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Times que não divulgaram contas correm risco de sanção, dizem especialistas

Atlético-MG e Cruzeiro não divulgaram balanço patrimonial referente à temporada passada - Gustavo Aleixo/Cruzeiro
Atlético-MG e Cruzeiro não divulgaram balanço patrimonial referente à temporada passada Imagem: Gustavo Aleixo/Cruzeiro

Diego Salgado e Thiago Fernandes

Do UOL, em São Paulo e Belo Horizonte

05/05/2020 04h00

Atlético-MG, Corinthians e Cruzeiro não divulgaram o balanço financeiro até 30 de abril passado, data limite imposta pela lei brasileira. Os clubes alegam dificuldades em decorrência da pandemia do novo coronavírus para publicar as demonstrações de resultados de 2019 e se apegam à Medida Provisória 931 do governo federal, que estende o prazo para prestação de contas até 30 de junho para empresas.

A medida do governo não contempla clubes de futebol, por serem associações sem fins lucrativos. Os especialistas, no entanto, se dividem quanto ao enquadramento das agremiações esportivas. Há quem veja a possibilidade de punição aos dirigentes e até de saída do ProFut diante do caso.

"De acordo com o artigo 46 A da Lei Pelé, o prazo para que as entidades da gestão do esporte e os clubes profissionais divulguem seus balanços em site eletrônico próprio e da respectiva entidade de administração é 30 de abril. Caso não entregue neste prazo, a legislação permite que os dirigentes destes clubes sofram algumas sanções, como a inelegibilidade, por cinco anos, para cargos ou funções eletivas ou de livre nomeação em qualquer entidade ou empresa direta ou indiretamente vinculada às competições profissionais da respectiva modalidade desportiva", disse o advogado Louis Dolabela ao UOL Esporte.

O jurista ressalta que o decreto publicado pelo governo não inclui as agremiações esportivas. Ele apresenta as justificativas.

"A medida vale para empresas públicas, sociedades de economia mista e subsidiárias das referidas empresas e sociedades, mas não contempla clubes de futebol, que em sua maioria são entidades sem fins lucrativos. Ressalta-se que a aprovação das contas, está inviabilizada na maioria dos clubes porque grande parte dos conselheiros estão em idade avançada e são do grupo de risco. Desta forma, poucos clubes convocaram assembleia", acrescentou.

O advogado Luciano Motta discorda da opinião do colega de profissão. Para ele, o tema pode culminar em punição, mas é mais provável que os clubes sejam tratados como empresas no caso.

Corinthians, do presidente Andrés Sanchez (foto), ainda não divulgou balanço de 2019 - Daniel Augusto Jr./Agência Corinthians - Daniel Augusto Jr./Agência Corinthians
Corinthians, do presidente Andrés Sanchez (foto), ainda não divulgou balanço de 2019
Imagem: Daniel Augusto Jr./Agência Corinthians

"Se você estiver falando da MPV nº 931, a rigor ela não atinge os clubes, contudo, em uma interpretação extensiva entendo que ela possa atingir e, nesse ponto, beneficiar os clubes. É dizer, se as estruturas que por lei têm que ser mais organizadas e sofisticadas [sociedades anônimas, sociedade limitada, etc.] receberam esse benefício, porque não estendê-los às associações, que possuem, em regra, uma estrutura mais simplificada", afirmou ao UOL.

Ele explica por que não crê em uma eventual punição dos clubes neste cenário de pandemia: "Haveria a possibilidade jurídica de sofrer alguma sanção decorrente da Lei Pelé, e consequentemente, até prejudicar os clubes no Profut. Entretanto, pela verdadeira exceção em que nos encontramos, acredito que isso não ocorra e nem deveria ocorrer. Penso que qualquer medida contrária seria uma interpretação rigorosa da lei e insensível às circunstâncias que estamos vivendo".

O Corinthians já formatou o balanço financeiro de 2019 e até encaminhou para membros do Conselho Deliberativo. O clube, entretanto, optou por não divulgar até a aprovação dos membros do Conselho. Atlético-MG e Cruzeiro ainda não encaminharam os documentos aos seus conselheiros.

Atlético-MG não se preocupa com punição

O Atlético-MG não teme qualquer tipo de sanção, mesmo que o decreto não inclua clubes de futebol. Lásaro Cândido Cunha, vice-presidente do clube, explica o motivo: "De jeito nenhum [o Galo pode sofrer alguma sanção]. Tudo está suspenso: prazos processuais, prazo para receita. O clube está funcionando com estrutura mínima. Mas esse é um assunto da presidência e da diretoria financeira", escreveu por meio de mensagem ao UOL Esporte.

Sérgio Leonardo, presidente do Conselho Fiscal do Atlético-MG, se manifestou e explicou por que o clube não apresentou o balanço financeiro até o momento.

"No início do mês [de abril], o presidente do Conselho Deliberativo, Castellar Guimarães, chegou a enviar uma carta a todos os conselheiros informando que a diretoria iria prestar as contas, e que o Conselho Fiscal deveria emitir um parecer. Entretanto, ele fez isso no início do mês. Logo depois, o diretor financeiro encaminhou uma correspondência ao presidente, e este enviou um ofício ao Conselho Fiscal, esclarecendo sobre a impossibilidade material e humana de prestar as informações, porque todos os funcionários do clube estavam com licença remunerada, a não ser os essenciais para o funcionamento das estruturas. Eles não tinham equipe e nem acesso às informações para que conseguissem prestar as contas com a inteireza que era necessária. Assim, ele justificou que não estaria prestando as contas. Sem a emissão das contas, o Conselho Fiscal não pode emitir um parecer e nem o Conselho Deliberativo convocar uma reunião com 500 e tantos conselheiros para examinar as contas", disse.

"Não tivemos acesso a nenhuma deliberação que tenha prorrogado expressamente esse prazo, mas estamos compreendendo que a situação é extraordinária, excepcional. Estamos em um período de calamidade e não acredita que haverá qualquer tipo de penalidade em virtude do atraso nessas circunstâncias", acrescentou.

Corinthians só divulgará após análise do Conselho

O Corinthians vive uma situação mais tranquila que a de Atlético e Cruzeiro. Em que pese não ter apresentado o balanço, o clube de São Paulo já formatou o documento e enviou aos membros do Conselho Deliberativo. A diretoria, porém, aguarda uma análise do grupo para divulgação da demonstração de resultados de 2019.

"O balanço está sob análise dos conselhos e só poderá ser comentado após cumprir as formalidades, tornando-se público", informou a diretoria corintiana.

Em 2019, a diretoria apresentou um déficit de R$ 177 milhões, conforme antecipado pelo UOL Esporte. Este é um recorde negativo do clube. As contas do Timão nunca apresentaram um prejuízo tão elevado.

Cruzeiro também não teme punição

A diretoria do Cruzeiro explica a situação e relata problemas enfrentados no decorrer de 2020. De acordo com a assessoria de imprensa, houve problemas referentes à confecção do documento.

"Apenas em fevereiro deste ano o Cruzeiro teve as contas de 2018 aprovadas, assim mesmo com ressalvas, e vários documentos, incluindo o balanço, precisaram ser refeitos. Tudo isso gerou um retrabalho muito grande, sendo necessária também a revisão da maior parte do balanço de 2019. Além da grave crise pela qual o clube passou recentemente, há ainda o efeito pandemia do coronavírus, com férias e suspensão de contratos, o que reduziu o número de colaboradores. Uma força-tarefa está trabalhando no documento, para apresentá-lo ao Conselho Fiscal o mais breve possível", explicou a cúpula por meio do departamento de comunicação.