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Bernard revela: "Tive contato de clubes brasileiros e europeus"

REUTERS/Valentyn Ogirenko
Imagem: REUTERS/Valentyn Ogirenko

21/12/2017 07h30

Melhor temporada na Europa, golaço no Manchester City e classificação para as oitavas de final da Liga dos Campeões. Assim tem sido a fase de Bernard no Shakhtar Donetsk, da Ucrânia. Mais maduro, o atacante reencontrou o grande futebol do Atlético-MG, que o levou para o Velho Continente e à Copa do Mundo de 2014.

Em entrevista exclusiva ao LANCE!, Bernard fala do bom momento pelo Shakhtar Donetsk e a responsabilidade de substituir Neymar no fatídico 7 a 1 diante da Alemanha, no Mundial. Com contrato até o fim da temporada, atacante falou sobre rumores da volta ao Brasil e possível saída do time ucraniano.

Você vem fazendo a sua melhor temporada no futebol europeu, com nove gols e destaque na Liga dos Campeões. O que mudou no Bernard das últimas quatro temporadas para o de hoje?
Nos primeiros três anos, não tive tantas oportunidades e tive alguns problemas com o antigo técnico. Desde que o Paulo Fonseca chegou ao Shakhtar, venho sendo titular. A minha quarta temporada, a primeira com ele, foi muito boa. Essa é a minha quinta no clube e está sendo ainda melhor. Esses dois anos mostram um pouco do que posso apresentar, venho tendo as chances na equipe. Mudou bastante a forma de o Shakhtar jogar. O Paulo deu uma estrutura nova, uma cara nova para o Shakhtar, com o pensamento dele. E os jogadores absorveram bem as informações e colocaram em prática. Não só eu tive esse crescimento, mas todo o grupo evoluiu. Lidei bem com todas as informações novas que recebi nesse período e cresci bastante, não só taticamente, mas também em relação ao posicionamento, coisa que nos três anos anteriores não consegui. O técnico não tinha uma cabeça tão aberta, tinha pensamentos mais antigos, e acabou que eu não pude aprender tanto como estou aprendendo agora.

Você passou a ser titular absoluto após a chegada do técnico Paulo Fonseca. Qual a importância do treinador português no seu crescimento no Shakhtar?
Não só os jogadores que precisam procurar evoluir, se dedicar mais. No futebol, não há espaço para acomodação, precisa dar sempre o seu melhor. Se não fizer isso, vem outro jogador mais motivado e agarra a oportunidade. Os treinadores também são assim. Têm que procurar cada vez mais ter conhecimentos novos, evoluir, saber como é o futebol moderno. O Paulo tem muito disso, é um técnico novo, com uma mente aberta. Ele estuda bastante os adversários, tenta colocar suas ideias. Deu uma outra cara para o Shakhtar, os resultados vêm demonstrando isso. Ouvi muitas pessoas falando depois do sorteio dos grupos da Liga dos Campeões que a gente poderia nem terminar em terceiro e ir para a Liga Europa. Fizemos 12 pontos em uma chave muito difícil. Mas não é só isso. Na temporada passada, ganhamos todos os campeonatos aqui na Ucrânia. O que estamos fazendo dentro de campo mostra o grande trabalho do Paulo Fonseca.

Na temporada passada, vocês foram bem na Liga Europa e conquistaram tudo na Ucrânia, acabando com a hegemonia do Dínamo de Kiev. Já era um sinal do bom trabalho do treinador?
Infelizmente, tivemos alguns problemas no país, quando estourou a guerra política. A partir do momento que mudamos para Kiev, nos dois anos que ficamos aqui, perdemos os dois Campeonatos Ucranianos para o Dínamo. Quando o Paulo chegou, conseguimos quebrar essa sequência deles. Ganhamos o Ucraniano, Copa da Ucrânia, Supercopa... É importante para os jogadores, pois vínhamos sentindo essa falta de estrutura, de mando de campo. Sendo assim, com um trabalho muito bem feito, com foco e entrega de todos os jogadores, conseguimos voltar a vencer.

O Paulo Fonseca fez a promessa de se vestir de zorro caso o Shakhtar Donetsk avançasse às oitavas de final da Liga dos Campeões. Como é esse lado mais brincalhão do treinador? Ele fez alguma outra promessa, caso vocês avancem ainda mais na competição?
Fui pego de surpresa também na hora que vi que ele iria vestido de zorro na coletiva de imprensa caso a gente se classificasse. Não sei o motivo pelo qual ele prometeu isso, mas foi muito divertido. Após o jogo, todos os jogadores, no ônibus para ir ao aeroporto para voltar a Kiev, estavam rindo bastante, um mostrando para o outro as fotos do zorro. Ele mesmo chegou no aeroporto e colocou a máscara novamente. Foi um momento de distração, de brincadeira, e isso foi bom. Só a gente sabe o quanto se esforçou para conseguir essa vaga. Ele ainda não fez nova promessa. Caso ele faça, espero que possamos vê-lo como zorro ou qualquer outra máscara que for.

