Mãe denuncia preconceito e consegue fazer filha jogar torneio com meninos
No alto de seus 10 anos Maria Alice pertence a um grupo recente, o das meninas que crescem gostando de jogar futebol. Mas não significa que ela pode jogar onde quiser. Precisou um abaixo-assinado na internet e a imprensa procurar o Sesc de Minas Gerais para a instituição permitir que ela participe da Copa Sesc.
Maria Alice se apaixonou pela bola quando tinha 5 anos. Queria tomar parte da brincadeira do pai e primos. A coisa ficou séria e passou a treinar com os meninos do time que leva o nome da cidade, o Vieiras Esporte Clube. A mãe, Eliane Aparecida Barbosa, 37 anos, conta que num lugar de 4 mil habitantes ela não encontrou outro local para jogar.
A participação na Copa Sesc seria a realização de um sonho infantil. Era o primeiro campeonato grande e fora da cidade, a coisa mais legal que poderia acontecer para Maria Alice. Mas o Sesc recusou a inscrição.
A família ressalta que não teme que a menina se machuque jogando com garotos. Lembra que com 10 anos há pouco diferença física. Eliane declara que no futuro é necessária a separação, mas hoje não.
Menina com menina, menino com menino
Este foi o posicionamento até às 18h30 de quinta, quando houve uma ligação do gerente regional, que fica em Muriaé (MG). Ele dizia que a posição foi revista. Eliane acredita que a mudança ocorreu por causa do abaixo-assinado que reuniu 19,7 mil assinaturas e a imprensa procurar o Sesc MG.
“Eu acho totalmente que foi pressão. No dia 11 (de agosto) eu estive procurando por eles com 634 assinaturas. Fui muito bem recebida, mas eu tive uma negativa”.
Aquela data era o último dia para inscrição. Maria Alice só não ficou de fora porque o prazo foi prorrogado. Mas a mãe não tinha muita esperança e dividia a tristeza da filha. Eliane fala que moveu o abaixo-assinado por emoção, não por razão. Conhecia o caso de uma menina do interior de São Paulo chamada Laura.
“Maria Alice ficaria sem jogar. (Em Vieiras) Não tem nem onde meninas treinar. Moro numa cidade de menos 4 mil habitantes. A Maria Alice entendeu que não podia jogar porque é menina. Perguntava por que agora não podia se sempre pode. Fiquei muito triste pela minha filha”.
Sesc recua e aceita Maria Alice
A chuteira ficaria fora do campeonato, mas esta tristeza e decepção mudou com a ligação no começo da noite de quinta-feira. Até a Prefeitura de Vieiras entrou na reviravolta. Ela recebeu o comunicado de que Maria Alice seria aceita. Mais que isso, o Sesc se deu ao trabalho de mandar um print para uma Secretaria municipal. A menina não coube em si de felicidade
“Foi uma emoção muito grande poder jogar porque é uma coisa que gosto muito. Vi meu pai jogando futebol, meus primos. Quis experimentar e gostei. Futebol é minha vida”, resume Maria Alice.
Ela já sabe o que quer ser quando crescer – igual a Marta. A melhor jogadora do mundo por cinco vezes é a ídolo da menina. A garota é atacante e considera que joga bem. E não tem mimimi, pode ser futsal, campo ou sete na linha, o que vier está bom.
A garantia de que o sonho de Maria Alice e outras meninas vai continuar passa por novos posicionamentos de quem organiza os campeonatos. O Sesc mudou o seu. O discurso de sexta tinha outro tom. “O Sesc também idealizou a Copa Sesc partindo da compreensão do esporte como um processo de construção de identidade, autonomia e autoconfiança, que abrace os talentos espalhados por todos os cantos de Minas, respeitando a diversidade.”
Maria Alice vai poder fazer o que mais gosta, correr atrás da bola. E com a chuteira nova. Ela ainda não repetirá Marta, mas vai poder fazer igual ao que os meninos sempre puderam fazer, continuar a sonha que será tão grande quanto seu ídolo quando crescer.
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