Os bastidores do time que ganhou de 4 a 0 na ida e foi eliminado na Série C
A segunda partida entre ABC de Natal e Guarani pelas semifinais da terceira divisão parecia obrigação protocolar. O time nordestino havia goleado por 4 a 0 no jogo de ida e a vaga na decisão parecia decidida de véspera. Mas quando o juiz deu o apito final, os atletas entraram direto no vestiário para chorar onde não tinha ninguém olhando. O clube foi superado por 6 a 0.
“Foi uma catástrofe o que ocorreu. Um resultado que não era esperado”, afirmou o vice-presidente de futebol do ABC, Leonardo Arruda Câmara.
O silêncio no vestiário denunciava que algo saíra muito fora de controle. A derrota acachapante estava na expressão dos atletas. Alguns choravam. Artilheiro da Série C, Jones Carioca estava isolado num canto. Ele foi expulso aos 38 minutos do primeiro tempo e sua ausência foi considerada decisiva para o resultado na opinião de Geninho, o técnico do time.
“A expulsão foi fundamental. O Jones é o nosso melhor atacante e se tivesse no jogo o ABC faria um ou dois gols”, avalia.
Mas o treinador ressalta que a culpa pela derrota não pode cair sobre os ombros dele. Lembra que o atleta foi fundamental na campanha que garantiu lugar entre os quatro melhores e acesso à Série B. Mesmo assim, Geninho conta que o comportamento de Jones no vestiário era um reconhecimento de que o cartão vermelho complicou a situação do ABC nas semifinais.
Entendendo o momento difícil que a equipe passava, o técnico chamou os jogadores para conversar. Frisou que não era um grupo de perdedores, apenas tinha perdido uma partida por larga desvantagem. Mencionou ainda o título estadual e a vaga na segunda divisão.
O discurso não acabou com a tristeza e nem era a esperança do treinador. Mas Geninho espera que em alguns dias a dor vá amenizando até desaparecer. Ele sabe que não é fácil. O próprio técnico diz que rolou muito na cama depois do jogo. A partida passou na cabeça várias vezes, principalmente o lance da expulsão.
Gol cedo derruba tática
O ABC terminou o primeiro tempo perdendo por 2 a 0 e um jogador a menos. Consciente da dificuldade que seria o restante da partida, o chefe da delegação, Antônio Pinto Medeiros, deixou o presidente do time no camarote e desceu para os vestiários.
Viu Geninho armar duas linhas de quatro para travar o jogo. O resultado ainda dava a vaga na final e ainda havia confiança. O lance que encaminhou a virada do Guarani aconteceu aos 5 minutos do segundo tempo, quando o terceiro gol saiu.
“Tudo que a gente conversou foi por água abaixo. Passamos a jogar contra o emocional”, explica Geninho.
Abalado, o ABC foi presa fácil. O treinador afirma que a dor é maior do que a sentida pela derrota por 6 a 0. Justifica que a expectativa do time para 2016 era das piores. O vice-presidente de futebol, Leonardo Arruda, conta que em janeiro o clube tinha somente dois atletas. Explica que um novo presidente ia assumir e o antigo dispensou o plantel. A pré-temporada foi feita com os juvenis e alguns jogadores do sub-19 precisaram ser chamados para completar o time.
Arruda diz que a situação financeira era complicada porque o time foi rebaixado para Série C e a cota de televisão e o patrocínio da Caixa Econômica acabaram. No primeiro turno do Campeonato do Rio Grande do Norte, o ABC fazia campanha de time rebaixado. Mas de repente a equipe deu liga e marchou sobre os rivais até levar o estadual com direito a vitória por 4 a 0 sobre o América, o maior rival.
Sonho do bi evaporou
Após fazer uma bela primeira fase, o time de Natal chegou .às quartas de final com a segunda melhor campanha de seu grupo, formado por times do Norte, Nordeste e Centro-Oeste. No jogo que decidiu a vaga na segunda divisão o adversário era o Botafogo de Ribeirão Preto. O time do interior paulista fez uma promoção e trocou 15 mil ingressos por garrafas pets. Não adiantou e o ABC passou.
Geninho lembra que depois do jogo de ida das semifinais a presença na decisão parecia certa. Nesta hora, o grupo recordou o fato de ter jogado para estádios vazios no começo do ano. O vice-presidente de futebol disse que o ABC não atua na Arena das Dunas, estádio de Copa, porque não tem dinheiro.
As dificuldades pareciam coisa do passado e a final da Série C contra o Boa Esporte estava próxima. Seria o mesmo rival enfrentado em 2010, ano que o ABC saiu campeão da terceira divisão. Torcida e imprensa tinha o título como certeza. O sentimento acabou internalizado pelo elenco, avalia Geninho.
“A expectativa estava no grupo, não só no torcedor. Por isso esse choque. É típico do ser humano”, filosofa o treinador.
O voo de volta para Natal foi em silêncio. O sonho do bi da Série C virou pesadelo.
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