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Marcel Rizzo

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Rizzo: Fifa precisa da elite do futebol a favor da Copa a cada dois anos

Gianni Infantino e Aleksander Ceferin em momento de descontração na sede da Fifa - Getty Images
Gianni Infantino e Aleksander Ceferin em momento de descontração na sede da Fifa Imagem: Getty Images

Colunista do UOL

10/09/2021 14h37

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A direção da Conmebol (Confederação Sul-Americana de Futebol) se pronunciou oficialmente contra o plano da Fifa de realizar a Copa do Mundo a cada dois anos, e não quatro como é atualmente. O presidente da Uefa (União Europeia de Futebol), Aleksander Ceferin, se colocou contrário em entrevista há alguns dias e a associação das principais ligas de clubes também disse não aprovar.

Resumindo, a Fifa tem a elite do futebol contra sua ideia. Europa e América do Sul detêm as principais seleções do planeta — os continentes foram os únicos até hoje a ganhar Copas do Mundo — e os clubes são aqueles que mantêm os contratos dos jogadores, as estrelas de um Mundial.

Na prática, a Fifa não precisa da elite para aprovar o projeto. Se o grupo de estudos montado definir um novo calendário a partir de 2025 que preveja a Copa do Mudo bienal, isso pode ir a votação dos filiados em um Congresso e é preciso a maioria simples dos 211 filiados para uma ratificação.

A África já avisou que pretende apoiar em bloco, ou seja, com todos os seus 56 votos. Federações nanicas da Ásia, como as do Nepal e de Bangladesh já se mostraram favoráveis, o que mostra que a periferia do futebol, como essas associações são chamadas dentro da federação internacional, devem votar a favor do projeto. A Fifa aposta que entidades menores da Concacaf (Confederação das Américas do Norte, Central e Caribe) também se colocariam a favor, o que deixaria fácil o plano de conseguir 106 votos.

A pergunta, entretanto, é outra: é possível convencer investidores, aqueles que colocarão dinheiro no projeto, que realizar uma Copa a cada dois anos é viável com europeus, sul-americano e clubes contra? A resposta é não.

Ceferin, em entrevista ao jornal inglês "The Times", chegou a dar boa sorte à Fifa se quiser colocar de pé uma Copa bienal sem Europa e América do Sul. Sim, o presidente da Uefa talvez ache possível um boicote, apesar de juridicamente isso ser improvável caso o Congresso aprove a mudança.

Para a periferia a Fifa oferece um combo que agrada: mais Copas do Mundo aumenta a quantidade de sedes necessárias e portanto a rotatividade entre os continentes será maior. A África, que só teve hoje o Mundial de 2010, na África do Sul, não tem a médio prazo expectativa de receber outra vez a competição no formato quadrienal. Também cresce a chance de países que nunca jogaram a fase final se classificarem — o que o aumento de 32 para 48 participantes, que valerá a partir da edição de 2026 nos EUA, Canadá e México já facilitou.

A Fifa acenou a grandes estrelas do passado do futebol para ajudá-la na missão de convencimento de que o projeto pode ser bom. Entre os brasileiros, Ronaldo e Roberto Carlos participaram, em Doha, no Qatar, de um encontro que oficialmente deveria debater o projeto, mas que na prática serviu para que todos os presentes se mostrassem garotos-propaganda. Eles vão viajar para suas regiões e conversar com atletas e cartolas a respeito.

Quando em 2017 a Fifa aumentou os participantes da Copa de 32 para 48 houve também críticas de parte da elite. A Uefa não gostava da ideia, mas a Conmebol, sim — inclusive os sul-americanos pediram à Fifa para que a nova regra valesse já a partir de 2022, no Qatar, o que foi rejeitado pelo Congresso. Os clubes também torceram o nariz na ocasião, já que serão mais jogadores cedidos, mas a aprovação ocorreu sem deixar muitas cicatrizes.

A Fifa terá que convencer os clubes de que uma mudança de calendário os ajudará, já que com a Copa do Mundo bienal serão menos datas-Fifa, as janelas que hoje ocupam nove dias por cinco meses no ano em que os clubes são obrigados a liberar os jogadores. Essas janelas cairão para dois meses.

Uefa e Conmebol, hoje, trabalham juntas em planos comerciais de torneios, por exemplo, e oferecem uma oposição branda à Fifa. A entidade pode tentar convencer federações europeias e sul-americanas menores a votar a favor de seu projeto, quebrando uma votação em bloco. Mas é importante ter entes importantes, filiados que já foram campeões do mundo, ao seu lado. A ver o que a Fifa pode oferecer a esses países.