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Jogou com Beckham e conheceu Obama: Irmão de R. Goulart quer defender EUA

Guilherme Palenzuela

Do UOL, em São Paulo

23/09/2014 06h01

Vitor Gomes Pereira Junior, 25, é natural de São José dos Campos (SP), ganha a vida como jogador de futebol profissional, é um dos maiores jogadores de todos os tempos de um clube campeão nacional, mas não é conhecido no Brasil. Vitor Gomes Pereira Junior é Juninho, irmão de Ricardo Goulart, jogador do Cruzeiro e da seleção brasileira, que conquistou os Estados Unidos jogando pelo Los Angeles Galaxy. Da amizade com o astro inglês David Beckham ao cumprimento do presidente Barack Obama, Juninho agora pensa em, assim como o irmão, defender a seleção nacional. Mas dos Estados Unidos.

“Se tiver a opção, sem dúvida”, diz Juninho, que atendeu o UOL Esporte por telefone, quando perguntado se tem o desejo de se naturalizar para defender a seleção norte-americana. Ele já conseguiu o gree card, visto permanente de residência nos Estados Unidos e, pelas contas que faz, precisa de mais dois anos para conseguir a cidadania – o que lhe daria direito a representar a seleção.

Juninho foi revelado pelo São Paulo, chegou à equipe profissional em 2008, com Muricy Ramalho, mas não conseguiu encontrar espaço na equipe tricampeã brasileira que tinha Hernanes jogando em altíssimo nível. Até então volante, o irmão mais velho de Ricardo Goulart acabou sendo emprestado ao Los Angeles Galaxy no início de 2010, quando o técnico do São Paulo era Ricardo Gomes. Ele foi aos Estados Unidos sem falar inglês ou espanhol, ao lado do zagueiro Leonardo e do lateral esquerdo Alex Cazumba. De imediato, tornou-se titular da equipe e companheiro de armação de jogadas de David Beckham, que deixara o Real Madrid para reger o crescimento da Major League Soccer (MLS), liga nacional do país. Com os títulos conquistados em 2011 e 2012, conheceu Barack Obama em visita à Casa Branca, em Washington. Duas vezes.

A partir de 2015 a MLS, que já tem Thierry Henry, terá nomes como Kaká, Frank Lampard e David Villa. Antes de tudo isso, Juninho se destaca. Vitor Gomes Pereira Junior não tem Goulart no nome porque o pai – a quem Juninho diz dever a carreira –, Vitor Gomes Pereira, quis dar ao primogênito seu próprio nome. Agora, o irmão mais velho torce por um reencontro com o caçula nos campos de futebol, se possível em uma partida entre as seleções de Brasil e Estados Unidos.

UOL Esporte: Você deixou o Brasil em 2010 e desde então está nos Estados Unidos. Como tem sido o contato com o Ricardo desde então? Conseguem conversar com frequência?
Juninho:
A vida de dois jogadores de futebol é bem diferente. O contato que a gente tem é mais por mensagem. Ligo para ele quando tenho tempo, olho o calendário do futebol brasileiro para saber quando ele está livre, porque no Brasil eles estão sempre concentrados. A gente tem uma boa relação. Apesar da distância, minha família sempre prezou por uma boa relação. Quem sabe um dia a gente possa jogar junto.

UOL Esporte: Até o ano passado o Ricardo era visto como um bom jogador, mas não se falava em seleção brasileira. Agora ele briga pela artilharia do Brasileirão, caminha para mais um título e foi convocado duas vezes pelo Dunga. Como vê a fase dele? Consegue acompanhar os jogos?
Juninho:
Eu sou fã do futebol brasileiro. Mesmo morando nos EUA, tenho canais internacionais, tenho tudo do Brasil ao vivo. Como o horário de diferença ajuda (4 horas mais cedo em Los Angeles),  consigo assistir aos jogos do meu irmão constantemente. Vinha acompanhando desde a época do Goiás. Não perco quase nenhum jogo. Acho bem legal a  relação dele com o Éverton Ribeiro. Ricardo consegue marcar, ajuda a compor o meio de campo, ajuda muito o sistema que o Cruzeiro adota. Cruzeiro tem tudo para ganhar esse ano também. Jogadores muito experientes, um elenco muito bom. Quando um se machuca, outro do mesmo nível já pode entrar. No Cruzeiro, no meu modo de ver, não tem vaidade. Esse é o grande segrego.

