Sexo antes dos jogos ajuda ou atrapalha o desempenho dos jogadores?
Ana Flávia Oliveira
UOL, em São Paulo
07/05/2021 04h00
No mundo esportivo, fazer ou não sexo antes de competições sempre foi um tema polêmico. Alguns especialistas são defensores da prática, argumentando que o ato não atrapalha o desempenho esportivo. Outros afirmam que o sexo antes dos jogos pode deixar os jogadores cansados e até causar lesões, a depender da intensidade do ato.
Nesta semana, o assunto ganhou um novo ingrediente: a goleira Elvira Todua, de 35 anos, do CSKA da Rússia, disse em entrevista a um canal do Youtube que normalmente as jogadoras não possuem restrições sexuais antes de partidas de futebol, contrapondo às que vê entre os homens. Mas e aí, será que o sexo antes dos jogos atrapalha, ajuda ou não influencia na performance dos jogadores?
Para Alex Meller, urologista da Unifesp e do Hospital Israelita Albert Einstein, é preciso separar o tipo de sexo que o jogador vai fazer. "Tem uma gama enorme de jeitos fazer sexo, fazer o sexo comum com a namorada, esposa ou numa balada, por exemplo. No primeiro cenário, o cara vai fazer sexo, dormir cedo. Esse tipo não vai atrapalhar, e o esforço físico vai fazer pouca diferença na performance do atleta no dia seguinte. Outra coisa é orgia, regada a bebida alcoólica."
Meller explica que o ato sexual, em até 24 horas antes da partida, pode até ser benéfico para o atleta. "Nos aspectos emocionais, o sexo proporciona conforto. No caso de jovens, com testosterona lá em cima, dá uma acalmada e pode trazer foco e concentração na hora do jogo", explica.
Ricardo Galotti, médico do esporte, que já trabalhou no Santos e no Corinthians, ressalta que cada caso tem que ser analisado individualmente."O sexo de intensidade mais alta acaba gerando um gasto maior de energia, um esforço físico. Vai depender do ato praticado e tempo de duração para saber como isso vai prejudicar o desempenho do atleta no dia seguinte."
Por essa razão, Galotti sempre aconselhou os jogadores com quem trabalhou que se abstivessem de praticar sexo até 24 horas das partidas. "No geral, a gente pede para não fazer antes das partidas porque é muito difícil mensurar o gasto energético e se ele vai dormir [depois]."
O médico também alerta para a possibilidade de lesões musculares. "Atletas relataram diversas vezes dores musculares por causa da atividade sexual", diz, antes de ressaltar: "O nível de exigência é muito grande. Atualmente os jogadores correm cerca de 10 km por partida. Então qualquer desgaste a mais pode gerar piora na performance."
Segundo ele, a solução para evitar problemas é concentrar um dia antes das partidas. No caso de competições mais longas, como Copa do Mundo e Olimpíada, em que os atletas ficam até dois meses em hotéis e vilas olímpicas, Galotti aconselha que o sexo seja praticado apenas nas folgas.
"Acho muito difícil manter um grupo fechado durante 30 dias. Não é produtivo. Essas competições, tipo Copa do Mundo, já têm um ambiente muito competitivo. Isso desgasta, gera cansaço emocional e físico. Aumenta atrito entre o grupo. A pessoa tem que sair, respirar outros ares", comenta.
"Se ele vai jogar amanhã, não precisa fazer sexo hoje"
Com passagens por clubes como Corinthians, Santos, Sport e Atlético-MG, o técnico Geninho defende a conscientização do jogador para evitar lesões e desgastes físicos em decorrência das atividades feitas extracampo.
"Eu acho que tudo tem o meio termo, consciência. Não sou contra o sexo desde que seja feito na hora certa. Acho até saudável. Mas ele disputa com físico. Eu passo para o meu atleta que sou contra sexo na véspera do jogo. Se ele vai jogar amanhã, não precisa fazer hoje", diz o treinador.
Geninho ressalta que a melhor maneira que técnicos e clubes evitarem problemas é concentrar nos próprios CTs ou em hotéis para evitar que jogadores deem "fugidinhas" atrás das parceiras. "Essa prática de concentrar dentro do CT é boa. Mas quando viaja não tem jeito, tem que concentrar no hotel. Então coloca segurança no andar. Mas não acho que a solução seja cercear, proibir. O que tem que mandar é o bom senso para que ele não se desgaste no dia do jogo", diz.
Sexo na concentração pode?
A decisão de liberar ou não o sexo nas concentrações em competições como a Copa do Mundo é do treinador, em conjunto com a comissão técnica e departamento médico. Não há uma regra e a cada quatro anos, o assunto volta à tona.
Na Rússia, em 2018, o técnico Tite deu cartão verde para que jogadores fizessem sexo nos dias de descanso e fora do hotel onde a seleção brasileira ficou concentrada.
"Acho que isso não pode ser encarado como tabu. Sexo é natural, faz parte, são jovens jogadores, com saúde perfeita. Nada mais natural que eles façam no seu momento de folga", declarou na época o médico da seleção, Rodrigo Lasmar.
A posição foi oposta à do então técnico da Alemanha, Joachim Löw, naquela mesma edição do Mundial. Além do sexo, ele proibiu que os jogadores se comunicassem com familiares e amigos sem o consentimento da comissão técnica.
Em 2014, Luiz Felipe Scolari também liberou a prática, mas impôs a condição de que o sexo fosse "normal, sem malabarismo". A posição foi antagônica à que ele tomou quando comandou a seleção pentacampeã do mundo em 2002, de abstinência forçada por quase 50 dias.
Em 2004, Ronaldo Fenômeno, que foi artilheiro daquela edição, disse à revista GC que o sexo ajudava a melhorar o desempenho dele em campo. "Já fiz sexo antes de partidas, apesar de os jogadores de futebol estarem concentrados e nem todos os treinadores permitirem. Mas nas vezes em que fiz sexo antes dos jogos meu desempenho foi muito melhor", sem explicar se estava se referindo à Copa de 2002, mas comentou sobre a abstinência forçada. "Acho que a Copa foi mais difícil [que ficar sem sexo]. Sexo daqui a pouco a gente vai fazer. Além disso, o Mundial só existe de quatro em quatro anos".
Na Copa do Mundo de 2006, na Alemanha, o então técnico da seleção brasileira, Carlos Alberto Parreira, também liberou o sexo na concentração. "Não penso que fazer sexo no dia anterior a um jogo possa afetar o desempenho do jogador. Sexo é bom e sempre bem-vindo. Sexo não é problema. O problema é o jogador não dormir, fumar ou beber álcool", disse na ocasião o treinador.
Kaká, então com 24 anos e recém-casado, discordou da decisão do comandante. "Antes dos jogos você tem de estar concentrado. Depois da partida, cada um com sua esposa, pode fazer sexo e outras coisas mais", declarou na época.