! Orlando, recordista de gols sofridos, curte aposentadoria - 31/07/2007 - Pelé.Net - Por onde anda
UOL Esporte UOL Esporte
UOL BUSCA

31/07/2007 - 09h16

Orlando, recordista de gols sofridos, curte aposentadoria

  Na minha pequena área atacante nenhum conseguia cabecear
(Orlando Pataca, que apesar de ser o recordista em gols sofridos num único jogo do Campeonato Gaúcho, afirma que era imbatível na bola área)
Orlando Moreira Alves
Data de nascimento: 14/06/1949
Sant'Ana do Livramento (RS)

Times
- 14 de Julho (1969)
- Fluminense-RS (1970 a 1974)
- Grêmio Santanense (1974)
- Guarany de Bagé (1975)
- Riograndense (1975 e 1976)
- Ferro Carril (1976)

Títulos
- Nenhum
Nico Noronha, do Pelé.Net

PORTO ALEGRE - Orlando Pataca diz que é descendente de uma linhagem que mistura índios e bugres. Nasceu em Sant'Ana do Livramento, cidade que faz fronteira com Rivera, Uruguai. Para dar mostras de sua ascendência mostra duas pequenas protuberâncias ao lado de cada um dos dedos mínimos. "Nasci com seis dedos em cada mão e os dois a mais foram arrancados", disse ele, enquanto caminhava à beira-mar no sábado frio e ensolarado em que recebeu a visita da reportagem do Pelé.Net.

Pelé.net
Em 1976, Orlando virou capa de revistas por ter sofrido 14 gols do Internacional
Orlando Pataca, goleiro aposentado, mora na praia de Cidreira, a pouco mais de 100km de Porto Alegre, dividindo quarto em uma pousada com sua terceira esposa, Dione. Na pequena cidade litorânea, personagem histórico que é, a comunidade o conhece bem, ainda mais agora que começou a ensinar a meninos da Escola Profissionalizante de Futebol (Esprof) os segredos da meta.

Dois feitos dos anos 70 o tornaram famoso. O primeiro deles foi ter sido apontado pela revista Veja, numa edição de 1972, como o goleiro mais gordo do futebol brasileiro, devido aos 106kg socados num corpo de 1,79m. O segundo e mais famoso dos dois fatos: sofreu 14 gols num único jogo do Campeonato Gaúcho, em 1976, e seu recorde se mantém ate hoje. Nunca mais alguém viu a bola chegar tantas vezes à rede como ele.

Defendia o Ferrocarril, de Uruguaiana, que encarou o poderoso Internacional, o indiscutível melhor time do Brasil, naquela na tarde de 23 de maio. Sofreu os 14 gols, cinco no primeiro tempo, nove no segundo, mas ninguém colocou em questão ter sido ele o melhor jogador de seu time. "Foram 47 chutes com direção certeira na meta e outros tantos que saíram para fora. Fiz milagres naquele dia", lembra Orlando, frase que pode parecer uma brincadeira, uma ironia, mas foi exatamente o que aconteceu.

O terrível gol de Escurinho
O Ferrocarril era o time de pior campanha no Campeonato Gaúcho de 76, mas naquela tarde, quando atravessavam o túnel rumo ao gramado do Beira-Rio, os jogadores fizeram um pacto para, contra o Inter, fazer a partida de suas vidas. Nunca haviam jogado em um estádio tão grandioso e estavam dispostos a valorizar o fato ao extremo.

Deu tudo errado. Logo a 1min o volante Caçapava acertou uma bomba indefensável, de fora da área, e fez 1 a 0. O mesmo Caçapava, que não costumava fazer gols em ninguém, voltou a marcar aos 6. E ainda no 1º tempo Genau, Carpegiani e Flávio ampliaram para 5 a 0, com o que os atletas do time de Uruguaiana desceram para o vestiários humilhados e cabisbaixos

Apenas Orlando se mantinha altivo,orgulhoso. Havia feito defesas espetaculares em chutes e cabeceadas do perigosíssimo Escurinho e até provocara o atacante colorado: "Eu posso levar um monte de gols, mas de ti, não". Desafio aceito, Escurinho voltou para o segundo tempo decidido a fazer o seu.

Aos 2min Valdomiro fez o 6º, Ramón o 7º, Cláudio Duarte o 8º, Figueroa o 9º, Valdomiro o 10º e Ramón, aos 24min, o 11º. E nada de Escurinho fazer o seu. "Pode chutar", provocava o gordo Orlando, que recém nascido ganhara do avô o apelido de "Pataca", pois o velho o comparara com as grossas e pesadas moedas conhecidas como "patacões".

Pois não é que aos 28 o zagueiro Almerindo, do Ferrocarril, erra o chute, dá uma "rosca", engana Orlando, e a bola pára quase sobre a risca fatal, próxima a Escurinho, que apenas empurrou para a rede? Gol. Rompia-se ali o último fiapo de orgulho de Orlando, que pouco se importou em ver sua meta ainda vazada outras duas vezes, por Ramón e Valdomiro.

O Ferrocarril deixou o gramado aos frangalhos, silencioso. A única voz que se ouvia era a de Orlando, xingando o traidor, o atrapalhado Almerindo.

Orlando quer ensinar meninos a evitar gols
Atualmente Orlando passa longe das balanças, mas admite estar pesando "cerca de 120kg", 14 a mais do que o período em que virou matéria da Veja e foi página inteira da Placar pelos 14 a 0 diante do Inter. Mas ainda assim voltou a trabalhar nos gramados, agora para ensinar jovens com idade entre 14 a 17 anos a evitar gols.

"Eu era muito bom na saída de bola e se levei dois gols de cabeça dentro da pequena área em toda minha carreira, foi muito" conta Orlando, que destaca dois entre os alunos que orienta atualmente na Escola Profissionalizante de Cidreira. Diz ele que ambos poderão ser grandes profissionais do futebol brasileiro: Rodrigo, 17 anos, e Eduardo Paloschi, 16, 1,89m, esse apontado como de potencial indiscutível.

Orlando tenta passar os segredos que aprendeu na carreira, mas diz que só não orienta os meninos a serem tão agressivos quanto ele era na defesa de sua meta. Exemplifica: "Num jogo contra o Pelotas, em 1972, o atacante deles era o Ademar, que fazia gol em todo mundo. Naquele jogo quando a bola veio alta e ele pulou na entrada da área para cabecear, voei e dei um soco na nuca dele, mandando lá longe, e ficou desacordado por 10 minutos, Pensei que tinha matado o cara", lembra, e ri.

Orlando Pataca é um bonachão. Conta suas histórias e a filha mais nova, do segundo casamento, a pequena Franccine, 12 anos, que acompanha o relato de suas histórias orgulhosamente. Moradores da cidade passam por perto e fazem questão de cumprimentá-lo.

Poucos na pequena Cidreira são tão famosos como o ex-goleiro - aposentado como funcionário da Companhia Riograndense de Telecomunicações -, que além do corpanzil, do recorde de gols sofridos, já foi segurança em bares noturnos, e proprietário de uma boate chamada "Consulado da Cerveja". Uma figura incomum.

Hospedagem: UOL Host