UOL Esporte: No início de setembro a seleção brasileira jogou em Miami e em Nova Jérsei, com o Ricardo no elenco. Vocês conseguiram se encontrar?
Juninho:
Uma coisa que fiquei triste foi que não consegui ver meu irmão. Quando fiquei sabendo que o Brasil viria, tentei conseguir, mas joguei nos mesmos dias e nos mesmos horários. Foi muito difícil, queria ter ido. Falei com ele, queria muito ter visto

UOL Esporte: Vocês conversaram por telefone, pelo menos? Conseguiu passar algumas dicas para que ele aproveitasse um pouco do tempo nos Estados Unidos?
Juninho:
Eles ficaram lá em Nova Jérsei, perto de Nova Iorque, foram para Miami... Eu joguei nesses lugares, conheço bem, mas eles não tiveram muito tempo de folga. Tiveram um dia livre, até aconteceu aquele caso do Maicon, mas eles não tiveram como aproveitar. No que eu posso ajudar em inglês, eu ajudo. Quando ele está com a esposa em outros lugares, às vezes me pede ajuda.

UOL Esporte: E ele, consegue acompanhar seus jogos?
Juninho:
Às vezes. Quando passa na ESPN, no Brasil, passa lá pela meia noite. Quando consigo, falo para ele dar uma olhada. Mas nem sempre ele consegue.

UOL Esporte: Você já está nos Estados Unidos há quase cinco anos, tem 148 jogos pelo Galaxy e virou referência no clube. Vendo o Ricardo defendendo a seleção brasileira, você tem vontade de se naturalizar norte-americano para defender os Estados Unidos?
Juninho:
É... Isso já passou na minha cabeça, vou ser sincero. Já pensei nisso. Sei do quanto posso chegar com a cidadania na mão. No momento eu só tenho o green card. Se tiver a opção, sem dúvida. Eu sou residente, tenho o green card, mas tenho que esperar mais cerca de dois anos para ter a cidadania. Já cogitei a possibilidade, estou há cinco anos aqui, eu e minha esposa conversamos sobre isso.

UOL Esporte: Você se anima ao sonhar com a possibilidade de defender a seleção? Imagina uma partida contra o Ricardo, contra a seleção brasileira?
Juninho:
Eu joguei contra ele uma vez só, na base, Santo André x São Paulo. Ele ganhou aquele jogo, foi 1 a 0. Foi a única vez. Quem sabe pela seleção, não posso descartar nada no futuro. Me sinto muito feliz e horado de saber que meu pai fez tudo pela gente e por meu irmão conseguiu chegar onde o brasileiro sempre sonha, que é a seleção. Espero que um dia isso aconteça.

UOL Esporte: O Ricardo começou na base do Santo André porque não passou em testes em clubes maiores. No início da carreira você acabou tendo um desempenho melhor...
Juninho:
Quando eu fui para o São Paulo, passei no teste, tinha 15 anos. Levei meu irmão para fazer o teste depois de um ano, mas ele não passou. Meus pais batalharam muito para que a gente fosse jogador profissional.

UOL Esporte: Os outros dois brasileiros que trocaram o São Paulo pelo Galaxy em 2010 não foram tão bem como você. Como sua família se adaptou e como vive nos Estados Unidos?
Juninho:
Minha esposa é de São José dos Campos, como eu. Tenho um filho que nasceu há sete meses, nasceu nos Estados Unidos, também. Chama João Vitor, e não tem o Goulart no nome, também. Só Pereira (risos). O começo foi difícil, mas hoje eu já falo inglês e espanhol muito bem, minha esposa também fala, então estamos muito bem. O futebol aqui era bem diferente ao que a gente estava acostumado a jogar no Brasil. A gente não tinha muitas oportunidades com Carpegiani, Leão, ou até Muricy. Ideia era buscar um espaço para depois voltar. No nosso caso não foi assim. Tive que conhecer a cultura, o futebol, não falava a língua. Pude me formar aqui, desde o primeiro mês. São cinco anos de titular, campeão em 2011 e 2012, minha vida aqui foi se adaptando aos poucos.

UOL Esporte: São anos nos Estados Unidos e um reconhecimento muito grande, também com o sonho de jogar pela seleção. Mas em alguns momentos passa pela cabeça voltar ao Brasil ou jogar na Europa?
Juninho:
Estou muito feliz aqui. Claro, gostaria de procurar um futebol maior, até. Mas acho que não é o momento. Quem sabe até voltar  a jogar no Brasil... Vivi o sonho de jogar no São Paulo. Penso no São Paulo, conheço muito bem o clube. Deixei as portas abertas lá, mas a gente sabe que no futebol a gente não pode fechar portas. Eu sou muito aberto a outros clubes, também.

