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Renato Mauricio Prado

ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

Tiro de Del Nero matou Caboclo mas agora está saindo pela culatra

15/06/2021 23h01Atualizada em 15/06/2021 23h03

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O "tiro" disparado pelo ex-presidente da CBF, Marco Polo Del Nero, para "matar" Rogério Caboclo, seu antigo pupilo e agora desafeto, está saindo pela culatra e pode colocar um ponto final na influência que o cartola, mesmo banido do esporte pela Fifa, por corrupção, ainda mantinha sobre o futebol brasileiro.

Até os mais ingênuos funcionários da CBF sabem que as revelações do escândalo que acabaram provocando o afastamento de Caboclo da presidência têm as digitais do ex-presidente. Insatisfeito com a não submissão total daquele que colocou no poder e enfurecido com as investidas grosseiras do mesmo sobre uma de suas ex-funcionárias mais queridas, Del Nero agiu nas sombras e trouxe à luz toda a podridão do antigo escudeiro, o que acabou causando o seu fim.

Ele só não contava com a iniciativa dos clubes da primeira divisão de aproveitar este momento de enorme instabilidade política da CBF para lançar um movimento forte e bem coordenado com o objetivo de criar uma liga e assumir, primeiro, o Campeonato Brasileiro, e, em seguida, o comando do nosso futebol.

Sim, isso é apenas a ponta do iceberg de uma ação política que, se bem-feita, esvaziará o poder das Federações e da própria Confederação. Poder que Del Nero se esmerou em aumentar quando, à sorrelfa, mudou as regras do jogo, passando a dar peso 3 aos votos das 27 Federações, peso 2 aos 20 clubes da primeira divisão e 1 aos da segunda. Era o plano perfeito para se manter na presidência até o fim de seus dias. Já não é mais.

Os clubes unidos exigem o fim dessa aberração, bem como das regras para se lançar candidatos à presidência da CBF. Em outros tempos, seriam repelidos com ameaças de punições (e perseguições) esportivas, até no âmbito da Fifa. Agora, com Del Nero afastado por corrupção e banido pela entidade máxima do futebol, não parece haver movimento capaz de permitir ao ex-presidente manter o seu status quo de eminência parda da Confederação (a ponto de ainda ser chamado por todos de "presi" e comandar conversas com os vices em sua própria casa).

Na reunião realizada entre os clubes e a diretoria da CBF o local escolhido foi o restaurante do luxuoso prédio na Barra, por iniciativa dos vice-presidentes que garantiam ali não haver "grampos". E, mesmo assim, vários deles, batiam com os talheres nos pratos, enquanto falavam, comentando, entre risos, "que era para que o Marco Polo não ouvisse".

Ser motivo de piadas até por parte daqueles que indicou (todos os oito vice-presidentes atuais foram colocados nos cargos por Del Nero) dá uma boa medida do enfraquecimento de seu poder. Que se encerrará de uma vez por todas no momento em que os clubes lançarem o seu próprio candidato e ganharem as próximas eleições.

Tudo indica ser um caminho sem volta. Ironicamente, iniciado por um movimento do cartola que dá as cartas no futebol brasileiro desde 2012, quando José Maria Marin assumiu a presidência. Maquiavélico, Marco Polo sempre soube manobrar nos bastidores. Mas dessa vez, enfurecido, não calculou com precisão as consequências de seu ato. Matou o inimigo mais próximo, mas morrerá porque enfraqueceu as estruturas que protegiam seu poder e os clubes souberam se aproveitar disso.

Rei morto, rei posto. Longa vida ao novo rei! Quem será ele? Que os clubes saibam escolher bem.