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Aposentadoria de Nadal deixa órfãos todos os amantes de esporte

A primeira vez que o vi foi em Roland Garros. O ano era 2005. Temporada seguinte à da última participação relevante de Guga no saibro parisiense, quando batera Roger Federer, por 3 a 0, em plena Phillippe Chatrier, e só parara nas quartas-de-final, num jogo duríssimo com David Nalbandian.

Em 2005, entretanto, Gustavo Kuerten foi eliminado na estreia, ao perder para o inexpressivo espanhol David Sanchez, levando até pneu no segundo set (6/3, 6/0, 4/6 e 6/1). Com dois outros brasileiros eliminados na primeira rodada (Marcos Daniel e Ricardo Mello) e o último na segunda (Flávio Saretta), minha atenção passou a se concentrar nos grandes nomes.

Federer, Safin, Ferrero (estes dois fizeram um jogão na terceira rodada, com vitória do russo), Gaudio, Coria (respectivamente campeão e vice, da final sem graça em 2004), Moyá, Gonzalez etc. Certo dia, entretanto, na sala de imprensa, ouvi um papo entre jornalistas espanhóis sobre "um chico fenomenal". Quem era? Um tal Rafael Nadal...

Tinha 18 para 19 anos (3 de junho de 1986) e jogava com uma fúria assustadora. Corria em todas as bolas, até aquelas que já pareciam perdidas, e as salvava. Bermudão, camiseta sem mangas, um cabelo longo que prendia com uma bandana e uma simpatia contagiante - estava aprendendo inglês e, muitas vezes, se enrolava nas coletivas, comemorando cada frase inteligível como um ponto e um sorrisão. Impossível não gostar dele.

Sua prova de fogo, entretanto, viria na semifinal. Do outro lada quadra, o número 1 do mundo, o suíço Roger Federer, sedento para conquistar o título que não tinha e lhe escapara, em 2004, com a derrota categórica frente a Guga (6/4, 6/4, 6/4, no canto de cisne de nosso tricampeão).

E veio o jogo. E lá estava eu na tribuna de imprensa da Chatrier, pensando comigo mesmo. O garoto é excelente, mas diante do Federer... Tolinho. O jovem touro "Miúra", apelido que lhe seria dado, com a sequência impressionante de vitórias e títulos, ganhou o primeiro set, viu o adversário empatar no segundo e triunfou, incontestavelmente, no terceiro e no quarto. Nascia um fenômeno.

Que levantaria o troféu em Roland Garros inacreditáveis 14 vezes, fazendo por merecer a linda estátua que ornamenta o complexo. Tornou-se tão absoluto por lá que me fez, durante um tempo, desistir de ir ao Grand Slam parisiense - por mais que sempre fosse prazeroso vê-lo em ação, qual a graça de ir a um torneio em que, de antemão, já se sabe o campeão? Foi assim em 2005, 2006, 2007 e 2008.

Por isso, em 2009, troquei RG por Wimbledon. E não é que, exatamente, nesse ano, Rafa perdeu para o sueco Robin Soderling, na semifinal? Menos mal que, graças à troca, vi, naquele ano, Federer (que, enfim, venceu em Paris) bater o recorde de Pete Sampas, numa final histórica, na grama sagrada, contra o americano Andy Roddick (5/7, 7/6, 7/6, 3/6 e 16/14 - não havia ainda tie-break no quinto set em Londres).

Rei do saibro, incontestável, Nadal foi gigante também nas outras superfícies, onde tornou-se campeão em mais oito torneios de Grand Slam, totalizando os 22 com que encerra a brilhante carreira.

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Sua vitória sobre Federer, na final de Wimbledon 2008, é considerada por muitos a maior partida de tênis de todos os tempos (6/4. 6/4. 6/7, 6/7, 9/7), superando a lendária decisão de 1980, entre o sueco Bjorn Borg e o americano John McEnroe.

Pouco importa a essa altura se o touro "Miúra" deve ser considerado ou não, o maior de todos os tempos no tênis. Há os que prefiram o lindíssimo estilo clássico de Federer, ou todos os impressionantes recordes de Novak Djokovic ou até mesmo os dois Grand Slam de calendário de Rod Laver.

O que importa é que Rafael Nadal se retira hoje deixando orfã, pelo mundo inteiro, uma enorme legião de fãs. Não somente no tênis, mas em todos os esportes. Ele foi, sem dúvida, um dos maiores entre os maiores.

Obrigado por tanto, Rafa!

Opinião

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** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

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