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A um ano da Copa, seleção se vê diante do mesmo jejum do Brasil de 1990

Igor Siqueira

Do UOL, no Rio de Janeiro

21/11/2021 04h00

A exatamente um ano para a Copa do Mundo, o passaporte do Brasil está carimbado para o Qatar. Por lá, Neymar e Tite vão se deparar com uma marca negativa conhecida: em 2022, a seleção brasileira completará 20 anos sem um título mundial. É o mesmo período sem erguer o troféu que o Brasil levou nos ombros à Itália para a Copa do Mundo de 1990.

Um dos capítulos mais obscuros da história da camisa amarela em Copas, a equipe de 1990 ficou marcada como a da "Era Dunga", a equipe dos três zagueiros de Lazaroni e pela derrota para uma Argentina com "Maradona com uma perna só". Mas será que foi realmente tão ruim assim?

Seleção Brasileira e Argentina entram em campo para as oitavas de final da Copa do Mundo de 1990 - Peter Robinson - EMPICS/PA Images via Getty Images - Peter Robinson - EMPICS/PA Images via Getty Images
Ricardo Gomes e Maradona entram em campo para as oitavas de final da Copa do Mundo de 1990
Imagem: Peter Robinson - EMPICS/PA Images via Getty Images

Copa 90, o documentário

Para entender o fenômeno da Copa da Itália e o time que, quatro anos depois, finalmente devolveu o Brasil ao posto de melhor time do planeta, o UOL revive o antes e o durante daquele Mundial em "Copa 90 - Lazaroni, Maradona e uma seleção (talvez) injustiçada". O lançamento está marcado para o dia 30 de novembro e, em seis episódios, navegará pelas histórias que moldaram aquela seleção, da chegada do técnico Sebastião Lazaroni até a fatídica derrota para a Argentina de Diego Maradona, por 1 a 0.

"A gente tinha 20 anos sem ganhar Copa do Mundo e precisava ganhar. Tinha um peso. Se perder agora, vai a 24 de novo. Eu vejo que essa geração tem que fazer o que a gente fez. Se unir entre eles. Muitos desses jogadores já perderam duas Copas já: 2014 e 2018. Só eles que podem mudar tudo isso. Em 1990 ou 1994, só nós poderíamos mudar", comentou o ex-zagueiro Ricardo Rocha, um dos personagens de "Copa 90".

O documentário aborda, por exemplo, como a campanha da Copa América de 1989 formou a dupla Bebeto e Romário, como a decisão de adotar o esquema 3-5-2 pegou até os jogadores de surpresa e como as discussões constantes dentro do grupo — algumas devido a condutas controversas do comando da CBF, à época com Ricardo Teixeira — minaram o desempenho em campo. "Quem fica, um Neymar da vida, um Thiago Silva, tem que pegar a batuta e dizer: 'Eu sei o que é perder'. Eu, no meu caso, sei o que é perder e ganhar. Eles ainda não sabem. Quando eu vejo alguns deles, falo sobre isso, a importância do título mundial", completou Ricardo Rocha.

Em 1990, as referências eram pesadas para aquela equipe. Ainda havia ecos da seleção campeã do mundo de 1970, com craques como Pelé, Tostão, Jairzinho e Rivellino. E as memórias do Brasil de 1982, a seleção que jogou mais bonito desde o Tri, eram recentes. Hoje, os flashbacks são mais leves: o Penta e à família Scolari, com o brilho de Ronaldo Fenômeno, Rivaldo e Ronaldinho Gaúcho, ainda estão ali, mas as derrotas nas últimas Copas não têm o peso sentimental que a de 1982 teve.

