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Namoro fez judoca trocar Alemanha por Brasil. Paixão pelo país a fez ficar

Guilherme Costa

Do UOL, no Rio de Janeiro

27/06/2015 06h00

A paixão mudou a vida da judoca alemã Anne Lisewski, 25. Em março de 2014, ela deixou a Europa para viver em Jacarepaguá, no Rio de Janeiro, a fim de ficar mais perto do namorado, o também judoca brasileiro Victor Penalber, 25. O relacionamento acabou, mas a atleta germânica já estava suficientemente envolvida para tomar outra decisão passional: encantada com o Brasil, decidiu ficar e agora tenta resolver trâmites burocráticos para mudar de país também no esporte.

“Não sei se vou ficar para sempre, mas quero continuar e lutar aqui. Quero me colocar na seleção brasileira – estava na seleção alemã, mas o judô no Brasil é bem mais profissional. Acho que posso aprender muito”, contou a judoca em entrevista exclusiva ao UOL Esporte.

O judô foi apresentado a Anne na infância, por influência de um garoto vizinho que era vítima constante de bullying. “O pai dele indicou os treinos, mas ele pediu para eu ir junto. Lá todo mundo também era muito ruim e zombava dele, e eu acabei batendo em todo mundo. O treinador achou que eu tinha talento, e eu acabei ficando”, disse a atleta.

Anne foi indicada para a escola de esportes de Berlim, um dos grandes centros de formação de atletas no país europeu. Foi campeã nacional duas vezes entre os juniores – categoria em que também amealhou cinco medalhas de prata em âmbito europeu. Como profissional, a despeito de ter tido trajetória marcada por lesões, conseguiu quatro pódios em Copas do Mundo de judô (uma prata e três bronzes) e três em torneios nacionais (duas pratas e um bronze).

“Aí encontrei meu ex-namorado numa competição, vim para cá e lutei aqui. Cheguei em março do último ano, fiquei seis meses, treinei, competi, e depois fui para a Alemanha. Aí fiz um plano para voltar e para tudo dar certo com o judô”, explicou Anne.

A judoca treina no Instituto Reação, projeto social criado pelo ex-atleta Flavio Canto – mesma equipe de Victor, aliás. Em 2014, Anne foi medalhista de prata no Grand Prix de judô disputado em São José dos Campos (SP) – perdeu para Bárbara Timo a decisão da categoria até 70kg.

“O sistema aqui é um pouco melhor. São vários treinadores, com profissionais responsáveis por áreas específicas – a preparação física, por exemplo. A Alemanha tem apenas dois técnicos para toda a equipe. É bem mais difícil. A Alemanha não tem tanto dinheiro quanto aqui”, comparou Anne.

A questão estrutural, contudo, não foi o único aspecto que encantou Anne no Brasil. Aliás, não foi nem o principal: “A comida! O que eu mais gosto aqui é a comida. Gostei das coisas mais tradicionais, como arroz, feijão e picanha. Picanha é muito bom! Também gostei de pastel de catupiry com camarão e das sobremesas. Não pareço, mas tenho cabeça de gorda. Gosto de cozinhar e comer”.

No Brasil, festas e trilhas também encantaram Anne. Em contrapartida, o acúmulo de lixo chamou atenção da judoca. Antes mesmo de obter documentação definitiva para ficar, a atleta começou a desenvolver um projeto com esse foco no novo país.

“Há lixeiras, mas todo mundo joga o lixo fora. Nós pensamos em um projeto porque talvez falte conhecimento sobre isso. Queremos fazer apresentações sobre o lixo e o que pode acontecer com todo o ecossistema se você não souber cuidar. Depois, queremos levar as crianças a locais para recolher o lixo”, explicou Anne, que tem desenvolvido a iniciativa com uma amiga. O projeto já foi apresentado a Flavio Canto, e a ideia é começar com os meninos que treinam no Reação.

Além do acúmulo de lixo, Anne reprovou um aspecto da vida brasileira. E é claro, a análise tem a ver com questões culinárias: “Sinto falta do leite. Gosto de bolo com leite, e o leite daqui é muito fino”.

A judoca ainda não fez um aviso formal à CBJ (Confederação Brasileira de Judô) sobre a intenção de defender o Brasil em competições internacionais, mas já deu entrada na documentação para obter cidadania brasileira. Por causa desse processo, Anne já não considera a possibilidade de brigar por uma vaga nos Jogos Olímpicos de 2016, que serão realizados no Rio de Janeiro. “Para mim, a Olimpíada é a de 2020”, disse ela.

“O Brasil tem três vagas por categoria. Na minha, as vagas são da Maria Portela, da Bárbara Timo e da Nádia Merli. Não sei se todo mundo vai continuar depois de 2016, mas acho possível me colocar dentro”, avaliou a judoca alemã.

O principal entrave para isso é que a definição da seleção leva em conta o ranking, e Anne precisa da cidadania brasileira para começar a somar pontos. “Estou no caminho. Ainda tenho de resolver questões para ganhar o passaporte. É um pouco difícil, mas estou tentando. Se não der certo, vou ter de encontrar alguém aqui para casar”, concluiu rindo a judoca.