Topo

Renato Mauricio Prado

Nadal x Guga, Hamilton x Senna. Já imaginaram tais duelos?

Rafael Nadal com o troféu de Roland Garros 2020 - Getty Images
Rafael Nadal com o troféu de Roland Garros 2020 Imagem: Getty Images

12/10/2020 04h00

Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail

Email inválido

Os craques do futebol que me perdoem, mas o domingo não foi deles, mas de atletas que não calçam chuteiras e fizeram história em seus respectivos esportes. Refiro-me, claro, ao tenista espanhol Rafael Nadal e ao piloto britânico Lewis Hamilton. Eles igualaram recordes que, há poucos anos, pareciam inatingíveis: os 20 títulos de torneios de Grand Slam, de Roger Federer, e as 91 vitórias em GPs, de Michael Schumacher. Como não bater palmas de pé para essa dupla de gênios?

A carreira de Rafa acompanhei de perto. Vi-o estrear em Roland Garros em 2005 e, nesse mesmo ano, conquistar o seu primeiro título no saibro parisiense. A surpreendente e espetacular vitória sobre o então número 1, Federer, na semifinal, e a divertidíssima entrevista, pós-título, lutando para falar inglês, idioma que ainda não dominava, são inesquecíveis. Com seus bermudões largos, o cabelo longo escorrido, preso numa bandana, e o sorrisão aberto, de garoto do bem, Nadal tornava-se ali o novo xodó dos franceses. Digno sucessor do "surfista de saibro", o nosso Guga.

Em Paris, assisti ainda aos seus três títulos seguintes (e seguidos) na Philippe-Chatrier. Brincando, comentei com amigos, que o Miúra estragara o torneio. Ficara previsível, sem graça! Ninguém ganhava dele. Em 2009, troquei Roland-Garros por Wimbledon. E não é que foi exatamente nesse ano que ele acabou batido pelo sueco Soderling - a primeira de suas duas únicas derrotas no Slam francês? Em Londres, pelo menos, presenciei Roger Federer vencer Andy Roddick numa final de tirar o fôlego, na grama sagrada, igualando a marca de 14 Slams de Pete Sampras - que estava presente, naquele dia, no All England Tennis Clube.

Ano passado, após um bom tempo de ausência, voltei a Paris, achando que o sérvio Novak Djokovic (que vinha de vencer consecutivamente Wimbledon, US Open e Aberto da Austrália), poderia ameaçar o reinado de Nadal nas quadras de pó de argila de "Rolanga". Ledo engano. Nole caiu nas semifinais para Thiem e vi Nadal conquistar o décimo-segundo título.

Antes daquela final, encontrei-me com Gustavo Kuerten, numa cerimônia em que ele era empossado embaixador do torneio, e lhe perguntei como achava que teria sido enfrentar o espanhol num momento em que ambos estivessem no melhor de suas formas físicas e técnicas. Simpático, como sempre, ele sorriu, me abraçou e disse que gostaria muito que isso tivesse acontecido pois, acreditava, o jogo teria sido "muito interessante".

Apesar de todo o carinho que tenho por Guga e da enorme admiração pelo seu tênis, que tive o prazer de acompanhar de pertinho, jogo a jogo, nos títulos de 1997, 2000 e 2001, em Paris, me parece difícil que ele conseguisse bater esse "monstro", que disputou, até agora, 16 torneios em RG e perdeu apenas duas vezes: Soderling, em 2009, e Djokovic, em 2015. Não ganhou também em 2016, mas não foi derrotado em quadra. Contundido, abandonou a competição antes do jogo da terceira rodada.

Nesse último domingo, enfim concretizou-se o duelo com Nole, número 1 do mundo e praticamente invicto na temporada - na única derrota, no US Open, perdera para si mesmo, ao atingir uma juíza de linha com uma bolada, numa atitude indesculpável, punida com a desclassificação. Detalhe: na ATP Cup, no início do ano, Djokovic já derrotara Nadal em sets diretos. Mas a quadra era dura...

