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Renato Mauricio Prado

Não tenho pena do Ronaldinho Gaúcho

Ronaldinho e Assis chegam algemados para audiência de custódia - NORBERTO DUARTE/AFP
Ronaldinho e Assis chegam algemados para audiência de custódia Imagem: NORBERTO DUARTE/AFP

09/03/2020 04h00

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Ronaldinho Gaúcho foi um dos maiores gênios do futebol que vi em campo, em minha já longa vida. Tivesse ele um mínimo de juízo, poderia ter disputado cabeça a cabeça com Lionel Messi e Diego Maradona o posto de segundo maior futebolista da história — Pelé é outro patamar, como se diz no jargão da moda, consagrado agora por Bruno Henrique.

Mas, infelizmente, bom senso, discernimento na condução da própria carreira e, acima de tudo, profissionalismo nunca foram o forte do genial dentuço. Muito pelo contrário. Basta ver como passou a se portar após ganhar, merecidamente, por dois anos consecutivos (2004 e 2005), o prêmio de melhor jogador do mundo.

Em 2006, quando desembarcou em Weggis, na Suíça, como vértice mais brilhante do malfadado "quadrado mágico" de Carlos Alberto Parreira (formado por ele, Ronaldo Fenômeno, Adriano e Kaká), ainda não se sabia, mas ele já estava (aos 26 anos!) em processo acelerado de se tornar um ex-atleta em atividade. Não jogou bulhufas naquela Copa da Alemanha e, a partir dali, não foi capaz de voltar a ser — salvo em esporádicos lampejos, cada vez mais raros — o gênio irresistível que encantava o planeta bola.

Sabiamente, em 2008, o Barcelona tratou de se livrar dele e de sua turma famosa pelo talento e pelo amor a boemia (Deco, Eto'o & Cia.). Abria-se assim espaço para Messi, Xavi e Iniesta, que os sucederam com maior sucesso e, principalmente, longevidade mais significativa. O que joga La Pulga até hoje que o diga.

Vendido ao Milan, Ronaldinho ficou mais famoso por sua agitada vida noturna em Milão do que pelas pálidas atuações com a camisa rossonera. De lá, em 2011, transferiu-se para outro clube rubro-negro, contratado que foi pelo Flamengo, numa transação surpreendente e que acabaria por dar com os burros n'água.

A Traffic (empresa de marketing do falecido J. Hawilla), parceira do Fla no negócio, rompeu o contrato que lhe garantia o pagamento da maior parte dos salários, após um ano de insignificantes resultados esportivos e financeiros.

Ganhou um campeonato estadual, foi protagonista de um dos maiores jogos da história recente do futebol brasileiro (Santos 4 x 5 Flamengo, na Vila Belmiro) e só. Os produtos licenciados em seu nome fracassaram — até porque sua imagem se desgastou rapidamente, levando alguns grupos de torcedores a defender até "comandos" na noite, para flagrá-lo em festas e boates, onde brilhava muito mais do que nos gramados.

Enfim, deixou a Gávea, rumo à Cidade do Galo onde, sob o comando de Cuca, conseguiu reencontrar parte de seu futebol encantador, levando o Atlético Mineiro à conquista de uma Libertadores inédita. E foi ali o seu canto de cisne — já na fase final da campanha caiu de rendimento e no Mundial Interclubes teve atuação pífia na humilhante desclassificação para o Raja Casablanca, na semifinal do torneio.

Ainda teve passagens frustradas pelo Queretaro, do México, e pelo Fluminense, antes de pendurar as chuteiras de forma absolutamente obscura e incompatível com o seu tamanho no esporte. Jogo jogado. Fez o que quis da própria carreira e se a sensação que fica é que poderia ter ido muito mais longe do que foi, o problema é dele, não dos fãs de seu imenso futebol, entre os quais me incluo.

No entanto, o que diferencia Ronaldinho de caso semelhante, o de Adriano Imperador, é o que me leva a não ter pena dele agora, nessa inacreditável confusão no Paraguai. Desde que abandonou os gramados, o nome do Gaúcho e de Assis, seu irmão e notório empresário, passaram a frequentar bem mais o noticiário policial que o esportivo.

Entre outras coisas, associou sua imagem a uma empresa de pirâmide financeira que lesou muita gente — ele diz que fazia apenas propaganda, de um relógio com a sua marca, mas o fato é que seu nome aparecia entre os sócios da firma de picaretagem.

Além disso, cometeu crime ambiental em uma de suas fazendas no Sul e, multado pelo Ministério Público do Rio Grande do Sul em mais de R$ 9,5 milhões, não desfez o tal píer que violentou a natureza e recusou-se a quitar o débito, o que levou o MP a bloquear seus passaportes (o dele e o do irmão) e 57 imóveis que lhe pertenciam, pois nas suas contas bancárias, havia pouco mais de vinte reais!

Para resolver o problema, foi a Brasília, onde se encontrou com o presidente Jair Bolsonaro, posou para fotos de apoio e de lá voltou com a dívida renegociada, os passaportes devolvidos e, acredite se quiser, nomeado "Embaixador de Turismo" do Brasil.

Pois bem, o "Embaixador de Turismo" do Brasil e seu irmão e empresário acabaram presos numa cadeia de Assunção, flagrado que foram com passaportes paraguaios falsos, obtidos sabe-se lá com que intuito.

O juiz responsável pelo caso diz que tais documentos são costumeiramente usados para cometer outros crimes, como lavagem de dinheiro associado a cassinos.

Peço desculpas pois ao supercraque que Ronaldinho Gaúcho foi e continuarei a admirar, mas não dá pra ter pena do cidadão. Que pague pelos crimes que cometeu. Se foi levado a eles pelo irmão, pouco importa. Ele é adulto e responsável pelos atos que pratica.