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Contrato suspeito da CBDA tem mochilas por R$ 690 e indica superfaturamento

Nota fiscal que mostra os valores pagos por mochilas e bolas de fisioterapia - Arte/UOL
Nota fiscal que mostra os valores pagos por mochilas e bolas de fisioterapia Imagem: Arte/UOL

Demétrio Vecchioli

Colaboração para o UOL, em São Paulo

06/04/2017 18h49

Suspeitas de desvios nas compras realizadas pela Confederação Brasileira de Desportos Aquáticos (CBDA) junto a uma empresa registrada no endereço onde funciona um pet shop na capital paulista serviram como principal argumento para que a Polícia Federal deflagrasse a operação Águas Claras, que levou à prisão o ex-presidente da entidade, Coaracy Nunes, além do diretor financeiro Sérgio Ribeiro Lins de Alvarenga e do coordenador de polo aquático Ricardo Cabral.

Os três estão entre os responsáveis pela aplicação do convênio 777081/2012, de R$ 1.694 milhão, que visava “promover a aquisição de equipamentos específicos” para a prática de maratonas aquáticas, nado sincronizado e polo aquático, sob o argumento da preparação para os Jogos do Rio-2016. Um dos produtos mais caros adquiridos, porém, foi um sistema para a marcação do campo para o chamado “polo aquático mar”, modalidade disputada em águas abertas e que não é olímpica.

Boa parte dos produtos, especialmente os de polo aquático, foi adquirida junto à Natação Comércio de Artigos Esportivos LTDA, empresa registrada no número 2224 da Rua Pio XI, no bairro do Alto da Lapa, em São Paulo. A reportagem tentou contato telefônico com a loja, mas a atendente, que ela identificou como “Pro Swim”, disse que não estava apta a falar.

O UOL Esporte destrinchou os documentos apresentados ao Ministério do Esporte pela CBDA e mostra o que foi comprado junto à Pro Swim, comparando com os preços de mercado. No total, o contrato entre CBDA e Pro Swim envolveu a compra de R$ 1,265 milhão em produtos. O advogado da entidade, Marcelo Franklin, não foi encontrado para comentar.

Mochila

Alguns itens aparecem genericamente tanto no contrato quanto na nota fiscal da Pro Swim. É o caso de seis “mochilas de rodinha compatíveis com o transporte de um notebook de 15 polegadas". A CBDA pagou R$ 690 por cada unidade desse produto, que aparece na nota fiscal como “Mochila com rodinha”.

As fotos apresentadas pela CBDA ao Ministério do Esporte (à direita na imagem abaixo) mostram que se trata de uma mochila da marca Targus, que é encontrada em sites de e-commerce, como o Submarino, por R$ 299. Menos da metade do preço pago pela CBDA em 13 de novembro de 2014.

Motor para bote

Pode parecer estranho, mas um motor para bote é um item necessário no treinamento para diversos esportes, entre eles a maratona aquática. Mas, ao Ministério do Esporte, a CBDA só explicou que pretendia comprar quatro “motores para bote 15 hp”. É também isso que consta na nota fiscal, sem especificar marca. Sem predefinição de modelo ou qualquer outro item, a entidade deveria comprar o produto mais barato. Ela acabou comprando três deles por R$ 6.699 cada. Uma rápida busca na internet permite encontrar motores de 15 hp a partir de R$ 1.300. A reportagem não encontrou, no portal de convênios do governo federal, fotos do produto adquirido.

Bolas para fisioterapia

A CBDA comprou da Pro Swim 20 bolas conhecidas como “medicine ball”, de borracha, utilizadas para fisioterapia. Pagou R$ 520 pela versão de 10 kg e R$ 320 pela de 5kg. As marcas mais uma vez não foram especificadas nos documentos disponíveis. No site Netshoes é possível encontrar os mesmos produtos por respectivamente, R$ 175 e R$ 125, menos da metade do que pagou a CBDA há dois anos.

Maca dobrável de alumínio

As imagens das macas dobráveis compradas pela CBDA mostram que elas são da marca Legno, que podem ser encontradas em sites especializados por R$ 550. No documento fiscal da Pro Swim, porém, consta a venda de “Maca de fisioterapia portável alumínio com altura regulável” por R$ 1.590 cada. Foram compradas sete unidades.

Cronômetro com impressora

Foram compradas 42 unidades de um cronômetro que já vem com impressora. Todos do modelo SP12 S143 da Seiko, como demonstrado no contrato firmado entre CBDA e Pro Swim e nas fotos apresentadas ao Ministério do Esporte. O produto atualmente pode ser comprado nos Estados Unidos, por US$ 300, mais frete, num total de pouco mais de R$ 1.050. A CBDA, porém, pagou R$ 1.679 cada.

Produtos de pouca demanda

A maior parte dos produtos comprados pela CBDA junto à Pro Swim, porém, são de pouca demanda e não podem ser encontrados facilmente à venda na internet. São esses também os produtos mais caros comprados por meio deste convênio.

É o caso, por exemplo, de um sistema de cronometragem de tempo para polo aquático, inicialmente cotado a R$ 240 mil e comprado por R$ 293 mil – um aumento de mais de 20%. Cada um dos quatro jogos de traves, também para polo, saiu por mais de R$ 25 mi, enquanto dois “conjuntos de câmera subaquáticas” custaram R$ 70 mil. O sistema para polo aquático mar foi comprado por R$ 190 mil.