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Luiz Gomes: 'Cruzeiro aposta em notáveis para sair do buraco. Mas isso basta?'

31/05/2020 07h50

A vida dos clubes brasileiros, em tempos de Covid 19, está complicada. Isso é certo. Mas a situação do Cruzeiro, muito mais do que isso, é dramática. Dívida em ascensão galopante, operações policiais, ações judiciais, denúncias de improbidade de todos os lados tornaram o clube mineiro praticamente inadministrável. A punição imposta pela Fifa, com a perda de seis pontos logo de saída na disputa da Série B, abre perspectivas ainda mais sombrias para o time celeste. O que leva alguém, então, a querer ser presidente de um clube como esse, em um estado de calamidade como esse?

Parece incrível, mas há quem queira. O advogado Sérgio Santos Rodrigues topou essa parada. E teve de lutar para chegar lá, enfrentando uma eleição tumultuada, sob forte pressão da torcida, em que venceu o empresário Ronaldo Granata. Por folgada margem, diga-se de passagem. Ambicioso, apaixonado, idealista, oportunista, que sentimento terá afinal motivado o novo mandatário cruzeirense. Jovem, tem apenas 37 anos, Rodrigues toma posse nesta segunda para um mandato-tampão que vai até dezembro. Ele já havia se candidatado uma vez, perdido a eleição presidencial de 2017 para Wagner Pires de Sá, justamente o homem que está no centro da epidemia moral que se abateu sobre a Toca da Raposa.

O modelo amador de gestão dos clubes brasileiros, com raríssimas exceções, não traz bons resultados. O gigantesco endividamento da grande maioria deles é apenas a face mais visível desse fracasso. O que menos costuma importar nesse tipo de comando são as necessidades do clube, o equilíbrio administrativo e financeiro. Afinal, é fácil para os cartolas gastar o dinheiro que não é deles em contratações estapafúrdias e despesas inúteis. Não raramente, esses dirigentes descambam para uma perigosa mistura de interesses pessoais e eleitoreiros que deixam de lado as posturas republicanas e a ética. Foi o que ocorreu no Cruzeiro.

Desse mal, Sérgio Rodrigues parece livre. Afinal, não há nada na roubada em que se meteu, que possa lhe proporcionar qualquer tipo de benefício. O que ele conseguiu para si, nos próximos sete meses, é exatamente o contrário, pura aporrinhação, motivos de sobra para ter dor de cabeça. Começou essa semana, antes mesmo de tomar posse, quando teve de desdobrar-se para pagar, com a ajuda de um patrocinador, salários do elenco e parte da dívida de R$ 11 milhões com o Zorya da Ucrânia pela transferência do atacante Willian, evitando que o clube fosse novamente punido pela Fifa e perdesse mais seis pontos, o que praticamente inviabilizaria a volta à elite na temporada de 2021.

Sérgio recebe a presidência do Cruzeiro de um conselho de notáveis que geriu o clube nos últimos meses depois da explosão dos escândalos que levaram à renúncia de Wagner Pires de Sá. Ao montar sua equipe tem demonstrado que pretende seguir a toada dos notáveis, cercando-se de cruzeirenses ilustres, bem sucedidos em suas áreas de atuação profissional e de notório conhecimento técnico. O que é mais importante, dispostos a um trabalho voluntário para reerguer o clube.

É uma iniciativa louvável e claramente bem intencionada, como bem intencionado revela-se o novo mandatário. Mas não deixa de ser um risco. Um clube de futebol do tamanho do Cruzeiro e ainda mais na situação que atravessa o Cruzeiro, exige mais do que paixão e voluntarismo. Ao conhecimento técnico e à competência deve juntar-se, necessariamente, a disponibilidade. E isso é algo que nomes como o tecladista da banda Skank, Henrique Portugal, e o presidente da Samba Tech, Gustavo Caetano, que vão cuidar de inovação, os publicitários Edson Potsch e Matheus Gonzaga e o advogado Flavio Boson terão de provar que vão ter para oferecer ao clube. Tomara que dê certo. O Cruzeiro precisa dar uma virada, seu lugar, definitivamente, não pode ser esse a que a corrupção, os desmandos, e a incompetência de anos o fizeram chegar.