O lateral direito Victor Ferraz causou curiosidade ao dizer após o polêmico jogo contra o Internacional, no dia 8 de setembro, pelo Campeonato Brasileiro, que não fala palavrões há mais de 20 anos. Em entrevista exclusiva ao UOL Esporte, o camisa 4 do Santos explicou o motivo e que, na verdade, são exatos 28 anos sem falar palavras torpes.
O atleta é filho de um casal de missionários evangélicos e, inclusive, foi “criado” na igreja desde os seis anos de idade. O exemplo dos pais desperta no lateral o desejo de seguir o mesmo projeto de vida após encerrar a carreira no futebol.
“Eles são a minha principal inspiração junto com a minha esposa. Eles são missionários, não vivem somente da Obra, mas desde pequeno me criaram dentro do evangelho, no caminho que deveria andar. Desde pequeno tenho esse temor ao Senhor, procurando aliar o profissional com o espiritual. Não sei se vou trabalhar com o futebol (depois de aposentar), se vou partir para a Obra, trabalhar na Igreja, abrir um negócio. Pode ser (como missionário), alguma coisa na Igreja eu vou fazer”, disse.
Vitor Ferraz ainda fala sobre as provocações que ele e Ricardo Oliveira sofrem dos companheiros por serem evangélicos, conta o seu amor por outro esporte – o tênis de mesa, que já lhe garantiu até títulos. O lateral também revela o momento de maior tristeza na carreira, quando se lesionou gravemente na coluna em uma agência bancária, e o momento de maior felicidade, quando marcou seu primeiro gol pelo Santos contra o time de coração dos pais – o Vasco – com toda a família na arquibancada.
Confira a entrevista completa com Victor Ferraz:
UOL Esporte: Você chegou a dizer que não fala palavrão há 20 anos. Como isso?
Victor Ferraz: É verdade, isso não faz de mim nenhum santo ou anjo porque tenho erros como todo mundo e a qualquer momento pode ser que saia, que eu erre. Mas quando você tem uma forma de viver bem focada, que você sabe o que quer para a sua vida, fora o costume de desde muito novo, meus pais me incentivando a nunca falar palavrão, ou ofender ninguém, é algo que se torna hábito. O palavrão não faz parte no meu dia a dia, nem no momento de mais raiva ele sai. Pode até sair uma palavra que ofenda mais as pessoas, mas que não se caracteriza um palavrão em si. (28 anos, a matemática é essa) Na hora do sangue quente a gente arredonda. Comecei a ir para a Igreja quando eu tinha 6, mas com 11, 12 anos passei a entender completamente a Palavra, o que queria para a minha vida.
UOL Esporte: Você enfrenta provocações, brincadeiras, dos companheiros por ser evangélico?
Victor Ferraz: Têm várias porque temos um grupo muito jovem, que gosta de brincar e zoar. Eu sou um desses, é inevitável que tentem brincar comigo também. Quando estamos em aeroporto, jantar ou comer, passa uma mulher mais bonita, ficam olhando para mim e também para o Ricardo (Oliveira) para ver o que vai fazer também. Mas levamos mais no lado da brincadeira, não só pela questão de ser evangélico, ou não, muitos temem a Deus, participam das reuniões, gostam de ouvir as palavras então torna tudo mais fácil.
UOL Esporte: É verdade que seus pais são missionários?
Victor Ferraz: Eles são a minha principal inspiração junto com minha esposa. Eles são missionários, não vivem somente da Obra, mas desde pequeno me criaram dentro do evangelho, no caminho que deveria andar. Desde pequeno tenho esse temor ao Senhor, procurando aliar o profissional com o espiritual. Já participei de eventos na minha própria cidade, em João Pessoa. Mas acompanhando eles eu nunca fui até porque são extremamente preparados, eles fazem muito curso, muito estudo, tem muito ensinamento. Tenho muita vontade de fazer, quem sabe quando parar de jogar não possa ser o rumo a seguir, mas nunca os acompanhei eles nas viagens.
UOL Esporte: Pelo jeito você foi criado longe de seus pais?
Victor Ferraz: Praticamente a vida toda, com 11 anos foi quando saí de João Pessoa e fui tentar a vida de jogador de futebol. Mas sempre à distância conseguiram me acompanhar, fazer um discipulado. Mesmo distante eles conseguiam me dar uma cobertura espiritual muito grande. Sempre que chegava em um lugar procurava logo uma Igreja para que pudesse estar próximo a brasa, então foi mais ou menos assim
UOL Esporte: Como você analisa que Deus vai resolver quando também há um evangélico do outro lado no jogo?
Victor Ferraz: Eu creio da seguinte forma, acredito que vai acontecer o que Deus quiser, é inevitável. Mas fazemos a nossa parte, treinar, nos prepararmos, nos doarmos no dia a dia, fora daqui, para que coloquemos na posição de receber a benção. Na hora cada um faz o seu melhor e o que ele permitir, achar justo é o que vai acontecer.
UOL Esporte: Projetos para o futuro, fora de campo?
Victor Ferraz: Não penso muito ainda. Não sei se vou trabalhar com o futebol, se vou partir para a Obra, trabalhar na Igreja, abrir um negócio. Não penso muito ainda, mas vou dar um tempo em João Pessoa, ficar uns dois anos descansando. Pode ser (como missionário), alguma coisa na Igreja eu vou fazer. Sempre estou trazendo a palavra, sim, se não é no Santos é fora. Vamos semeando a palavra, falando o que Deus tem feito na nossa vida. É uma vida que consome a gente no futebol, é importante não deixar o futebol ficar acima das coisas. É muitas vezes um problema do jogador de futebol, colocar acima da família e de Deus, me preocupo para que isso não aconteça.