A vitória sobre o Manchester City garantiu a classificação do Shakhtar para as oitavas de final da Liga dos Campeões. Essa era a grande meta da equipe para a temporada? O que esperar das próximas fases da competição?
Creio que sim. Era um jogo muito importante e difícil. Poderia comprometer diretamente a nossa temporada, pois entramos agora na pausa de inverno no futebol ucraniano, não tem como jogarmos. Ficaremos um mês de férias e outro em pré-temporada. Só voltamos a jogar em meados de fevereiro. Era um momento marcante para a gente, sabíamos da nossa responsabilidade, o quão difícil seria o jogo. Com o foco e a entrega que todos os jogadores tiveram, alcançamos o nosso resultado, com muita dedicação, todo mundo correndo. É um feito para a gente se classificar em um grupo tão complicado como o nosso.

Essa pausa por conta do rigoroso inverno atrapalha de alguma forma, talvez pelo time chegar para os duelos com ritmo abaixo dos rivais europeus?
Eu acho que sim. É complicado dizer se isso pode vir a atrapalhar. Tem muitos times que continuam atuando, como os ingleses na Premier League. Em outros lugares não param tanto tempo como nos Campeonatos Ucraniano e Russo. Os jogos de pré-temporada não são a mesma coisa das partidas que enfrentávamos nos torneios para valer. Vamos entrar com um ritmo um pouco abaixo dos demais, mas isso não pode ser desculpa. As oitavas de final da Liga dos Campeões são muito importantes, o mundo todo está acompanhando, é mais uma oportunidade para todos os jogadores demonstrarem o seu valor. O mais importante é saber que passo a passo vamos tentar conquistar as classificações e irmos o mais longe possível.

Contra o City, você fez um golaço, acertando o ângulo de Ederson, em um jogo que valia a classificação. Essa atuação, com o Tite na arquibancada, pode ser uma credencial para uma possível volta à Seleção, às vésperas da Copa do Mundo?
Eu fico feliz não só pelo gol, pela classificação do Shakhtar, principalmente com o Tite na arquibancada, assistindo à partida. É mais uma oportunidade de ele ver os jogadores. Tenho um desejo muito grande de voltar à Seleção Brasileira, mas é um momento complicado, pois ele já testou diversos jogadores. Acredito que já tenha um grupo fechado, ele já tem ideia dos jogadores que quer levar. Fico feliz com meu empenho, com minha atuação. Tenho esse pensamento, mas fica essa expectativa. Tenho o desejo de voltar, preciso ter a cabeça no lugar porque as funcionam exatamente assim. Vou continuar trabalhando para voltar a ter atuações como a que tive contra o City e, se pintar uma nova convocação, quem sabe eu possa agarrá-la e ter uma sequência de jogos na Seleção.

O Tite entrou em contato com vocês do Shakhtar após a partida? Como ele já vem convocando o Taison, acredita que há ainda chance de entrar no grupo?
O Taison está fazendo por merecer. Está muito bem no Campeonato Ucraniano e também na Liga dos Campeões, assim como toda a equipe. Está todo mundo muito bem. A expectativa em voltar à Seleção sempre existe, mas vou deixar nas mãos de Deus e continuar fazendo o meu trabalho. Quando acabou o jogo contra o City, os jogadores estavam em êxtase pela vitória e classificação, e não demorou muito para irmos ao aeroporto para voltar a Kiev, uma vez que não podemos jogar em casa. Então, não cheguei a ver ninguém da CBF. Mas a impressão não só minha, mas de todos os jogadores, já tinha sido boa após o triunfo.

Você e outros brasileiros do Shakhtar foram elogiados pelo técnico Guardiola. Como analisa as palavras do treinador do City, considerado um dos melhores do mundo?
É uma felicidade muito grande. Para mim, é o melhor treinador do mundo. Vem fazendo um trabalho impressionante no Manchester City. Conseguimos acabar uma sequência de 20 vitórias seguidas da equipe na temporada, mas vem fazendo uma campanha também incrível na Premier League, o time ainda não perdeu nenhum jogo. É uma felicidade muito grande receber elogios dele, sei que os brasileiros daqui têm esse mesmo sentimento, por saber que fomos elogiados por um treinador excepcional, que vem treinando uma equipe incrível. Eles vieram com um time misto, sem força total. Mas entendi, pois tinham um clássico importante diante do Manchester United pelo Inglês e já estavam classificados em primeiro na Liga dos Campeões. Mas mesmo sendo uma equipe alternativa, havia muita qualidade, deu muito trabalho. Tivemos que correr e nos dedicar bastante para conseguir a vitória.

