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Copa 2018

Tite não quer superpoder, mas é dono da seleção e convence até patrocinador

Tite tem influência em outras áreas da seleção e é "o homem" junto ao elenco - Pedro Martins / MoWA Press
Tite tem influência em outras áreas da seleção e é "o homem" junto ao elenco Imagem: Pedro Martins / MoWA Press

Danilo Lavieri, Dassler Marques, Pedro Ivo Almeida e Ricardo Perrone

Do UOL, em Londres (Inglaterra)

05/06/2018 04h00

A segunda-feira era de folga para a seleção brasileira, com todos liberados e sem qualquer atividade programada. Ainda assim, mesmo de longe, Tite movimentou peças e alterou funções de craques como Neymar e Messi em um esquema que envolve milhões. De dólares e de pessoas. O cenário não era o campo, mas a campanha de um dos patrocinadores dos atletas e da CBF.

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Ainda que o técnico rejeite rótulos e superpoderes, sua influência em todos os campos da seleção brasileira é cada vez mais clara. Seu comando no vestiário é nítido. E quando uma situação externa ameaça seu discurso junto ao elenco, ele também se posiciona. Foi assim nos últimos dias.

A Mastercard resolveu alterar uma campanha publicitária global após críticas do treinador no último fim de semana, em entrevista coletiva realizada em Liverpool, antes do amistoso entre Brasil e Croácia.

Com discurso firme e citando a empresa, Tite criticou a opção de doar pratos de comida a pessoas com fome apenas em caso de gols de Neymar e Messi durante a Copa do Mundo. Os dois são embaixadores da operadora de cartão de crédito.

“Mastercard, eu vou falar uma coisa. É muito bonita essa doação em relação à entidade assistencial. É linda e grande. Assim como é grande também vocês darem pratos se todos os atletas da Argentina e do Brasil marcarem um gol. A gente trabalha enquanto equipe e com todos esses valores pode frustrar um pouquinho. Fica a minha sugestão”, declarou Tite, vendo a empresa alterar toda a campanha menos de 48 horas depois – agora mais de um milhão de pratos de comidas serão distribuídos, independentemente de gols ou jogadores.

“O Homem” da seleção

O episódio é emblemático e mostra o prestígio daquele que já não é chamado nem mesmo pelo nome na seleção brasileira. Para jogadores, integrantes da comissão técnica e membros do estafe, Tite é simplesmente “o homem”. É assim que as pessoas se referem ao profissional que deixou de ser uma aposta para o cargo de técnico e hoje divide o protagonismo na Copa com os astros que entram em campo.

O assunto da importância de Tite é recorrente e chega a incomodar o técnico. Ele não se cansa de rechaçar qualquer comparação ou elevação de sua condição.

Na última semana, em Londres, foi abordado por um jornalista croata que queria saber do apelo popular que já chegou a pedir até para que Tite seja presidente do Brasil. Ele refutou o cenário e saiu pela tangente na resposta.

Em recente entrevista ao UOL, descartou a possibilidade de maneira dura. “Ser presidente é importante e responsável. E por mais importância que tem, ser técnico da seleção não é igual à política, não se preocupa com igualdade social, com uma educação melhor. Uma roubalheira associada à falta de punição gera morte. O meu trabalho, não. Não dá para associar”.

A aprovação ao trabalho de Tite começou antes mesmo de ele ir a campo comandar um trabalho com bola entre os jogadores. De perfil mais político, diferente do antecessor Dunga, precisou de poucos sorrisos e uma dose de cordialidade para iniciar a mudança na imagem de uma seleção desgastada.

De tabela, surgiu como salvação para uma CBF atolada em denúncias e problemas políticos. Com 16 vitórias, três empates e uma derrota à frente da seleção, virou a cara da "confederação que dá certo".

A aprovação pública supera até a de nomes como Carlos Alberto Parreira (técnico em 1994 e 2006) e Zagallo (comandante em 1970, 1974 e 1998). Pressionados por cortes feitos baseados em decisões técnicas e resultados adversos, ambos não tiveram tamanha aprovação no período pré-Mundial.

Publicidade e contestação

O pentacampeão Luiz Felipe Scolari, em 2014, foi beneficiado pelo título da Copa das Confederações no ano anterior e pela empolgação de uma Copa em casa. Com essas credenciais, chegou ao Mundial no Brasil em alta com a torcida e como uma rara estrela no banco de reservas da seleção, historicamente marcada pelas turras entre torcida e treinador.

Ao fim do Mundial, no entanto, poucos imaginavam que a seleção devastada pelo 7 a 1 contra a Alemanha teria, em seu comando, uma figura com tanta aceitação quatro anos depois.

Em campo, o grupo o abraça. Até mesmo a barração de nomes considerados titulares não chegam a gerar um desgaste. “O homem” controlou o vestiário. Fora dele, se tornou um dos rostos mais conhecidos em campanhas publicitárias no período pré-Copa.

Tite virou quase uma mania. Como tudo, porém, não é unanimidade. Com imagem prestigiada por atitudes fora das quatro linhas e pela gestão do grupo nos bastidores, ele ainda desperta descontentamento em torcida e crítica por escolhas técnicas. Especialmente nas últimas semanas.

Após a convocação para a Copa, no início de maio, o treinador recebeu críticas. O atacante Taison, o lateral Fagner e o goleiro Cássio foram motivos de questionamentos. “Sei que vou virar aqui e vocês vão falar um monte”, brincou, após anunciar os 23 nomes para o Mundial.

No último domingo, Tite se viu novamente diante das “cornetas” do público que começa a se interessar pela Copa da Rússia. A escalação de Fernadinho no meio e a opção por Thiago Silva na defesa levantaram debates. O mau desempenho do primeiro, aliás, prejudicou a saída de bola e também a criação. Somente a entrada de Neymar no segundo tempo evitou que o prestígio do “Homem” fosse abalado.

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