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Bastidores: como Pato bateu de frente com Corinthians e conseguiu se impor

Danilo Lavieri, Guilherme Palenzuela e Pedro Lopes

Do UOL, em São Paulo

27/01/2016 08h00

Para realizar o sonho de retornar a um clube de topo da Europa, Alexandre Pato teve de encarar e resistir à pressão do próprio Corinthians para sair. Quando recebeu oferta milionária da China, ouviu críticas da diretoria ao adotar postura oposta à de companheiros e preferir esperar aparecer uma perspectiva europeia, mesmo que financeiramente inferior.

Apareceu, e no fim da história Pato consegue deixar o Corinthians da forma que quis e, por enquanto, sem compensação financeira ao Corinthians. Emprestado ao Chelsea, o atacante viajou para Londres na madrugada desta quarta-feira ainda sem saber se irá renovar o contrato com o Corinthians e garantir que não deixará o clube de graça no fim do ano.

Durante toda a novela, o atleta revelado pelo Internacional teve comportamento exemplar no aspecto de cronograma e evitou bater de frente com ordens dadas pela comissão técnica, mesmo percebendo que sua saída era questão de tempo. Cumpria tudo o que era determinado, não reclamava em treinar separado do grupo e evitava reclamar com colegas.

Pressão pública do Corinthians após 'não' à China

Foi do Tianjin Quanjian, clube comandado por Vanderlei Luxemburgo e que levou Jadson, Luis Fabiano e Geuvânio, a proposta que fez o Corinthians pedir que Pato deixasse o clube. Em comparação ao negócio com o Chelsea, que se concluiu por empréstimo e não por compra dos direitos econômicos, o acordo chinês era muito melhor para o clube paulista. Em termos salariais, Pato receberia cerca de três vezes o que recebe no Corinthians.

Em 5 de janeiro, o então superintendente de futebol Andrés Sanchez declarou à Rádio Globo: "O problema é que ele não pode enrolar um ano para sair de graça. Se tiver proposta, tem de aceitar. Com a torcida, não tem problema. Ele vai se apresentar e jogar. O que não pode é ter proposta boa para o clube, e ele não aceitar", afirmou o dirigente à Rádio Globo. Pato, no entanto, informou à diretoria que não aceitaria o negócio com o clube chinês por preferir esperar a possibilidade de voltar à Europa - se não desse certo, tentaria reconquistar o espaço no Corinthians.

Embora tenham dito publicamente, diversas vezes, que respeitam a decisão, diretores corintianos ficaram bastante incomodados, e consideraram vaidosa a postura do atacante de insistir em uma saída para o futebol europeu. Andrés Sanchez, hoje ex-dirigente corintiano, já voltou a pressioná-lo publicamente mesmo após o acerto da negociação.

Comportamento durante a pressão

Alexandre Pato sempre soube que não seria usado por Tite. Tanto que nem foi incorporado pelo treinador no grupo que viajou para os Estados Unidos, no torneio de pré-temporada. Mesmo assim, evitou adotar a rebeldia como resposta à situação que atravessava.

O jogador compareceu aos treinos no CT Joaquim Grava, não reclamava de treinar separado e evitava até falar com seus colegas sobre o futuro. Em várias ocasiões, atletas davam entrevista afirmando desconhecer detalhes da situação do atacante.

Na hora de conversar, era raro quando participava diretamente da negociação. Em uma das vezes, foi flagrado jantando com Andrés Sanchez. Na maior parte do tempo, no entanto, deixava a cargo de seu estafe as conversas com o clube.

Desgaste com o Corinthians e "empréstimo" ao Bragantino

Contratado por R$ 40 milhões pelo Corinthians no início de 2013, Pato não conseguiu ter desempenho de destaque no clube e acabou encontrando o melhor futebol pelo rival São Paulo, no qual jogou as temporadas de 2014 e 2015 em troca dos pagamentos de metade dos salários (R$ 400 mil) mais a cessão do meia Jadson, que mais tarde se converteria um dos protagonistas do título nacional do Corinthians no ano passado.

Durante a passagem de Pato pelo São Paulo, a relação com o Corinthians, mantida ainda pelo contrato, se desgastou. Em julho de 2015, Andrés Sanchez afirmou ao jornal Diário de S. Paulo em tom irônico que, caso o Corinthians não conseguisse vender Pato no fim do ano, iria emprestá-lo ao Bragantino. O jogador não gostou e respondeu. "Ele sabe que não pode fazer isso", disse o atacante, que também nunca escondeu que planejava voltar à Europa em 2016.

O episódio evidenciou o desgaste entre Corinthians e Pato e o quão difícil seria, para o jogador, reconquistar espaço no clube.

A vitória de Pato: sonho de Chelsea realizado

O Corinthians não conseguiu vender Pato depois do empréstimo ao São Paulo e, por enquanto, não recupera nada do investimento feito para tirá-lo do Milan. Ao contrário do que se profetizou em julho de 2015, porém, Pato não foi emprestado ao Bragantino, mas sim ao Chelsea.

O atacante relatou a pessoas próximas quando foi sondado por diferentes clubes da Europa que seu sonho era jogar no Chelsea - Pato chegou a trocar informações com jogadores do clube inglês e passou a trabalhar diariamente para concretizar o negócio com o Chelsea e não com outro clube, por ter traçado tal objetivo profissional.

No fim das negociações, Corinthians e Chelsea mudaram o modelo do acordo e fecharam a transferência por empréstimo, e não por venda. Mesmo sem receber compensação financeira, o Corinthians viu benefícios em aceitar a oferta em troca da economia de R$ 5 milhões em 2016 pelo pagamento de salários.

Corinthians, que gastou R$ 40 mi, pode não ser compensado

Mesmo com a economia salarial, o Corinthians ainda pode ter dores de cabeça com o negócio. Como o contrato entre as partes vai até o fim do ano, há a possibilidade de que um pré-contrato com outro clube seja assinado já no meio do ano. O empréstimo com o Chelsea foi fechado com uma cláusula de opção de compra de 12 milhões de euros (R$ 53,3 milhões) - o Corinthians, no entanto, só detém 60% dos direitos econômicos.

A manobra faria com que Pato trocasse o Corinthians por outro clube em janeiro de 2017 sem ressarcir os cofres corintianos. Ou seja, a partir de julho, ele poderia assinar o seu novo vínculo com qualquer outra equipe do mundo para atuar a partir de janeiro de 2017. Entre pagamento ao Milan e de salários o Corinthians já gastou pelo menos R$ 60 milhões com Pato.

Há uma divergência na diretoria corintiana sobre os benefícios de se renovar o contrato com Alexandre Pato. Por um lado, protegeria o clube para que não perca o atleta de graça, mas por outro representa um risco de gastar ainda mais com salários caso não receba uma proposta.

Segundo apurou a reportagem, o negócio entre Pato e Chelsea foi concluído no último sábado. Como o jogador foi informado pouco antes do acordo sobre a mudança de modelo - de venda para empréstimo - não houve tempo para discutir a possibilidade de renovar ou não com o Corinthians. Segundo pessoas próximas, Pato não tem vontade de prolongar o vínculo com o Corinthians, mas deverá fazê-lo caso seja orientado nesse sentido por seu estafe.

No Corinthians, parte da diretoria reconhece que pode ouvir mais um não de Pato, especialmente pelo atleta acumular mágoa durante o período de guerra entre ele e diretoria.