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Neymar revela em livro que cogitou deixar o futebol após ato de rebeldia

Neymar xingou Dorival Júnior na partida do Santos contra Atlético-GO, em setembro de 2010 - Ricardo Nogueira/Folhapress
Neymar xingou Dorival Júnior na partida do Santos contra Atlético-GO, em setembro de 2010 Imagem: Ricardo Nogueira/Folhapress

Maurício Dehò

Do UOL, em São Paulo

04/09/2013 06h00

Entre títulos, belos gols e uma transferência milionária para o Barcelona, um assunto delicado ainda incomoda Neymar. O astro de apenas 21 anos não esqueceu um dos episódios negativos de sua carreira, o ato de rebeldia que teve contra Dorival Júnior, quando deixou o campo xingando o ex-treinador do Santos. É o que mostra o livro “Neymar – Conversa entre pai e filho”, que retrata as histórias de Neymar Jr. e de seu pai e que revela que o incidente levou o jogador a pensar em abandonar o futebol.

A publicação, que chegou às livrarias na última semana, foi feita com depoimentos da dupla colhidos pelo apresentador Ivan Moré. O comentarista Mauro Beting foi o responsável por editar e roteirizar o texto.

Em certo momento de sua trajetória, Neymar fala profundamente sobre o caso com Dorival, que aconteceu em setembro de 2010. Na ocasião, o Santos venceu o Atlético-GO por 4 a 2, mas o atacante se revoltou ao ser proibido pelo técnico de cobrar um pênalti.

“Sei que errei feio nessa história toda com o Dorival”, diz Neymar, em um relato longo, de mais de uma página. “Foi um dos piores dias da minha vida. Eu não era aquilo que havia passado para as pessoas. Eu precisava melhorar muito. Crescer bastante. Amadurecer ainda mais. Mas aprendi. Tanto no aspecto pessoal como no profissional.”

O atacante chegou a ser punido e ficou afastado do elenco. E, segundo ele, foi este o momento mais difícil que passou dentro do Santos, time que apostou nele desde cedo. A ponto de cogitar parar. “Foi o dia que mais chorei. O que mais fiquei arrasado. (...) Nos dias seguintes, era triste ligar a televisão. Ver você sendo chamado de monstro, todo mundo te metendo o pau, falando mal. Foram noites horríveis. (...) Se não fossem meus amigos, minha família, eu acho que eu não estaria aqui hoje. Com certeza eu teria abandonado o futebol", afirma - leia mais em trecho do livro abaixo.

Neymar adota um tom de desculpas e diz que lamentou quando, por conta da discussão de quantos jogos ele deveria perder no gancho, Dorival acabou sendo demitido do Santos.

O livro todo se passa alternando relatos em primeira pessoa de Neymar pai e filho. Em um dos capítulos do pai, uma “bronca” fica por conta da ausência do atacante na Copa de 2010. A seleção era comandada por Dunga. “Entendo que o treinador tinha suas escolhas, seu grupo fechado. (...) Até o Pelé e o Zico defenderam o chamado deles. O Messi, vejam só, estranhou a não convocação dos meninos. Mas não teve jeito. Tivemos de respeitar”

RELEMBRE A POLÊMICA ENTRE NEYMAR E DORIVAL

Troca de torpedos com Messi

Um outro episódio muito trabalhado no livro é a recente ida de Neymar para o Barcelona. E, entre inúmeros elogios ao argentino Lionel Messi, grande estrela do clube catalão atualmente, conta-se que uma conversa por mensagens de celular foi responsável pela primeira aproximação entre eles, para evitar qualquer desentendido na chegada do brasileiro.

“O próprio Messi fez questão de falar com o Neymar Jr. quando pintou aquele boato de que ele não seria bem recebido no clube, logo depois do nosso acerto com o Barcelona. O Montillo, meia argentino companheiro de Santos, fez o meio-campo pelo celular com o Juninho. O Messi e meu filho se falaram por torpedos. Ele falou que estavam todos ansiosos pela chegada dele ao Barça, que seria recebido muito bem por todos”, afirma Neymar da Silva Santos.

O atacante também falou do argentino, principalmente no encontro deles no Mundial de Clubes de 2011. “Naquele dia pude receber o carinho e o respeito de um mito como o Messi. Além do grande futebol dele, da genialidade dentro de campo, a humildade do camisa 10 argentino é admirável. (...) Espero ajudá-lo a conquistar mais títulos como companheiro de clube.”

Ivan Moré: 'Diferencial é trazermos a história do pai de Neymar'

  • UOL Esporte: Como surgiu a ideia do livro e este formato diferente, com pai e filho dialogando para contar as histórias?
    Ivan Moré: Tudo começou no convite da Editora Universo dos Livros. Pelo fácil acesso ao jogador, me propuseram a ideia e topei. É um livro em primeira pessoa. Como se Neymar e o pai dele contassem as histórias.

    Neymar é bastante jovem. Ele já merecia um material como este, quase biográfico?
    A história não conta apenas a trajetória do Neymar, mas também do pai dele. Está aí o diferencial. Todas as dificuldades da vida do pai convergiram num menino que por uma obra do acaso é um dos maiores gênios do futebol atual. Sem o pai Neymar jamais teria alcançado o status que alcançou.

    O que deve chamar mais a atenção dos leitores: a vida pré-fama, ou detalhes exclusivos atuais?
    Creio que a vida pré-fama. Muita gente não sabe, por exemplo, que Neymar só recebeu esse nome de última hora pelo pai. Há também bastidores de negociações com outros clubes, desde os 13 anos. Há situações que o público jamais imaginou e que o livro traz a tona.

