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Renato Mauricio Prado

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Presunçoso, Ceni mete os pés pelas mãos no "Dividida" de Mauro Cezar

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A entrevista de Rogério Ceni a Mauro Cezar Pereira, no "Dividida" do UOL, me deixou boquiaberto. Quanta presunção ao querer comparar o seu trabalho ao de Jorge Jesus, quanta benevolência com os próprios erros, quanta ilusão em atribuir a má vontade de grande parte da torcida rubro-negra ao fato de ter sido ídolo do São Paulo por tantos anos.

O torcedor do Flamengo não está nem aí para o passado de seu treinador. O que ele quer é que consiga fazer o super time de estrelas que tem nas mãos jogar um futebol compatível com a qualidade do elenco. Algo que Ceni, mesmo com a conquista do Brasileiro, está a anos luz de alcançar.

Parêntesis obrigatório: todos os técnicos que sucederam a Jesus deveriam ter a inteligência e a sensibilidade (minha saudosa tia Norma, diria, "desconfiômetro") de não falar dele. O espetacular trabalho do português é inatacável e qualquer comparação será trágica para quem a fizer.

Mas, na entrevista a Mauro Cezar, Ceni teve o desplante de lembrar que, em 2019, o Flamengo só se classificou para as quartas-de-final da Libertadores nos pênaltis, contra o Emelec, algo que, ressaltou, seu time por pouco, também não conseguiu: na mesma fase, caiu na decisão pelas penalidades, diante do Racing. Mas quem diria que, se passasse, seria campeão? Pouco provável, com o futebolzinho irregular que praticava.

E Rogério não ficou só nisso. Fez questão de recordar que até os 88 minutos de jogo, na final da Libertadores, contra o River Plate, o Flamengo de Jesus estava perdendo. E daí? O que ele quis insinuar com isso? O mesmo que o trapalhão Domènec Torrent, que disse aos jogadores rubro-negros que nem sempre eles teriam tanta sorte? Cala-te, boca!

Não contente, Ceni afirmou ainda que nem sempre a equipe do português jogou bem. Desencavou do baú das suas mágoas, com as críticas que vem sofrendo, o jogo de 2019 com o CSA, que o Flamengo venceu a duras penas por 1 a 0! Mas venceu, certo? Ao contrário do time de agora, incapaz de ganhar do Atlético Goianiense, do Ceará, do Fortaleza, do Athletico Paranaense, do Red Bull Bragantino e por aí vai...

No chorrilho de bobagens que disparou, o atual treinador rubro-negro chegou ao cúmulo de minimizar a atuação heroica dos garotos da base, contra o Palmeiras, no Allianz Parque, garantindo um pontinho que, em última análise, foi decisivo na conquista do título. Fez questão de dizer que os palmeirenses não estavam em seu melhor momento! Só rindo. Pra não chorar. A resposta apenas confirmou a má vontade que tem com a turma da base, sempre relegada a um segundo plano em prol dos "mais cascudos".

Questionado sobre suas polêmicas substituições (quase sempre incompreensíveis para torcedores e jornalistas), defendeu-se, acredite se quiser, com "o elenco que tem"! Como se fosse um grupinho fraco e desprovido de talento. Que o obrigasse a tirar Gabigol para colocar Pedro e, em seguida, fazer entrar outro centroavante, Rodrigo Muniz que, segundo ele, "recompõe melhor". Brincadeira, né?

Na entrevista, aliás, reafirmou que será difícil usar Gabigol e Pedro juntos, porque precisaria tirar uma das estrelas do meio-campo e do ataque: Bruno Henrique, Arrascaeta, Everton Ribeiro, Gerson ou Diego. Só ele não vê que Éverton Ribeiro não joga bulhufas faz tempo...

Ceni fez questão até de destacar as muitas oportunidades de gol criadas por seu time, em alguns jogos em que não conseguiu vencer. E também o fato de que, nos tempos de Jorge Jesus, os atacantes convertiam muito mais do que com ele. Por que será? Treinamentos mais adequados, talvez?

O que o técnico não explicou, nem lhe foi perguntado, é por que a sua equipe usa, sistematicamente, como principal arma de ataque cruzamentos a esmo sobre a área. E por que também, não possui nem sequer uma jogada ensaiada: em escanteios, faltas próximas à área etc., etc...

Voltando à entrevista, perguntado sobre qual teria sido o seu maior erro, Rogério Ceni preferiu vestir a capa de herói, dizendo que talvez não devesse ter assumido o comando do time a um dia da primeira partida contra o São Paulo, pela Copa do Brasil.

Lamenta-se de tê-lo feito, porque agora atribuem a ele também a eliminação nesse torneio. Deveriam atribuir a quem? Não vinha de dois jogos decisivos, contra o mesmo São Paulo, dirigindo o Fortaleza? Não tinha suficiente conhecimento do rival? Sai pra lá...

O único momento em que Ceni disse algo sensato foi quando classificou como seu maior acerto o deslocamento de William Arão para a zaga, com a entrada de Diego como volante. Sim, aí ele acertou, tirando um coelho da cartola que poucos tirariam. Mas foi só.

Até quando falou do jovem goleiro Hugo e de suas falhas, me surpreendeu ao terceirizar o treinamento que ele deve receber, atribuindo-o apenas aos treinadores de goleiros. Como assim? Um dos melhores arqueiros da história do nosso futebol, não pode orientar um jovem da posição, sob o seu comando? Somente porque agora ele é o treinador principal? Para...

Salvo por um título brasileiro conquistado na bacia das almas, graças a um impedimento de poucos centímetros de Edenílson, após mais uma derrota para o São Paulo, Rogério Ceni deveria levantar as mãos para os céus e fazer uma seríssima autoanálise de seus erros e acertos, para fazer um trabalho decente à frente do melhor elenco do país.

A entrevista dada a Mauro Cezar, contudo, me deixou com pouquíssimas esperanças de que isto aconteça. Ceni revelou-se um treinador com um ego gigantesco, arrogante, presunçoso e incapaz de reconhecer suas limitações. Difícil acreditar que evolua. E que tenha um futuro longevo no Flamengo.

Errata: este conteúdo foi atualizado
Diferente do informado anteriormente na coluna, a final da Libertadores de 2019 foi entre Flamengo e River Plate; não Racing (ARG). O erro foi corrigido.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL