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Como o sucesso do brasileiro Fabinho representa o novo Monaco

PHILIPPE HUGUEN/AFP
Imagem: PHILIPPE HUGUEN/AFP

Bruno Doro

Do UOL, em São Paulo

25/01/2017 04h00

Viver no Principado de Mônaco não é fácil. O brasileiro Fabinho, ex-lateral do Fluminense e do Real Madrid, sabe bem disso. “É complicado. Algumas coisas são mais caras e a gente tenta dar um jeito. Vai comprar em uma cidade vizinha, onde as coisas são mais em conta, e tenta segurar os gastos como pode”, contou o jogador ao UOL Esporte.

Essa história mostra como é o cotidiano de quem divide a cidade com uma família real, bilionários e pilotos de Fórmula 1. Preços altos são apenas um detalhe. Jogadores de futebol, superestrelas em qualquer lugar, são pessoas comuns por lá. “Não tem o assédio de outros lugares. Jogadores mais experientes, como o Falcao [Garcia, atacante colombiano], avisam que a gente tem que aproveitar. Em outros lugares, a vida não é tão tranquila”.

Antes de jogar no Mônaco, Fabinho teve passagem pelo Real Madrid B - Denis Doyle/Getty Images Sport - Denis Doyle/Getty Images Sport
Antes de jogar no Mônaco, Fabinho teve passagem pelo Real Madrid B
Imagem: Denis Doyle/Getty Images Sport
Tranquila até me pressão dos torcedores. É um clube rico, em um lugar rico, mas torcida… Apenas 8.697 pessoas ocupam as arquibancadas no estádio Louis II a cada partida. É a pior média de todo o Campeonato Francês – o PSG, por exemplo, leva 44.507 ao Parc des Princes. “Nosso estádio só lota quando enfrentamos um time grande ou em jogos de Champions League. Se é um jogo normal, fica vazio. Não é o ideal, mas estamos acostumados”, admite.

“A curiosidade é que sempre que vamos jogar fora, nossa área da torcida fica lotada. Sempre temos muito mais torcida do Monaco fora de casa do que em casa. Acho que vir para Monaco dificulta. Fora do Principado, na França, nossa torcida é maior”, completa.

É nesse ambiente meio fora do foco do futebol em que um dos maiores prospectos do futebol brasileiro vem se desenvolvendo. Pouca gente percebe, mas Fabinho já é um dos principais jogadores do futebol francês, chama atenção de gigantes da Europa (principalmente na Inglaterra) e, provavelmente, só não teve mais chances na seleção porque o Monaco se negou a liberá-lo para os Jogos Olímpicos, no Rio de Janeiro, no ano passado (“Foi uma frustração. Liguei para todo mundo, não ligava se o Monaco iria jogar a Liga dos Campeões. Mas não deu”).

Nesta temporada, o Monaco é a grande sensação da Ligue 1 com um time jovem, rápido e ofensivo. O veterano Falcao Garcia é o capitão do time e destaque. Mas com sete dos 11 titulares com 24 anos ou menos, o time do português Leonardo Jardim pouco lembra aquele de 2013, que gastou mais de 160 milhões de euros em reforços como Falcao, o também colombiano James Rodriguez e o português João Moutinho, por exemplo. Mesmo assim, a equipe lidera o Francês e está batendo recordes de gols. São 64 em 21 partidas, mais de 3 gols por jogo – o recorde da competição é do Racing Paris, que marcou 118 gols (média de 3,1) na temporada 59/60.

Fabinho disputa lance com Dele Alli em Tottenham x Monaco - Paul Gilham/Getty Images - Paul Gilham/Getty Images
Leão no meio-campo: desde o início da temporada, Fabinho tem jogado como volante
Imagem: Paul Gilham/Getty Images

“Nossa tática mudou. Chegaram quatro ou cinco jogadores novos ao time, já tínhamos uma base de garotos muito boa e estamos aproveitando essa força. O novo esquema faz com que tenhamos muito mais presença na área e chegada ao ataque. Além disso, tem a fase do Falcao, que, na minha opinião, está jogando melhor do que quando deixou o time [N.R.: o colombiano passou as duas últimas temporadas emprestado para times ingleses]. Ele está aproveitando que a equipe está criando mais oportunidades. Acho que todos esses fatores têm ajudado nessa nossa boa fase”, analisa.

O rendimento do próprio Fabinho também ajuda. Em 20 jogos disputados, ele marcou cinco vezes, fruto de sua nova posição. Até o início da temporada, ele era o titular da lateral direita. Hoje, é dono do meio-campo, atuando em uma dupla de primeiros volantes ao lado do francês Bakayoko. A mudança de posição foi uma decisão unilateral do técnico Leonardo Jardim, após a saída do veterano Toulalan para o Bordeaux.

Veja a entrevista com o volante/lateral:

Fabinho, lateral direito do Monaco, em ação durante partida da Liga dos Campeões, contra a Juventus - Michel Euler/AP Photo - Michel Euler/AP Photo
Imagem: Michel Euler/AP Photo
Monaco atual x Monaco de 2013

Cheguei com a contratação do Falcao. No primeiro ano, o projeto era brigar com o PSG e fazer contratações do nível do PSG. Mas isso durou apenas uma temporada, em que as coisas foram bem. Terminamos em segundo lugar no Francês. Mas, no ano seguinte, o presidente disse que iria mudar a estratégia. A ideia, agora, era contratar jogadores jovens para futura venda. Pensando nisso, deu certo. Vendemos o Kondogbia, o Carrasco e o Martial. Isso foi até o início dessa temporada, em que mudamos novamente. Agora, o plano não era mais vender, mas segurar os principais jogadores e tentar bater com o PSG de novo. E está dando certo.

[Nota da Redação: Com as vendas de Kondogbia (para a Inter de Milão), Carrasco (para o Atlético de Madri) e Martial (para o Manchester United), o time embolsou mais de 100 milhões de euros.]

A mudança de posição

No começo do ano, quando o treinador soube que não contaria com o Toulalan, ele veio conversar. Disse que com a chegada do Sidibe, que era lateral da seleção francesa e tem um estilo de que ele gosta, iria me utilizar em uma nova posição, ali no meio. E que me usaria bastante pelo lado direito. Poderia atacar como lateral ou fazer a cobertura como lateral. E o esquema deu certo. Tem me ajudado bastante, eu tenho me destacado. A equipe está indo bem nessa nova forma de jogar e eu tenho aprendido muito e evoluido com essa função no meio-campo.

[A mudança] Tem pontos positivos e negativos. É positivo já que mostro que, como volante, posso render em bom nível. Mostro uma maior consciência, alternando entre o meio e a lateral, cobrindo o campo inteiro. Tenho mostrado que posso jogar em bom nível nas duas posições. Mas é negativo quando você pensa em uma posição específica. Você vai sempre ouvir gente dizendo: “Mas o Fabinho não está nem jogando na lateral… Não pode ser convocado para essa posição”.

Seleção: volante ou lateral?

Sou os dois. A questão, falando meio-campo, é que nosso esquema é diferente do que o Tite tem usado na seleção. O Monaco joga com dois volantes, eu e o Bakayoko. Quando um vai, o outro fica. Mas ambos temos liberdade para atacar. Eu tenho chegado bastante como elemento surpresa na área, vou buscar a bola com o zagueiro. Por isso, pensando em convocação, eu acho que o mais provável é pensar em uma vaga na lateral.

Fabinho, lateral do Monaco, a serviço da seleção olímpica - Itawi Albuquerque/CBF - Itawi Albuquerque/CBF
Imagem: Itawi Albuquerque/CBF
Decepção olímpica

Foi uma frustração. Eu queria muito ter disputado uma Olimpíada no meu país…. Durante o processo olímpico inteiro, estive presente nas convocações e estava sempre lutando para garantir a minha vaga. E quando o Monaco disse que não iria me liberar foi um momento muito triste. Lutei até o final pela liberação. Liguei para todo mundo: para o treinador, para o presidente… Conversei e tentei convencer os dois. Naquele momento, eu não ligava para o que o Monaco iria disputar. Se a Champions League começava antes ou depois. O que eu queria era jogar a Olimpíada. Infelizmente, a liberação não veio. Felizmente, o Brasil ganhou o ouro. Eu fiquei com aquele sentimento ambíguo. Estava feliz, mas queria estar ali, ao lado deles, com aquela medalha de ouro. Mas já aconteceu, já passou e tenho que olhar para frente.

Falcao Garcia, uma amigo

Querendo ou não, a gente fica mais póximo dos sul-ameruicanos. Estamos sempre conversando, principalmente nas refeições. E ele é um cara muito gente boa. Fico contente por ele estar voltando a mostrar o mesmo futebol que todos sabemos que ele tem. Ele está jogando melhor [do que antes da lesão e da passagem por Manchester United e Chelsea]. A equipe é diferente e o esquema tem ajudado muito. A fase é boa, também, estamos sendo bem regulares e ele tem ajudado muito. Ele é líder e tem exercido essa função muito bem. Não é só capitão, mas tem sempre uma plavra de incentivo, de motivação para o grupo. Não só dentro, mas fora de campo ele tem sido vital.

Futuro na Inglaterra

O que aconteceu com o Falcao na Inglaterra não foi o ideal. Mas isso não significa que vai acontecer com qualquer um que vai para lá. São coisas diferentes. A Premier League é um campeonato que eu gosto muito. É um espetáculo. Para mim, o melhor campeonato do mundo. Eu gostaria de jogar lá um dia.