Alfinetadas em Ceni e Lugano

O tom do livro, de modo geral, é “pra cima”. Elogios, juras de amor ao Santos, ao Barcelona e à seleção, promessas de títulos na Copa e nas Olimpíadas e referências à vida de pai do pequeno Davi Lucca. Mas também sobram pequenas e discretas alfinetadas.

Uma delas é em Rogério Ceni. No Paulista de 2010, Neymar bateu um pênalti com paradinha e marcou contra o veterano. “O goleiro são-paulino ficou bravo naquele jogo. (...) Rogério, que é um mito, um excelente goleiro e batedor de pênaltis, irritou-se com a cobrança de Juninho, que foi absolutamente legal. Não entendi. Mas faz parte do jogo”, fala Neymar pai.

Outra polêmica foi durante a Copa das Confederações. Antes da semifinal contra o Uruguai, Neymar e Lugano trocaram provocações. “O Lugano, antes da partida, disse que o Neymar Jr. cavava muitas faltas, que o futebol brasileiro já não era mais o mesmo. Aquela coisa de sempre”, diz o pai e empresário.

Neymar chamaria Mateus, mas pai mudou planos da mãe

Entre os causos da infância de Neymar, destacam-se o já conhecido acidente de carro que ele sofreu junto à mãe e ao pai - o bebê foi encontrado debaixo de um banco do carro - e o fato de que o nome combinado para que ele recebesse era Mateus, e não Neymar, como o pai.

A mudança aconteceu de repente, no meio do caminho para o cartório. “Então, quando fui registrá-lo, estava definido que seria Mateus. Porém, no meio do caminho mudei de ideia... E ele foi chamado de Neymar. Como o pai. Nasceu, então, o Neymar Jr.!”.

Esta relação entre eles é o fio condutor de todo o livro, mostrando a relação entre pai e filho, que também é muito próxima profissionalmente, já que todos os passos da carreira de Neymar Jr. são planejados e executados em família.

Ficha Técnica
Título: Neymar - Conversa entre pai e filho
Autores: Mauro Beting e Ivan Moré
Editora: Universo dos Livros
Número de Páginas: 192
Preço: R$ 39,90

MAURO BETING COMENTA O LIVRO

Leia um trecho do livro

  • Nabour Goulart/Agência Freelancer

    “O placar era de 3 a 2 para o nosso time quando tivemos um pênalti a favor. Eu vinha treinando e batendo nossos pênaltis, embora tivesse perdido alguns. O treinador pediu para o Marcel cobrá-lo. Discutimos por conta disso. O capitão Edu Dracena também entrou na parada. Foi feio o negócio, mas foi do jogo. No vestiário, o clima continuou quente. Eu me exaltei e ele também. Mas acabamos fazendo as pazes ali mesmo. Ele me chamou na salinha dele, falou o que tinha que falar, e nos resolvemos. Já estava tudo certo quando o auxiliar do Dorival recomeçou a discussão. O que estava numa boa voltou a ficar pesado. Acabou não ficando legal no final das contas e eu fui punido. A direção do clube queria que essa punição fosse por apenas uma partida. O treinador quis mais jogos. Eles acabaram se desentendendo e, logo depois, a diretoria acabou demitindo o técnico.

    Não sou de polêmica. Quando entro em alguma, é muito mais por algo que faço em campo que por alguma coisa que falo ou faço fora dele. Jamais trabalharia contra um profissional, ainda mais um superior na hierarquia. Acato as ordens. Cheguei até onde estou também por isso. Mas, no jogo, no calor da disputa, às vezes me excedo. Perco a cabeça.

    (...)

    Sei que errei feio nessa história toda com o Dorival. Foi um dos piores dias da minha vida. Eu não era aquilo que havia passado para as pessoas. Eu precisava melhorar muito. Crescer bastante. Amadurecer ainda mais. Mas aprendi. Tanto no aspecto pessoal como no profissional. Naquele pênalti, eu só queria ajudar o time. Não foi individualismo, foi só nervosismo exagerado da minha parte. Acabei brigando não só com o treinador, mas com outras pessoas, com meu capitão. Acabei me sentindo muito mal com essa demissão. Cheguei a achar que eu era o culpado. Mesmo com todos falando que não era isso, fiquei com a sensação de culpa. Também pela pessoa legal que é o Dorival.

    Foi o dia que mais chorei. O que mais fiquei arrasado. Meu pai estava doente aquele dia. Saí do clube e fui para casa. Ele e minha mãe choravam. Ela já tinha chorado na hora do jogo, quando me viu naquela situação. Ela disse que aquele não era o filho que ela educou. Não era o Juninho que ela conhecia. Isso pesou muito. Pesa ainda hoje. Fiquei ainda mais arrasado quando ouvi isso. Mas me ajudou a crescer, a me fortalecer. E a não cometer mais o mesmo erro.

    Nos dias seguintes, era triste ligar a televisão. Ver você sendo chamado de monstro, todo mundo te metendo o pau, falando mal. Foram noites horríveis. Eu pedia perdão a Deus toda hora, todos os minutos. Se não fossem meus amigos, minha família, eu acho que eu não estaria aqui hoje. Com certeza eu teria abandonado o futebol.

    (...)

    Aprendi com a dor. E também muito com o amor das pessoas queridas. Um erro nunca se justifica. Meus pais sempre me ensinaram a não ficar procurando explicações para as falhas, mas a buscar aprender e melhorar. Além de manter a calma. Na hora do fogo, no momento em que falho, quem vai me ajudar é a família. A minha torcida mais fiel. O meu primeiro time.”