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Rodrigo Mattos

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Mattos: Cinco problemas que comprometem prêmio de melhor do mundo da Fifa

Lewandovski durante duelo entre Bayern e o Al Ahly na semifinal do Mundial                         - HUSSEIN SAYED
Lewandovski durante duelo entre Bayern e o Al Ahly na semifinal do Mundial Imagem: HUSSEIN SAYED

18/01/2022 04h00

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A Fifa anunciou os prêmios de melhor do mundo, nesta segunda-feira, vencidos por Robert Lewandowski e Alexia Putellas nas categorias principais. Entre os técnicos, ganhou Thomas Tuchel. Todos os resultados são aceitáveis, dentro da normalidade, embora seja pertinente a discussão tanto sobre o técnico quanto o jogador masculino.

Dito isso, o prêmio da Fifa tem diversos problemas, de regras, critérios e mentalidade que comprometem a sua credibilidade. É meio óbvio que um prêmio não é um jogo de futebol, que tem um parâmetro extremamente objetivo para avaliar o vencedor: quem faz mais gols. Mas, dentro da subjetividade inerente ao processo, a premiação da federação internacional tem um sistema de votação que não leva em conta só méritos esportivos.

Primeiro, expliquemos as regras, são quatro colégios de eleitores (técnicos de seleções, capitães, jornalistas e voto popular). Os quatro grupos votam em três por categoria, com pesos diferenciados para cada escolhido. E os quatro colégios eleitorais têm o mesmo peso.

A votação é feita dentro de uma lista de jogadores e técnicos escolhidos previamente pela Fifa. Tentarei explicar aqui o ponto a ponto de falhas:

Eurocentrismo

O prêmio praticamente só olha para o futebol europeu, exceção a destaques na Copa do Mundo. Isso é notável na lista de sete técnicos: só havia treinadores com destaque no velho continente com exceção de Scaloni, comandante da Argentina. O vencedor, Tuchel, foi o campeão da Liga dos Campeões.

No ano passado, o técnico do Palmeiras, Abel Ferreira, ganhou duas Libertadores em um só ano. Já o sul-africano Pitso Mosimane ganhou duas Champions League Africanas também em um ano, no banco do egípcio Al Alhy. Ambos foram ignorados, como já ocorrera com Jorge Jesus, do Flamengo, em 2019. Gallardo conseguiu um posto na lista final pelo seu trabalho no ano que em venceu a Libertadores com o River Plate.

E também não é difícil apontar jogadores com temporadas brilhantes na América do Sul que ficam fora da lista de 11 melhores. A Fifa considera, aparentemente, que feitos em clubes de outros continentes não valem nada porque o nível é mais alto na Europa.

Camaradagem

Quando há a votação pelo colégio eleitoral, é comum técnicos e jogadores votarem em seus amigos ou colegas de times e seleção. Na lista deste ano, o capitão do Brasil, Thiago Silva, colocou Neymar como melhor do mundo, assim como fez seu amigo Messi. Ora, não fazia nenhum sentido o brasileiro estar nesta posição.

Mas não foi o único. O capitão francês Lloris fez uma lista só com franceses: Benzema, Mbappé e Kanté —Deschamps fez o mesmo. São jogadores de mérito na temporada, mas será que a nacionalidade teve peso nestes votos? Tudo indica que sim. Assim como Busquets votou no companheiro Messi. Já o capitão Chielini, em Jorginho, seu colega de seleção, mesmo voto do técnico do time, Roberto Mancini.

Ressalte-se que Tite não foi pelo coleguismo neste ano: votou só em estrangeiros, colocando Lewandowski como melhor. Entre os jornalistas, não há praticamente essa indução de votar em compatriotas e, obviamente, nem em amigos. Uma observação: o polonês ganhou em todas as três categorias, só perdeu no público onde Messi é bem mais popular.

Período equivocado

A escolha de melhor do mundo é feita pela temporada europeia, isto é, de outubro de 2020 a agosto de 2021. O problema é que o voto só ocorre no final do ano, entre os meses de novembro e dezembro. O resultado só sai em janeiro do ano seguinte.

Com isso, há uma confusão sobre qual período exatamente analisar os jogadores, já que, obviamente, os eleitores vão ser influenciados pelos últimos jogos — é humano. Salah faz uma temporada incrível em 2021/2022, mas, no ano passado, não estava tão exuberante. Ficou entre os três melhores. Neste caso, talvez, o melhor fosse fazer a premiação logo depois da temporada ou anualizar a análise.

Critério e pontuação discutíveis

Nas regras do prêmio da Fifa, está descrito que o prêmio será dado "com base na performance e conduta geral dentro e fora de campo dos jogadores". É meio óbvio como se analisa um jogador em campo, mas, e fora dele? Que tipo de conduta levaria um atleta que tivesse um ano de Pelé a ser excluído do prêmio?

Por exemplo, se Lewandowski repetisse o sérvio Djokovic e recusasse a se vacinar e fizesse pregação por desrespeitar regras impostas na pandemia, ele perderia a premiação? (Isso não aconteceu, é só uma hipótese). E uma agressão em campo o eliminaria da lista de finalistas?

A pontuação para definir o melhor também é bem discutível. O vencedor de cada categoria leva um número de pontos, o segundo outro número, e os outros na sequência. Assim, se um jogador vencer por grande margem entre jogadores, por exemplo, sua vantagem sobre o outro atleta será a mesma. Talvez isso seja feito para tirar o peso da popularidade de atletas, Messi teve o dobro de votos de Lewandowski entre os populares. Mas pode gerar distorções. O polonês ganhou com grande vantagem nas outras três categorias e ficou só quatro pontos acima de Messi, 48 a 44.

Confusões de premiações

Por fim, há uma confusão entre as premiações da Fifa e da Fifpro (sindicato mundial de jogadores). No caso do feminino, a espanhola Alexia Putellas não constou da seleção feita por jogadores profissionais. No masculino, o melhor goleiro eleito pela Fifa, Mendy, não aparece na seleção feita por atletas que tem Donnaruma na lista.

A Fifa aparentemente quer fazer política com o sindicato, mas isso deixa o cenário bem caótico. Afinal: quem é o melhor goleiro do mundo? Como pode a melhor jogadora estar fora da seleção? Melhor era divulgar esses prêmios/seleções em separado para não causar esse caos.