No saibro e, principalmente, numa final em Roland Garros, a coisa é bem diferente, como seu viu. Foi um massacre! O número 1 do ranking não teve chance alguma. E o touro Miúra chegou a inacreditáveis 13 títulos no Grand Slam francês. Alguém, algum dia, será capaz de bater tal marca - o recordista anterior era o sueco Bjorn Borg, com seis conquistas. Pensando bem, foi melhor Guga não ser contemporâneo de Rafael Nadal...

Das quadras para as pistas, chega-se ao outro fenômeno: Lewis Hamilton. Esse surgiu bem depois da minha época de correspondente no circo da Fórmula-1 (sou dos tempos de Piquet, Senna, Prost e Mansell, nada mau, né?). Só o vi correr, ao vivo, em Interlagos, mas, confesso, apesar daquele título que "roubou" de Felipe Massa, na última curva, do GP do Brasil de 2008, sempre fui seu fã. A maneira como desafiou o bicampeão Fernando Alonso, na McLaren, logo em seu ano de estreia nas pistas (2007) mostrava claramente que estava nascendo uma estrela.

Campeão em 2008 (graças à ultrapassagem na última curva do GP Brasil daquele ano, tirando o título que a família de Massa já comemorava, no boxe da Ferrari), ele, depois, viveu a fase de decadência da escuderia de Ron Dennis e precisou se transferir para a Mercedes, para voltar a lutar por títulos. E a quem ele substituiu? Ninguém menos que Michael Schumacher, que voltara da aposentadoria, mas estava sendo constantemente superado pelo jovem Nico Rosberg.

Lewis passou, então, a empilhar vitórias e títulos. Sua homenagem a Ayrton Senna, seu ídolo, quando bateu o recorde de poles do brasileiro, foi de arrepiar. Me encantam também seus posicionamentos firmes fora das pistas - como a defesa dos negros e das minorias.

Posturas corajosas que o fazem começar a ser perseguido pela Federação Internacional de Automobilismo (FIA) e desagradam muitos dos chefões da F-1. Que mordam as costas. Hamilton está pronto para quebrar todos os recordes da categoria (virtual campeão da atual temporada, igualará o número de títulos de Schumacher) e se tornará o maior de todos nas estatísticas. O que nos leva à pergunta obrigatória, ao menos para nós, brasileiros: será ele melhor que Senna, seu ídolo e espelho?

Para embasar uma opinião, é preciso imaginar o que, possivelmente, teria acontecido, se o brasileiro não tivesse morrido daquela forma trágica, na Tamburello, em Ímola. É razoável pensar, então, que ele poderia ter conquistado, ao menos, mais três títulos: o de 94 (que Schumacher precisou jogar sua Benetton sobre a Williams de Damon Hill, na última corrida, para vencer) e os de 96 e 97, quando o próprio Hill e Jacques Villeneuve foram campeões com a Williams. Nesse raciocínio, ele e o alemão, portanto, teriam seis títulos cada. O mesmo que Hamilton já contabiliza desde 2019.

Ah, mas o inglês tem o melhor carro do circo há anos, alegam seus críticos. Mas, por acaso, Senna não estava a bordo de uma McLaren imbatível em seus dois primeiros títulos? A de 88, então, teria ganhado todas as provas daquele ano, não fosse um acidente bobo do próprio Ayrton com um retardatário. E, em 91, quando a Williams de Mansell se tornou uma adversária terrível, isso só aconteceu na segunda metade da temporada. E Schumacher, em seus tempos de Ferrari?

Em termos de talento puro de pilotagem, ainda considero Senna o melhor de todos. Mas, confesso, um duelo seu, em carros idênticos, com Hamilton, seria algo digno de sonhos. Ao contrário do duelo de Guga com Nadal que, temo, poderia acabar em pesadelo para nós, fãs do manezinho.

Mais um recorde

No final da noite, também fora do futebol, outro recorde histórico foi igualado no esporte. Os Los Angeles Lakers, do fantástico LeBron James (e de Anthony Davis), fecharam a série contra o Miami Heat em 4 a 2, com uma vitória esmagadora, e conquistaram o décimo sétimo título da NBA, igualando marca histórica dos Boston Celtics.

LeBron conquista assim o seu quarto anel, por três franquias diferentes: Miami Heat, Cleveland Cavaliers e Los Angeles Lakers. É um dos maiores de todos os tempos, sem sombra de dúvida.