UOL Esporte Futebol
 
17/07/2009 - 07h00

Brasil de 94 consagra pragmatismo e espalha tendência de 'marcação total'

Bruno Chazan*
Em São Paulo
A frustração pelas eliminações da seleção brasileira nas Copas de 1982 e 1986 - e em menor grau na de 1990 - foi determinante para que Carlos Alberto Parreira adotasse o que se convencionou chamar de pragmatismo para o Mundial seguinte, nos Estados Unidos. A pressão para que a equipe quebrasse o jejum de 24 anos sem o maior título possível no futebol virou motivo para que o treinador escolhesse um sistema de jogo que priorizasse a correção de antigos defeitos.

OS 70 HOMENS DE PARREIRA
Frederico Rosário/Folha Imagem
Nos 33 meses de laboratório para a Copa do Mundo de 1994, Carlos Alberto Parreira testou nada menos que 70 jogadores para achar os 22 que melhor encaixavam na sua filosofia de jogo. Curiosamente, das posições de linha, a cabeça-de-área foi a que teve menos candidatos: 10, dos quais três foram aos Estados Unidos. Também foram utilizados seis goleiros, 11 laterais, 14 zagueiros, 13 meias e 16 atacantes. Entre os esquecidos, nomes como Charles Guerreiro, Paulão, Axel, Alberto e Nilson.
GoleirosCarlos, Gilmar, Ronaldo, Sérgio, Taffarel, Zetti
LateraisBranco, Cafu, Charles Guerreiro, Giba, Jorginho, Leonardo, Lira, Luiz Carlos Winck, Nonato, Roberto Carlos, Vítor
ZagueirosAldair, Alexandre Torres, Antônio Carlos, Célio Silva, Cléber, Júlio César, Marcelo Djian, Márcio Santos, Mozer, Paulão, Ricardo Gomes, Ricardo Rocha**, Ronaldão, Válber
VolantesAxel, César Sampaio, Dinho, Dunga, Júnior, Luisinho, Marco Antônio Boiadeiro, Mauro Silva, Mazinho, Wilson Mano
MeiasAlberto, Carlos Alberto Dias, Edílson, Luiz Henrique, Marquinhos, Neto, Palhinha, Paulo Sérgio, Raí, Rivaldo, Silas, Valdo, Zinho
AtacantesAlmir, Bebeto, Careca, Charles, Edmundo, Elivélton, Evair, Muller, Nilson, Renato Gaúcho, Romário, Ronaldinho, Sávio, Túlio, Valdeir, Viola
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Considerava-se, até então, que o jogador brasileiro não sabia marcar. Ainda persistia no inconsciente coletivo do país o oportunismo de Paolo Rossi, sempre livre de vigilância, na Copa da Espanha, e a arrancada permissiva de Maradona na da Itália. Parreira, então, incumbiu-se de implantar na seleção a mentalidade de valorização da retomada da bola. Era preciso aprender a defender como os europeus: posicionar-se atrás da linha da bola, atuar de forma compacta e jamais se expor aos contra-ataques. O que fazer com a redonda nos pés era o menor dos problemas.

O curioso é que Parreira nem sempre se fez notar pelo excesso de preocupações defensivas na seleção. Depois que reassumiu a equipe, em outubro de 1991, em substituição a Paulo Roberto Falcão, armou o meio-campo com apenas um volante (Mauro Silva) e três meias (Luís Henrique, Raí e Zinho). Essa formação atuou junta por quase dois anos e só foi desfeita no primeiro grande tropeço da caminhada rumo aos Estados Unidos: a derrota por 2 a 0 para a Bolívia. Do alto dos 3600 metros de La Paz caíram a invencibilidade brasileira em 40 anos de eliminatórias e a confiança do treinador em apostar na ofensividade explícita. No compromisso seguinte, contra a Venezuela, Luís Henrique deu lugar a Dunga, justamente o volante que emprestou seu nome à geração que fracassou no Mundial anterior.

Assim caminhou a seleção até seu terceiro jogo na Copa de 1994. Insatisfeito com a timidez do capitão Raí, Parreira promoveu a entrada de Mazinho, revelado pelo Vasco como lateral-esquerdo mas que vinha jogando como volante no Palmeiras. Alteração que só reforçou os argumentos dos críticos que vociferavam contra a cautela em demasia. "Estávamos ficando vulneráveis no meio-campo. O Raí, apesar de ser excepcional, não vinha numa fase excelente, e a entrada do Mazinho deu consistência ao setor", lembra Zagallo, o fiel escudeiro de Parreira.

O time não perdeu força ofensiva e manteve a regularidade atrás. Tornou-se o campeão com a melhor defesa da história das Copas até então - três gols sofridos em sete jogos, média de 0,42 por jogo. Tal índice seria superado pela França, em 1998, e pela Itália, em 2006, ambas vazadas duas vezes. "A equipe sabia o que fazer dentro de campo, defendia e atacava bem. Tínhamos bons valores na época: Taffarel, Jorginho, Aldair, Branco, Dunga, Mauro Silva, Zinho, Bebeto, Romário... Mostramos que jogar sem a posse da bola foi fundamental para a conquista", opina Zagallo.

O planejamento foi cumprido à risca. Como enfatizava o próprio Parreira, a seleção preparou-se ao longo dos 33 meses daquela gestão para vencer, não para dar show. E o tetra também deixou como legado uma maior parcela de tolerância quanto àquele estilo de jogo. "Jamais imaginei que comemoraria um desperdício de pênalti como eu comemorei. Eu, que sempre fiz o discurso que preferia perder como em 1982 do que ganhar como poderia ter ganho em 1990, me dei conta que não era bem assim. Foi absolutamente compensador", admite Juca Kfouri, blogueiro do UOL Esporte.

Outra herança foi o resgate do crédito junto ao torcedor. "O Brasil recuperou a confiança. Depois ainda chegou à final em 1998 e 2002. Voltou a ter confiança no seu taco e passou a ser respeitado pelo mundo afora", opina Kfouri.

* colaborou Renan Prates
** contundiu-se na estreia, mas permaneceu com o grupo

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