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Renato Mauricio Prado

Seleção de 70 é inigualável

Xinhua/Imago/ZUMAPRESS
Imagem: Xinhua/Imago/ZUMAPRESS

16/04/2020 04h00

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As reprises de partidas do Brasil em várias Copas nos trazem esta semana aquela que é, em minha opinião, a melhor equipe que já vestiu a "amarelinha" em todos os tempos e também a seleção mais brilhante da história do futebol. Os jovens que acham Messi melhor que Pelé, provavelmente, torcerão o nariz e alegarão que o jogo, nos anos 70, era lento, que a marcação era frouxa, que sobrava espaço e outras bobagens mais. Perdoai, pai, porque eles não sabem o que dizem.

Nunca, em época alguma, um selecionado foi capaz de reunir tantos supercraques em forma tão exuberante (não confundir com amontados de "galácticos" em final de carreira ou péssimo estado físico, como por exemplo, 2006). Foram três meses de treinamentos intensos, um dos quais na altitude de Guanajuato, para estar 100% na Copa do México.

Do meio para a frente, o Brasil só tinha gênios do futebol: Gérson, Pelé, Jairzinho, Tostão e Rivelino. Na lateral-direita, outro fora de série: Carlos Alberto Torres. No banco, mais um puro-sangue: Paulo César Caju. Na cabeça de área, o excepcional Clodoaldo. E os demais titulares (Félix, Brito, Piazza e Everaldo) eram ótimos jogadores. Não à toa, alguns dos maravilhosos lances desse esquadrão fazem parte de qualquer antologia de melhores momentos dos Mundiais. Alguns exemplos:

O magnífico gol de Pelé contra a Tchecoslováquia (saltando e matando no peito a bola lançada por Gérson, em passe de cerca de 40 metros); a trama infernal do ataque brasileiro, na vitória sobre a campeã mundial, Inglaterra, com drible de Tostão por entre as pernas do grande zagueiro Bobby Moore e passe milimétrico de Pelé para Jairzinho; a jogada inteira do quarto gol, de Carlos Alberto, fechando a goleada, na finalíssima, contra a Itália; os inesquecíveis "quase gols" do Rei (chute do meio-campo, contra os tchecos; boca desmoralizante no goleiro uruguaio Mazurkiewic; e cabeçada perfeita que o goleiro Gordon Banks transformou na milagrosa defesa do século) e por aí vai. Eternas obras de arte que estão podendo ser vistas, revistas e admiradas. Supra sumo do velho e violento esporte bretão.

Em exuberante forma física, aos 29 anos, Pelé justifica, em cada partida, a coroa que começou a conquistar, com apenas 17, em sua primeira Copa, na Suécia. O que se pode ver, no México, doze anos depois, é um jogador maduro, consciente e determinado ao extremo. Protagonista em todos os momentos, mas nem um pouco preocupado em brilhar mais que seus companheiros. Jogando para e pelo time. De forma absurdamente eficaz.

Com a mesma idade do Rei do Futebol, Gérson foi outro que chegou ao México sabendo que aquela seria a sua última Copa e também a grande chance de apagar o seu fracasso pessoal na Inglaterra, quatro anos antes, quando o Brasil formou um daqueles elencos cheios de nomes famosos, muitos deles decadentes e vários inexperientes, e acabou vergonhosamente eliminado na fase de grupos.

Em compensação, em 70, como jogou o Canhotinha de Ouro! Esbanjou passes precisos e sempre pra frente. Nada de bola pro lado. Seus lançamentos de 30, 40 metros eram de tirar o fôlego. Jairzinho deitou e rolou com eles. Gerson de Oliveira Nunes foi o maior meio-campo que vi em ação (Zico era meia-atacante, como Pelé, não um armador clássico). Graças a Deus, o acompanhei bastante, no Botafogo, no São Paulo, no Fluminense e na seleção. Do início, no Flamengo, pouco recordo.

Machucado, no finalzinho da partida de estreia, Gerson ficou de fora nos confrontos com a Inglaterra e a Romênia. Foi brilhantemente substituído por Paulo César Caju, que entrou na ponta-esquerda, permitindo a Rivelino ocupar o meio-campo. E como jogaram esses dois!

Deslocado para a ponta-esquerda ou no meio, o Reizinho do Parque, rebatizado "A Patada Atômica", após o gol de falta contra a Tchecoslováquia (o primeiro do Brasil no México), gastou a bola. Driblou como nunca, abusou dos passes açucarados e dos chutes demolidores, fez gols e infernizou a vida de todos os seus marcadores. Um monstro.

Como Tostão, que também atuou fora de posição (avançado, como centroavante) e conseguiu ser igualmente eficiente. Marcou apenas dois gols (ambos contra o Peru), mas foi fundamental na função de pivô - basta ver a primorosa jogada do gol contra a Inglaterra, quando faz gato e sapato de três zagueiros, inclusive o excelente Bobby Moore.

Até Jairzinho, que no Botafogo já atuava mais centralizado, precisou se readaptar à ponta-direita, para se encaixar no esquema de Zagallo, nesse Mundial. E se tornou o Furacão da Copa, balançando as redes em todos os jogos. Ao todo, foram sete gols em seis partidas. Quando partia em velocidade, era absolutamente impossível pará-lo. Uma força da natureza.

Sei que há alguns torcedores e jornalistas mais velhos que consideram a seleção de 58 melhor, pelo fato de ter Pelé e Garrincha, juntos - e a seleção brasileira jamais perdeu quando ambos estiveram lado a lado.

Respeito-os, mas não penso assim. Naquela fantástica equipe que ganhou a Copa para o Brasil pela primeira vez (e repetiu a dose, quatro anos depois), em 1958, vejo "apenas" cinco supercraques, puros-sangues indiscutíveis: Nílton Santos, Zito, Didi, Garrincha e Pelé. Em 1970, conto seis titulares, no topo da pirâmide, Carlos Alberto, Gérson, Pelé, Jairzinho, Tostão e Rivelino. E mais Paulo César Caju, no banco.

Enfim, questão de gosto, de opinião. Pra mim, repito, a seleção que conquistou o tricampeonato no México é simplesmente inigualável. É um deleite poder rever seus jogos. Melhor só se fosse com as narrações originais, mas o SporTV sabe-se lá o motivo, prefere insistir em recontar a história, jogando fora todo o clima e a emoção daqueles momentos inesquecíveis.

"Olha lá, olha lá, olha lá.... No placar!"

Como era bom ouvir a narração de Geraldo José de Almeida!