Acredita que a boa campanha do Shakhtar pode abrir portas para os gigantes do futebol europeu?
Meu pensamento é o de que precisamos buscar as vitórias, manter a dedicação nos jogos e treinos. Mas todos os jogadores do Shakhtar têm esse pensamento, de ir para um clube grande, ter uma transferência para uma liga mais forte. Sabemos que os problemas políticos aqui da Ucrânia fizeram que o campeonato perdesse um pouco de sua força, alguns clubes acabaram falindo. Tenho esse desejo sim, mas se o Shakhtar continuar fazendo esse trabalho do jeito que vem fazendo, a cada classificação na Liga dos Campeões, todo o grupo acaba se valorizando. E sei que tem muita gente vendo o que estamos fazendo aqui.

Quando saiu o sorteio da Liga dos Campeões, o Shakhtar caiu em um grupo com Manchester City, Feyenoord e Napoli. O que passou na cabeça de vocês após saber os adversários?
Desde o início, eu sabia que seria um grupo muito difícil. O Napoli, para mim, é um dos melhores times da Europa, é muito bem treinado. O Feyenoord, mesmo não tendo uma campanha tão boa na Liga dos Campeões, é o atual vencedor do Campeonato Holandês. O City dispensa comentários. O Feyenoord, que vinha de cinco derrotas seguidas, conseguiu bater o Napoli na última rodada. Isso mostra como esse grupo foi muito difícil. Isso valoriza ainda mais o nosso feito, de conseguir essa classificação. Pela qualidade dos adversários, o Shakhtar não era favorito e não pensávamos inicialmente na classificação. Mas com o passar dos jogos e das vitórias que alcançávamos, vimos que era possível.

Como é a rotina no Shakhtar? Conviver com muitos brasileiros ameniza a saudade do país?
Sem dúvida. Quando cheguei aqui eram 13 brasileiros, agora deu uma diminuída para oito. É sempre bom ouvir um idioma diferente do da Ucrânia, pois é muito difícil de entender. Ter essa convivência aqui, conversar com os brasileiros, estar entrosado cada vez mais. Isso é importante para o dia a dia do grupo, essa alegria dos brasileiros... isso é muito bom.

O Shakhtar tem oito brasileiros. Como é a 'panela' dos brazucas da equipe? Vocês costumam sair e fazer as coisas juntos pela Ucrânia?
É complicado, cada um tem sua família. A gente vive bastante junto. Nos jogos dentro e fora de casa nós temos que viajar e, por isso, estamos sempre juntos, nos aeroportos, concentrações. Quando estamos de folga, ficamos mais com a família, para descansar. Por conta dessa rotina, não temos muitos encontros fora desse ciclo do futebol. Mas a gente sabe do valor de cada um aqui, isso é o mais importante.

Por conta da tensão política na Ucrânia, o Shakhtar não tem jogado em Donetsk. Atrapalha ter que jogar longe de casa? Por conta disso, a equipe treina e joga em qual cidade? Como esses problemas afetam o clube?
Sem dúvida atrapalha. A gente vive em Kiev e joga em Carcóvia. Por isso, está sempre viajando, cerca de 50 minutos de voo. Apesar de ser um tempo curto, é cansativo, por estar sempre pegando o avião, ficar em aeroporto. Mas não podemos colocar desculpas em cima disso, temos um clube a representar. Assim, é preciso nos dedicar ainda mais nos jogos para conseguir as vitórias e chegar aos títulos.

Como você soube que seria o substituto de Neymar?
O Felipão tinha me dito na noite anterior que eu seria o substituto. Eu fiquei muito feliz com a oportunidade, na minha cidade (Belo Horizonte). Foi um momento de êxtase para mim, por poder jogar uma semifinal de Copa do Mundo. Infelizmente não foi como esperávamos, mas tivemos que seguir em frente. Hoje, a Seleção vem demonstrando com números e futebol que tem colocado em campo o respeito que voltou a ter no cenário mundial.