UOL Esporte: E propostas? Quais teve para deixar o Galaxy, desde que foi contratado definitivamente, em 2013 (empréstimo se encerrou e o clube o contratou após rescisão com o São Paulo)?
Juninho:
Muitas portas se abrem quando se ganha um campeonato aqui nos Estados Unidos. Há alguns anos atrás pintou uma oportunidade do México para mim, e também do Oriente Médio, mas houve uma valorização do meu contrato. Optei pela minha família.

UOL Esporte: Por ter se adaptado ao país, pelo nascimento do filho no local, pretende viver nos Estados Unidos pelo resto da vida quando parar de jogar?
Juninho:
Essa é uma boa pergunta. Eu sou um cara que tem outra área de atuação no Brasil, também. Eu mexo com imóveis na minha região, São José dos Campos. Caso eu pare de jogar, não sei se fico aqui ou se volto para o Brasil. Mas a qualidade de vida aqui é muito boa, aqui o futebol está em crescimento, tem muito campo para um ex-jogador poder explorar. Quem sabe ser um treinador, ser auxiliar, ensinar crianças a jogar futebol... Aqui tem muito campo para isso.

UOL Esporte: O LA Galaxy tem Landon Donovan como jogador mais badalado, teve Beckham e tem você como titular há cinco temporadas. Você se considera um ídolo do clube, hoje?
Juninho:
Pode se dizer... A palavra ídolo talvez não. Posso dizer que sou uma referência. Uma referência para os jogadores do meu clube, como um jogador que vem de outro de outro país e consegue sucesso internacional em pouco tempo. Tenho um reconhecimento do público que é uma coisa difícil. Quando vou dar meu autógrafo a criança fala: ‘Você é meu jogador favorito’. Isso é um reconhecimento muito grande.

UOL Esporte: Hoje a MLS cresce muito. Em 2007, Beckham foi contratado para ser o grande garoto-propaganda da liga. Acha que boa parte do reconhecimento da MLS se deve a ele hoje?
Juninho:
Com a chegada do Beckham acho que a mídia mundial quis entender a revolução que foi a saída dele do Real Madrid para Los Angeles. Ninguém conhecia muito o futebol dos Estados Unidos. Não tinha público. Com a chegada dele teve uma revolução, a chegada dele trouxe muito mais televisão, muito mais jogadores. Naquele tempo muitos não conheciam a liga e hoje se sentem bem com isso. Tem muitos jogadores que estão voltando, a liga está crescendo muito. A liga tem muito a crescer.

UOL Esporte: E como foi conviver com o Beckham como companheiro de time?
Juninho:
Minha relação com ele foi muito boa, excelente. Ele conhecia Ronaldo, Roberto Carlos, que atuaram ao lado dele. No time, eu dependia dele porque a gente jogava com dois volantes. Então, quando ele saía eu tinha que ficar, e vice-versa. Nossa afinidade foi muito boa, ele sempre me dava conselhos, frisava muito a parte do profissionalismo. A gente tinha uma grande afinidade dentro e fora de campo. A gente se olhava e já sabia para onde passar a bola. O Beckham fora de campo era um paizão. Ele é amigo, atende a todos, aproveita o tempo livre com a família. Sempre nos ensinou como funciona a vida fora de campo. Apesar de ser um popstar, levava uma vida bem tranquila, bem diferente do que passa na televisão.

UOL Esporte: A partir de 2015 a MLS terá Kaká, que vai começar a jogar pelo Orlando City. Acha que, assim como Beckham fez a primeira, ele pode fazer a segunda revolução midiática da liga?
Juninho:
Esse é um grande ponto. Acho que o Kaká optou por ir para Orlando porque é onde tem o maior número de brasileiros dos Estados Unidos. Vai ser o primeiro ano do clube na liga. Acho que com o Kaká, sem dúvida, a liga vai aumentar cada vez mais. O nível com a chegada dele vai ser muito grande. Sabemos da qualidade do Kaká. Sou brasileiro, conheço ele pessoalmente e joguei muitas vezes com o Real Madrid em amistosos, acho que ele vai revolucionar a liga, assim como o Beckham trouxe toda a visão, a mídia.