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OPINIÃO

Celso Roth: "Treinadores são muito individualistas, não existe classe"

Do UOL, em São Paulo

30/09/2020 12h00

Em meio a uma pandemia, o Campeonato Brasileiro já teve em apenas 12 rodadas, ainda sem todos os jogos delas realizados, um a série de trocas de técnicos, incluindo o Corinthians, o Sport, o Coritiba e o Bahia, além do caso de clubes como o Goiás, que trocou mais de uma vez. Técnico que trabalhou em diversos clubes brasileiros e foi campeão da Libertadores com o Internacional em 2010, Celso Roth critica a convicção e a formação dos dirigentes, cita o imediatismo e o individualismo dos treinadores como um problema do futebol brasileiro.

No Fim de Papo, live pós-rodada do UOL, Roth diz que não é possível construir um trabalho com bases se os técnicos não ficam mais que três meses nos clubes que os contratam, além de casos em que há ainda menos tempo, citando a demissão de Thiago Larghi no Goiás. Embora critique os dirigentes, ele também culpa os próprios treinadores pela situação.

"Os treinadores são muito individualistas, não existe classe de treinador. Se brinca quando se fala em classe de treinador, por isso que acontece o que acontece. Nós não temos amparo legal, os jogadores depois da mudança da Lei Pelé, eles têm um amparo, sim, eles têm um amparo, além de sair daquele regime de escravidão que era anterior à Lei Pelé, eles têm todo um amparo legal, então fica muito mais difícil para o clube, o clube faz um contrato de um ano ou dois, tem que pagar o contrato todo", diz Roth.

"O treinador, por não ser um classista, ele não tem amparo legal nenhum, por ser um individualista, um egoísta, porque quando eu estou trabalhando, eu não me importo com os outros, isso é o que infelizmente os meus colegas fazem e eu também, eu também estou inserido dentro dessa situação. Então essa é a realidade que nós temos, como é que nós vamos fazer trabalho ficando três meses, 60 dias? Hoje nós tivemos um exemplo, o treinador do Goiás que ficou 30 dias, jogos seis jogos. Então é culpa dele? É culpa de quem contratou, culpa de quem não tem convicção, é culpa do sistema, é culpa da estrutura que está montada", completa.

Celso Roth questiona a formação dos dirigentes e a falta de convicção deles como motivos para não haver a continuidade no trabalho dos técnicos como no futebol europeu, em que Jurgen Klopp permaneceu no Liverpool mesmo em um período sem ganhar títulos.

"Que convicção tem o dirigente? Que formação tem o dirigente para ser dirigente? Que sequência na formação o dirigente tem para ser dirigente? Nós temos um sistema presidencialista no Brasil, então esse sistema vem obviamente dos conselhos dos clubes, mas até então os clubes até 10 anos tinham os conselhos que eram feitos pelos sócios e tinha toda uma burocracia para ser conselheiro. Hoje não, hoje a torcida vota, hoje o torcedor que está atuando no clube como torcida organizada, daqui a pouquinho ele pode concorrer", diz o técnico.

Faltou humildade aos técnicos brasileiros até o 7 a 1

Para o treinador, também faltou humildade ao futebol brasileiro, em especial os técnicos, que no período vencedor do país não trocava informações com os estrangeiros e que se percebeu após a Copa do Mundo de 2014 que havia uma defasagem no trabalho realizado no Brasil em relação a outros países no futebol europeu.

"Tivemos que perder uma Copa do Mundo de 7 a 1 para começar a se dar conta que nós temos que nos interligar com os treinadores do mundo, principalmente os europeus. Até então nós éramos nariz empinado, nós não queríamos saber deles, eu ouvi isso na Itália, entendeu? 'Vocês são campeões do mundo e não querem trocar informação conosco, não querem interagir conosco, porque vocês se acham os melhores', e éramos, e continuamos sendo bons, só que não somos mais os melhores", declara Roth.

"Como é que vai fazer trabalho se não fica no clube? Como é que vai dar chance? Como é que vai equilibrar, como é que tu vai ter a sensação e a sensibilidade de poder ajudar um menino desses, ou ajudar um jogador na sua carreira se a gente não tem tempo de implementar uma metodologia e consequentemente uma filosofia de trabalho? Essa é a dificuldade que nós temos no Brasil, o imediatismo", conclui.

O Fim de Papo, apresentado por Isabella Ayami, contou com os comentários do ex-jogador Ricardo Rocha e da jornalista Renata de Medeiros, além do treinador Celso Roth. O programa volta a ser apresentado hoje, logo após a rodada com jogos de Libertadores e Campeonato Brasileiro.