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Rodrigo Mattos

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Corporativismo de técnicos do país se recicla para atacar Abel Ferreira

Abel Ferreira, técnico do Palmeiras - Ettore Chiereguini/AGIF
Abel Ferreira, técnico do Palmeiras Imagem: Ettore Chiereguini/AGIF

17/08/2022 04h00

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Abel Ferreira e Cuca trocaram farpas após as quartas de final da Copa Libertadores. Geraram um debate bem pertinente a respeito do jogo. Pode-se concordar com um ou outro, mas é chumbo trocado por quem estava envolvido no confronto, e acrescenta ao nosso futebol pela discussão da narrativa da partida.

Depois disso, o treinador do Inter, Mano Menezes, decidiu alfinetar Abel Ferreira ao ironiza-lo indiretamente por dar "aula". Na sequência, o técnico do Atlético-GO, Jorginho, partiu para um novo ataque direto ao colega palmeirense.

"Quando as pessoas [técnicos] vencem, as pessoas esquecem. Se um treinador brasileiro fosse para dentro do vestiário escutar música na hora do pênalti, ele seria chamado de covarde. Mas porque ganhou, nada acontece. Está tudo certo", disse ele. E ainda acrescentou: "quero ver ele vir aqui no Atlético-GO e ser campeão brasileiro". É o segundo ataque direto de Jorginho ao português que dirige o Palmeiras. Antes, disse que ele não podia vir ao Brasil desrespeitar árbitros, o que o Palmeiras, com correção, classificou como xenofobia.

Os dois treinadores, que não estavam envolvidos na disputa, se mostraram incomodados por Abel Ferreira ter explicado os pontos em que entendia que Cuca errou na Libertadores. O treinador alviverde disse que o Galo deveria ter usado mais jogadores por dentro de seu bloco de marcação, e não por fora. Ele tinha razão.

Dito isso, não é a primeira vez que um treinador critica o desempenho de um colega. No Inter x Flamengo, Mano Menezes disse em uma conversa para Dorival Jr. que "meu time também estava esculhambado". Não era uma coletiva, mas tem que ser muito inocente para achar que Mano não sabia que era filmado por uma câmera exposta ao lado. Sua crítica era direcionada a dois treinadores, por coincidência, estrangeiros, Paulo Sousa e Cacique Medida. Ambos de fato fizeram trabalhos ruins. (quem conhece Mano sabe como ele tem estratégia na forma como se comunica em público)

Mas não houve nenhum treinador brasileiro incomodado com a crítica de Mano. Por que será? Também não houve até hoje alguém acusando o outro de ser antiético por reclamar de retrancas de colegas ou minimizar os feitos de outro time ao dizer que "gastaram R$ 200 milhões". Não faltam críticas de um técnico a outro no Brasil. Curiosamente, não geram ataques em massa.

Desde o ano de 2019, quando Jorge Jesus e Sampaoli sacudiram o mercado de técnicos locais, os treinadores brasileiros se dividiram em dois. Uma parte deles viu que tinha de subir o seu nível. Vejamos o exemplo de Dorival Jr que faz um trabalho muito superior ao de Paulo Sousa, com uma formação moderna e funcional. Há outros exemplos, Rogério Ceni, o próprio Cuca. E outra parte demonstra claramente um rancor diante da ocupação de parte do mercado.

Técnicos não são bons ou ruins pela nacionalidade só. Mas os brasileiros estavam defasados, sim, e alguns já entenderam e têm reagido. Tanto que, por méritos, ocuparam cargos que foram de estrangeiros no início do ano. Mano faz um trabalho melhor do que Cacique Medida.

O movimento corporativista, no entanto, parece ter se reciclado. De ataques diretos, e até pitadas de xenofobia, passou a rebater de forma veemente de quem aponte a incompetência de um técnico brasileiro.

E isso acontece, mais uma coincidência da vida, quando estamos prestes a ter a troca de técnico da seleção quando Tite sair após Copa. Mais uma curiosidade, o presidente da CBF, Ednaldo Rodrigues, já disse que não teria problemas de contratar um estrangeiro.

Não sabemos o que Abel faria no Atlético-GO ou na seleção. Mas sabemos, sim, que Jorginho era o principal auxiliar no time de Dunga na Copa de 2010. E deu no que deu.