enfim, aquele cuidado que se deve ter com criança", relembra.

"Só que ele percebeu que ela tinha talento, e começou a levá-la para a pista. Ela tinha seis anos. Nosso amigo sugeriu, ainda, que a gente também começasse a levá-la para praticar. A gente até ia, mas ela brincava mais em casa. O skate era o brinquedo preferido dela naquela época, e era no quintal de casa que ela praticava", afirma.

Haroldo conta, ainda, que, em Imperatriz (MA), o pessoal veterano do skate via a fadinha na pista e dizia: "Continuem com ela no skate que isso vai mudar a vida de vocês". "Então, aconteceu o campeonato brasileiro em Blumenau. A gente inscreveu a Rayssa em apoio à decisão dela de ir. Ela dizia que era um sonho".

Segundo o pai, a família vendeu rifas para conseguir comprar a passagem de ida para Santa Catarina. A ideia era ir de avião e voltar de ônibus, uma vez que as passagens aéreas estavam bastante caras. "O dinheiro estava bem contado. A gente precisava se alimentar lá. Ia faltar", relembra Haroldo. Chegando lá, entretanto, a confederação brasileira de skate promoveu uma vaquinha para que a família voltasse de avião -afinal são quase três mil quilômetros entre Blumenau e Imperatriz.

"Deu certo. Rayssa voltou para casa aos seis anos de idade com o título de campeã brasileira. Se fosse necessário passar por tudo isso de novo, eu passaria, só para rever aquele sorriso dela."

O legado

Mesmo aos 13 anos, Rayssa Leal já inspira tantas outras jovens meninas que têm descoberto na infância a paixão pelo skate. Uma delas, fã de carteirinha da campeã olímpica, é Sky, filha da skatista Karen Jonz e do cantor Lucas Silveira.

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No começo, eu ouvia o tempo todo que não tinha que andar de skate, tinha que estudar porque o skate não dava futuro. Deixei todos esses comentários de lado graças ao meu pai e à minha mãe, que me levaram para um campeonato brasileiro. Depois dele, falei: quero o skate; quero ser campeã olímpica."

Rayssa Leal, mais jovem medalhista olímpica do Brasil

Queridinha dos famosos

  • Camilla de Lucas

    O Brasil extremamente apaixonado pela Rayssa Leal. É sua, fadinha! Pra gente você já tem o primeiro lugar! A mais jovem do Brasil fazendo história!

    Imagem: Imagem: Reprodução/Instagram@camilladelucas
  • Preta Gil

    Obrigada, Rayssa Leal, por me fazer chorar de emoção! Uma fada de verdade, com garra, foco, graça e muito muito talento.

    Imagem: Alex Santana
  • Gil do Vigor

    Roubei esta imagem para dizer que você, Rayssa Leal, é uma inspiração. Eu te amo e estou honrado por você existir e ensinar todo o Brasil. Brilha!

    Imagem: Divulgação
  • Bruna Marquezine

    Eu acredito em fadas! Acredito, acredito!

    Imagem: Reprodução/Instagram
  • Luciano Huck

    A nossa medalhista Rayssa Leal , uma maranhense de 13 anos, nos lembrando que: lugar de mulher é onde ela quiser!

    Imagem: Vídeo/Reprodução
  • Xuxa

    Parabéns, Fadinha! Su pozinho de pirilim-pimpim deixou muitos brasileiros orgulhosos. Nós precisávamos!

    Imagem: Blad Meneghel/Divulgação
Ezra Shaw/Getty Images  Ezra Shaw/Getty Images

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