Time de 90 e a base do Tetra

Seleção brasileira antes do duelo com a Escócia na Copa de 1990 - Peter Robinson/Getty Images - Peter Robinson/Getty Images
Seleção antes do duelo contra a Escócia: (em pé, da esquerda para a direita) Taffarel, Ricardo Rocha, Mauro Galvão, Ricardo Gomes, Jorginho e Branco; (agaicahdos) Romário, Alemão, Careca, Dunga e Valdo.
Imagem: Peter Robinson/Getty Images

Enquanto muitos lembram da Copa de 1990 como "aquela em que o Lazaroni não chamou o Neto", é impossível negar que existia qualidade naquela elenco. Dos 23 comandados por Carlos Alberto Parreira na Copa dos EUA, em 1994, dez eram remanescentes do elenco de Lazaroni. Mais do que isso, oito dos 11 titulares eram veteranos da Copa anterior: Taffarel, Jorginho, Aldair, Branco, Dunga, Mazinho, Bebeto e Romário — os outros dois eram Ricardo Rocha e Muller.

Alguns dos atletas que viveram a gangorra entre 1990 e 1994 hoje fazem parte da estrutura atual da CBF. Taffarel é preparador de goleiros da seleção, enquanto Branco coordena as categorias de base. Dunga, por sua vez, até já dirigiu o Brasil em duas ocasiões, uma delas na Copa de 2010.

O técnico Tite, hoje, toma um caminho semelhante. A base da seleção que se classificou nas Eliminatórias Sul-Americanas disputou a Copa de 2018. Estão lá Alisson e Ederson, Danilo, Marquinhos e Thiago Silva, Casemiro e Fred, Neymar, Gabriel Jesus e Roberto Firmino, por exemplo. A última convocação teve 11 jogadores do Mundial da Rússia.

Tite também já provou do "saber o que é perder" citado por Ricardo Rocha. Ele não esconde a frustração pela derrota frente à Bélgica nas quartas de final do Mundial da Rússia, em 2018. Mas sempre que confrontado com marcas histórias, tabus ou efemérides, o técnico da seleção costuma tirar o peso sobre quem é protagonista no período atual.

"A gente sempre baseou nosso trabalho em cima de conceito, metodologia e gestão. É a nossa marca. A questão de crendice ou tabu nunca foi discutida no nosso trabalho. Acaba sendo irrelevante para o nosso trabalho, para os atletas, para a comissão", disse ao UOL o auxiliar Cleber Xavier.

Ecos das frustrações passadas

Seleção do Brasil em campo para jogo contra o México em 2018 - Getty Images - Getty Images
Seleção do Brasil para jogo contra o México na Copa de 2018: Casemiro, Thiago Silva, Alisson, Neymar e Philipe Coutinho estavam na última convocação de Tite
Imagem: Getty Images

Antes da final da Copa América 2021, diante de uma Argentina que não conquistava títulos há 28 anos, Tite afirmou que "'quando a gente fica olhando para passado, não é referência" para o jogo que estava prestes a se realizar. Na última data Fifa, o treinador foi perguntado sobre o desempenho recente da seleção diante da Colômbia e rebateu: "Não é bom, nem ruim, é histórico."

A política atual da comissão técnica tem alguns "mantras" como o "merecer ganhar", propondo a ideia de jogar bem para isso, e o "mentalmente forte", que é autoexplicativo e trata dos aspectos psicológicos. E a conexão com o jejum atual tem a ver com as duas ideias.

Em 2006, com a eliminação para a França, os jogadores convocados chegaram ao Mundial longe do ideal físico e faltou o "merecer ganhar".

Em 2010, contra a Holanda, a derrota marcada pela falha de Julio Cesar e a expulsão de Felipe Melo não teve o "mentalmente forte".

Em 2014, em casa, o 7 a 1 foi uma tragédia sem rótulos.

Em 2018, caindo nas quartas diante da Bélgica, o Brasil teve uma campanha sem atingir seu ápice durante o torneio, com Neymar voltando de lesão. No jogo derradeiro, teve um primeiro tempo desastroso, que cobrou seu preço apesar da melhora e a pressão na etapa final.

O que não falta é exemplo para que o jejum não aumente.