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ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

Olimpíadas canonizam Galvão Bueno, unanimidade nacional

Galvão Bueno durante participação no Ohayo, do SporTV - Reprodução
Galvão Bueno durante participação no Ohayo, do SporTV Imagem: Reprodução

05/08/2021 10h54

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Se Rebeca Andrade "é prata, é prata, é prata, é prata, é prata", Carlos Eduardo Galvão Bueno é ouro. Aos 71 anos, o narrador virou unanimidade nacional.

Já vai longe o tempo em que existia a frase "cala a boca, Galvão", uma adaptação do "cala a boca, Magda", com que Miguel Falabella se dirigia a Marisa Orth no extinto "Sai de Baixo".

O interessante é que Galvão Bueno atinge graus incríveis de aceitação e se firma como uma entidade pop, quando sua voz já não é a mesma. Há algum tempo, chegou a sumir e impedir que trabalhasse.

Galvão já se definiu como um vendedor de emoções. E as Olimpíadas são um palco especial para que as emoções aflorem. Não é como em esportes que envolvem clubes, quando a torcida se divide. Não, aqui é Brasil contra a rapa. Todo mundo está torcendo de um lado só. E Galvão Bueno está lá, comandando a massa, sem balançar a pança.

As Olimpíadas são o ponto máximo da união entre patriotismo e pachequismo. É preciso aplaudir, apoiar, empurrar. É preciso ser íntimo dos atletas.

E Galvão é o mestre de cerimônias. "Brasil, vem aqui, quero te apresentar a Rebeca". Pena que essa intimidade não dure. Quantos que colocaram Rebeca ou Rayssa como seus avatares estarão na frente da televisão na próxima competição de skate ou de ginástica? Muitos optarão por Votuporanguense x Duque de Caxias.

A transformação de Galvão Bueno em um ídolo nacional passa também por um processo bem planejado. Elogio em boca própria é vitupério, dizia a Tia Glorinha, mas a Globo não se furtou a fazer matérias exaltando os 70 anos de Galvão. A mulher, os amigos e os companheiros de trabalho mostraram o "lado humano" atrás da voz.

Outro ponto foi a transformação do modo como se narra. Quando a nota da ginástica confirma a prata de Rebeca, Galvão deixa de olhar o monitor e olha para a câmara externa. Grita é prata, é prata.... diretamente para o amigo telespectador, que está no sofá da sala. A notícia deixa de ser a prata e passa a ser a maneira como Galvão comunica à Pátria que é prata.

O arauto das glórias do desporto nacional.

Aqui, uma digressão.

Rebeca tinha o bronze garantido. Sua última nota diria se era ouro ou prata. Como se fosse o último ponto de um tie break no vôlei. E a nota foi insuficiente. A prata foi ótima, uma conquista histórica - depois superada pelo ouro, em outra prova - mas tinha, sim, um quê de decepção ou conformismo, do tipo "não deu o ouro, mas a prata é uma maravilha". Não para Galvão. Para ele foi o ápice, como se estivesse narrando a conquista do Everest ou a inflação zero.

Voltando à narração. Esse efeito TikTok, de mostrar como o narrador descreve a jogada, já é utilizado pelas rádios, em sua luta inglória contra a televisão. Realmente, aproxima o narrador do ouvinte. Com Galvão, o efeito é potencializado. Não é apenas uma voz para o Brasil, é a Voz do Brasil narrando só para mim.

E Galvão, com todo seu entusiasmo e bordões, tem o grande mérito de não cair na tentação de forçar a barra para que a emoção de atletas se transforme em choro. E também não desfia aqueles textos pseudo emocionantes, que mais parecem aulas de autoajuda, dirigidos diretamente ao atleta, após a prova.

Senhoras e Senhores, aqui está Sir Galvão Bueno, o maior narrador de emoções do Brasil. A unanimidade olímpica.

Sem dúvidas.

E ele merece.