UOL Esporte: Pratica algum outro esporte?
Victor Ferraz: Adoro jogar tênis de mesa. Tem o ping-pong e o tênis de mesa, esse é um esporte que gosto muito, na minha infância joguei, treinei e por pouco não largo o futebol para seguir no tênis de mesa. Ganhava bastante campeonato, mas agora só jogo brincando. Joguei regionais em São Paulo e na Paraíba, joguei a Copa Brasil, com vários jogadores que jogavam comigo são feras hoje na seleção. Não tenho em casa, brinco aqui com o pessoal, de vez em quando dá para fazer isso vou no Centro Espanhol. O pessoal de tênis de mesa se conhece, não tem muitos praticantes. Os daqui conhecem o de João Pessoa, faz uma amizade. Ali não dá para jogar muito, é alto nível. Ali treina o pessoal da seleção brasileira. Quando cheguei no Santos não jogava com frequência, jogava 2 ou 3 vezes por semana, mas agora como tenho essa sequência é difícil estar jogando, só uma veizinha na semana e aqui no Santos.
UOL Esporte: O Tênis de mesa te ajuda em alguma coisa no futebol?
Victor Ferraz: É um esporte diferente, exige concentração. Algo que me ajudou do tênis de mesa é isso, a cada ponto precisa disso, os sets são de 11. É como cada jogada, bola minha, seja importante para o jogo.
UOL Esporte: A seleção brasileira esfriou para você, a sua convocação?
Victor Ferraz: Sempre fico muito feliz quando falam disso porque é o grande sonho de todo o jogador. E cheguei em um clube que me dá totais condições de vestir a camisa da seleção. Temos um técnico extremamente justo, que leva o que há de melhor no mercado. Então tenho que manter o meu nível, cada dia mais melhorando, principalmente ganhando títulos que é o algo a mais. A seleção é o lugar de vencedores, então sei que vencendo no meu clube o Tite pode me levar
UOL Esporte: Ficou sabendo da ‘convocação fake’ de Tite que saiu e que você estava nela?
Victor Ferraz: Sabia que não era a oficial, então tudo que relaciona o seu nome a coisas boas é legal. Então não empolgou.
UOL Esporte: Qual o melhor momento de sua carreira?
Victor Ferraz: Acho que o momento muito importante foi no ano passado, aqui no Santos, quando vínhamos naquela crescente. Tenho uma família toda de vascaínos e o meu primeiro gol no Santos foi contra o Vasco, ganhamos de 1 a 0, nos deu a vitória. A família estava no estádio e os vi comemorando, esquecendo o time que torciam. Então foi um momento muito legal, de muita emoção.
UOL Esporte: Maior tristeza da carreira?
Victor Ferraz: Ano passado, quando travei minhas costas em um momento maravilhoso, crescendo junto com a equipe. Estava no banco (agência bancária), no meio da temporada. Fiquei 3 meses, fiquei sem andar, não sabia se voltaria naquele ano. Foi triste.
UOL Esporte: Como tudo começou para você no futebol?
Victor Ferraz: Joguei em bastante clubes, rodei muito em times de menor expressão. Profissionalmente, comecei no Iraty-PR. Depois, fui para um time chamado São José-RS, onde joguei mais ou menos um ano. De lá fui para o Águia-PA, de Marabá, onde joguei o Paraense. Fui campeão de um turno, mas na decisão perdemos para o Paysandu. Para mim foi muito bom, o lugar que Deus usou para me levar a Série A, para o Atlético-GO. Fizemos um grande campeonato, ganhamos o turno contra o Remo, um time grande. Fiz um gol na final para ser campeão, não havia feito nenhum no campeonato. Deus tocou no coração dos dirigentes do Atlético-GO.
UOL Esporte: Pensou em desistir em algum momento?
Victor Ferraz: Durante muito tempo pensei em desistir porque a caminhada é difícil. Morei em muitos lugares de difícil acesso, já morei em lugar sem energia, que não tinha pessoas para a limpeza. Dentro do estádio, de baixo de arquibancada, uma dificuldade gigante. Em muitos momentos você pensa em fazer outra coisa, vai vendo os amigos da sua idade se formando e tomando um rumo, então você fica na dúvida se vai acontecer, ou não. Meus pais são missionários, então eles sempre traziam uma palavra de renovo para mim, de ânimo, isso foi importante.
UOL Esporte: O que você gosta de fazer fora dos gramados?
Victor Ferraz: Saio muito para jantar e almoçar, gosto muito de comer em restaurantes, vou muito ao cinema, ao teatro, stand up e Igreja. Essa é a minha rotina.
UOL Esporte: Política, você se envolve?
Victor Ferraz: Gosto muito, gosto de política, estudar, estudo um pouco de história para ter mais argumentos. Tenho um primo que mora em São Paulo, que é como um irmão meu, e nós discutimos muito sobre. Mas não é algo que eu não externo publicamente porque gera muito mimimi, tem muito mimimi na política.
UOL Esporte Você precisa melhorar tecnicamente?
Victor Ferraz: Sem dúvida, precisa melhorar sempre. Preciso melhorar a cada dia tanto ofensivamente quanto defensivamente. Se eu puder dar mais passes para gol, fazer mais gols, marcar melhor. O jogador não pode se conformar nunca com o que está apresentando, precisa de uma melhora.
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