Por que é difícil dar razão ao Flamengo na briga com a Libra
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POR EDNILSON VALIA*
Apesar de considerar corajosa a atitude de Leila Pereira, é difícil acreditar em suas intenções.
Vale relembrar o comportamento dela quando tentou mudar o estatuto do Palmeiras para se eleger pela terceira vez, ou seu silêncio diante da misoginia de Abel Ferreira, além de seu ruidoso mutismo sobre escândalo da Crefisa com o INSS.
Mas a cartola tem razão sobre o "terraflanismo".
O Flamengo, que desde Bandeira de Melo obtém ótimos resultados financeiros, pode ser considerado, de fato, modelo de gestão no futebol.
Em contrapartida, as condutas de seus atuais dirigentes são no mínimo questionáveis.
O clube que se vangloria de seu poder econômico, gosta de humilhar os adversários.
Há poucos dias acusou, com razão, o Inter pelo calote no pagamento do volante Thiago Maia.
Se considerarmos, no entanto, apenas sob o aspecto moral, o Colorado, que vergonhosamente não pagou aos cariocas, está em falta há menos tempo do que o Flamengo demorou para pagar indenizações às famílias vítimas do incêndio no Ninho do Urubu.
Privilégios também entram na conta.
Em julho de 2024, por exemplo, em leilão com candidato único, o Flamengo arrematou o terreno do Gasômetro para construir o seu estádio por R$ 138 milhões.
Em relatório encomendado pela Caixa Econômica Federal, com auditoria independente da Pricewaterhouse, o terreno está avaliado em R$ 249 milhões.
Em 2010, o time da Gávea inaugurou placa em homenagem ao bicampeão carioca de remo pelo clube em 1964/65, Stuart Angel, vítima da ditadura militar.
Sua morte assim foi descrita pela Fundação Perseu Abramo: "Submetido a prolongadas sessões de tortura, foi por fim amarrado à traseira de um jipe e arrastado pelo pátio do quartel. A cada parada do jipe, os agentes levavam a boca do estudante ao cano de descarga e o forçavam a respirar os gases do escapamento. Morreu asfixiado e intoxicado por monóxido de carbono".
Em 2016, a placa foi retirada, segundo a diretoria, por causa de uma obra. Nunca mais foi recolocada.
Em 2019, torcedores tentaram homenagear Ángel e o clube negou com a desculpa de não se envolver em assuntos políticos.
Depois da eleição de Jair Bolsonaro, em 2018, o então presidente rubro-negro Rodolfo Landim vivia ao lado do agora condenado a 27 anos de prisão por tentar abolir o Estado Democrático de Direito e golpe de Estado.
Durante a pandemia de COVID, o Flamengo foi o primeiro clube a voltar aos treinamentos, ao desobedecer recomendação dos especialistas em saúde.
E jogou no Maracanã, contra o Bangu, pelo Campeonato Carioca, enquanto o ginásio do Maracanãzinho era hospital improvisado para tratar os infectados. Durante o jogo três pessoas morreram no ginásio.
No incêndio do Ninho do Urubu, que matou 10 meninos das categorias de base, apesar de ter sido notificado pelo Corpo de Bombeiros e fiscais da prefeitura do Rio de Janeiro sobre os perigos de um incêndio, não tomou providências que evitariam a tragédia.
Landim acertou com as famílias o valor das indenizações, mas mudou de ideia, e "torturou" as vítimas negociando o montante da compensação por mais de quatro anos.
No mesmo período, gastou mais de R$ 200 milhões em contratações de jogadores.
E demitiu o segurança Benedito, que ajudou a salvar vários garotos durante o incêndio do Ninho.
Benedito ficou afastado por bom tempo, diagnosticado com transtorno depressivo e estresse pós-traumático. Quando voltou foi dispensado. Teve que recorrer à Justiça -- e ganhou.
Bruno Henrique, condenado a suspensão de 12 jogos por manipulação em favor de apostadores, virou protegido do clube, até capitão do time, e beneficiado por efeito suspensivo que o mantém em atividade. Viva os espertos, é a mensagem.
A postura do Flamengo diante da Libra é reveladora de arrogância e de absoluto descaso com os demais.
Ao bloquear recursos dos outros clubes, em nenhum momento BAP alegou que o rubro-negro recebia pouco pelos direitos de TV.
Em entrevista, disse: "O Flamengo jamais aceitaria receber 3,5 vezes mais que um time pequeno" e, em reunião do conselho do clube, afirmou: "É fácil ser generoso e fazer socialismo com o dinheiro dos outros".
A que socialismo ele se refere? Não seria melhor se assumir como capitalista selvagem?
A competente direção do Flamengo conseguiu assinar um contrato de direitos de transmissão de TV de menor valor que o do Corinthians sob gestão desastrosa e bandida, de dirigentes réus na Justiça por lavagem de dinheiro, formação de quadrilha e furto qualificado.
Não bastasse, agora não quer arcar com as consequências do que fez a gestão anterior e acha que o mundo gira em torno dele.
*Ednilson Valia é jornalista.




























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