Houve muito mistério até o anúncio de que você seria confirmado como titular no lugar do Neymar. Acha que foi "sacrificado" naquele 7 a 1?
Não vejo da forma como as pessoas veem, que às vezes me colocam como culpado em uma tarde tão trágica como essa para todos os brasileiros. Todos os atletas jogaram, não vou dizer supermal, mas pelo resultado deu para ver que não vivemos uma tarde muito feliz. Não entendemos o que aconteceu naquele dia, mas não acho que fui sacrificado. O Felipão fez uma escolha e tentei dar o meu melhor, me empenhar para poder substituir, lógico que não na mesma altura, pois o Neymar vivia um momento muito feliz na Copa, jogando muita bola. Então, não vejo nessa forma. As oportunidades são para serem agarradas e tentei fazê-lo da melhor forma possível.

O que lembra do intervalo daquele jogo? Qual foi o pedido do Scolari após o Brasil perder por 5 a 0 no primeiro tempo?
Não tem muito o que dizer. Os jogadores têm que voltar a campo, tentar reduzir esse placar de alguma forma. Fizemos uma pressão muito grande no início do segundo tempo, perdemos três chances de gol, que poderiam mudar um pouquinho o roteiro daquela semifinal, mas infelizmente não conseguimos. Acho que não tem muito o que dizer. A partir de um momento como esse, ir para o vestiário com um placar dilatado como os 5 a 0, temos que saber que precisamos voltar para o jogo e nos empenhar da mesma maneira.

O Felipão, certa vez, falou que você tinha 'alegria nas pernas'. E o 'apelido' pegou. Como você lida com isso? Vê algum problema?
Não. Não vejo problema algum. Foi um apelido que me marcou bastante, que me trouxe muita felicidade. Mas depois que aconteceu com a Seleção, muitas pessoas acabaram levando esse apelido pelo lado negativo. Mas não vejo problema algum, que me deu ainda mais confiança dentro da Seleção. É totalmente natural.

Aqui no Brasil, surgiram informações do interesse do Palmeiras e Flamengo em sua contratação. Houve, de fato, contato desses ou de outros times em você? Você veria com bons olhos a volta ao futebol brasileiro?
Teve interesse de clubes brasileiros, até pelo fato do meu contrato estar acabando, só vai até a metade do ano que vem. É um momento delicado, tenho vínculo com o Shakhtar até o fim da temporada e vou dar a oportunidade de conversar comigo, mas também não posso fechar portas, principalmente do Brasil. Fico feliz por esse interesse, mas primeiro vou ver o que o Shakhtar pensa, o que pode oferecer, e assim, caso não seja favorável tanto para mim quanto para o clube, aí vou sentar com outras equipes interessadas para ver qual é a melhor opção, o que é melhor para todos.

O Shakhtar já o procurou para tentar a renovação do contrato?
Já. Temos conversado, mas ainda temos um tempinho ainda para saber como será o desfecho. É um momento delicado, que não pode haver precipitação. Temos que sentar, conversar, analisar todos os pontos. Tenho 25 anos, pode ser o contrato da minha vida, da minha carreira. Geralmente, os vínculos são de quatro ou cinco anos. Então terei 29 ou 30 anos e, principalmente por isso, tem que ser muito bem pensado.

Além do Shakhtar, que busca a renovação, algum outro clube do futebol europeu já o procurou para assinar?
Há interesse de clubes europeus, muita coisa aparecendo. Por isso mesmo tem que ter a cabeça no lugar, tranquilidade, para poder saber e colher o melhor. O fator principal para mim é continuar me dedicando e, quem sabe, eu fique no Shakhtar, volte ao Brasil ou vou para outro time da Europa. Só vamos saber mais para frente e espero que seja o melhor para mim e para o lugar que eu vá atuar. As negociações são muito sigilosas, até mesmo para não ter nenhum erro. No momento, não tenho como dizer qual clube me procurou e nem o desfecho final.

Caso você não renove com o Shakhtar, há algum liga na qual você gostaria de jogar?
São várias ligas que não só eu, mas todos os jogadores gostariam de atuar: a Premier League, Espanhola, a Francesa, que vem recebendo muitos investimentos. Essas três ligas são muito fortes, que têm uma visibilidade imensa, e que são boas para mostrar meu futebol.

Tem acompanhado o Atlético-MG?
Tenho. Sempre vejo os jogos do Atlético. Agora que acabou a temporada brasileira, fica o gostinho de querer ver mais. Também vou tirar férias nesse período. Mas vi os jogos, acompanhei de perto. Não foi uma temporada tão espetacular, como todos nós atleticanos esperávamos, mas tenho certeza que o Atlético terá mais uma oportunidade no ano que vem de poder estruturar melhor e ter um pensamento melhor de contratações e estratégias para o clube. E assim possa evoluir ainda mais e voltar a disputar os títulos, como fez nos últimos anos e que não aconteceu em 2017.