Filhos do tetra vão torcer de longe para o Brasil. Um deles virou rival

Em 17 de julho de 1994, nos Estados Unidos, Roberto Baggio chutou um pênalti nas nuvens e o Brasil terminou com um frustrante jejum de 8.792 dias sem comemorar um título mundial. O anterior havia sido em 21 de junho de 1970, no México, com uma inesquecível goleada contra a mesma Itália, por 4 x 1. Foram 24 anos e 26 dias.
Mais 24 anos se passaram e o Brasil vai lutar pelo hexa na Rússia. O penta veio em 2002, no Japão. E jogadores que participaram da conquista de 1994 poderiam ver seus filhos defendendo o Brasil, assim como eles fizeram. Bebeto, Romário e Mazinho, por exemplo, tiveram filhos que seguiram a carreira de jogador, tentaram chegar à seleção, mas não vestirão a amarela no Mundial da Rússia - um deles virou rival.
Mazinho, que começou a campanha do tetra na reserva e ganhou o lugar de Raí. Ele poderia ir à Rússia torcer para que Rafinha e Thiago, ambos de sobrenome Alcântara, conquistassem o mesmo que ele: um título mundial pela seleção brasileira.
Não verá nenhum.
Rafinha foi campeão olímpico em 2016, mas não foi levado em conta por Tite para a Copa do Mundo. As possibilidades (pequenas ou grandes, não se sabe) foram sabotadas por uma contusão no joelho e uma transferência à Inter de Milão, onde ainda não se firmou como titular. E Thiago, hoje no Bayern de Munique, foi vítima, segundo Mazinho, de outra sabotagem.
“Meu sonho era ver os dois defendendo a seleção brasileira, mas não será possível. A seleção brasileira não quis o Thiago. Me disseram, de dentro da CBF, que os garotos formados fora do Brasil não vestiriam a camisa da seleção brasileira. Foi uma negativa muito forte", desabafa, ao UOL Esporte, o campeão mundial.
Ele não cita nomes, diz apenas que foi um recado “de dentro da CBF”. Mas um recado tão forte que Thiago, que tem cidadania espanhola, direcionou sua carreira para a Fúria, seleção na qual disputará o Mundial da Rússia. “Ele sempre foi muito bem tratado na Espanha, participou de todas as seleções de base e eu não teria coragem para pedir a ele que esperasse para jogar pelo Brasil”, diz.
Uma frustração para Mazinho. “Eu joguei nas seleções de base do Brasil, joguei na principal também e queria ver meu filho na seleção, principalmente porque ele tem características únicas que nenhum outro jogador tem. Mas o importante é que ele está feliz. E eu fiquei muito feliz também com o título olímpico do Rafinha, o primeiro do Brasil."
O significado de ter um pai campeão do mundo é algo que as crianças podem demorar a entender. “Meus filhos tiveram esse entendimento anos depois do Mundial, quando começaram a gostar mais de futebol e perceberam como é legal um Mundial”, diz Mazinho.
E, se falamos de pais e filhos, o dia 9 de julho é fundamental. O Brasil jogava contra a Holanda, em Dallas, pelas quartas de final. Vencia por 1 a 0 e o goleiro holandês De Goelj cobrou um tiro de meta. Direto na cabeça de um brasileiro. A bola voltou ao campo holandês, diretamente para Romário, que estava impedido. Ele não foi na bola.
Bebeto foi. Driblou o goleiro e só não entrou com bola e tudo porque teve humildade. E correu para comemorar, embalando uma criança imaginária.
Imaginária, nada!
Mattheus havia nascido dois dias antes e o mundo inteiro ficou imaginando como seria a cara do filho recém-nascido de Bebeto.
“Desde pequeno eu vejo esse vídeo. As pessoas vinham me mostrar, mas eu não entendia direito, era muito criança. Depois, entendi que foi uma maneira de me pegar no colo, como havia feito com meus outros irmãos que ele acompanhou o nascimento. Foi uma homenagem muito linda”, conta Mattheus, que teve passagem pelas seleções de base e agora defende o Vitória de Guimarães, emprestado pelo Sporting, ambos de Portugal.
Hoje, ao ver o vídeo, o sentimento reinante é o de orgulho. “Foi uma maneira de me pegar no colo, é emocionante. E foi em uma Copa do Mundo, o que dá muito mais repercussão, é uma dimensão maior."
O tipo de dimensão que Mattheus só entendeu quando tinha 12 anos, já na Copa de 2006. “A gente vai ouvindo as histórias, vai assimilando a grandeza do que foi tudo e um dia passa a entender. Meu pai nunca chegou para mim e contou tudo, mas a gente acaba entendendo."
Em 1994, no Brasil prestes a conquistar um título mundial, falar de Bebeto sem Romário era como falar de goiabada sem queijo. Era a dupla que elevava a estima nacional.
“Meu pai sempre me conta que Bebeto sempre foi o melhor parceiro dele”, conta Romarinho, filho de Romário, e hoje jogador do Figueirense na Série B do Campeonato Brasileiro.
Ele tem lembranças da Copa, viu vídeos e diz que também passou a ter noção da importância do pai ali pelos 12 anos, mas o que o emociona mesmo é outro jogo: Brasil x Uruguai, nove meses antes. O Brasil precisava vencer, no Maracanã, para ir à Copa do Mundo. Fruto de uma eliminatória com problemas, era hora de tudo ou nada.
E, para o tudo ou nada, o técnico Carlos Alberto Parreira passou por cima de divergências e convocou Romário. Ele fez dois gols naquele que considera o maior jogo de sua vida.
No dia seguinte, 20 de setembro, Romarinho nasceu. “Meu pai não estava sendo convocado. Então, veio e fez dois gols. Se não fosse isso, não teria tetra, diz Romarinho."
E a comemoração de Bebeto também não ficaria imortalizada.
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