Silva e a torcida do Flamengo

POR LUIZ GUILHERME PIVA

Para o Ruy Castro

Quando alguém quer dizer que algo é partilhado por muitas pessoas, usa a expressão "eu (ou você) e a torcida do Flamengo".

Outra expressão que dá a ideia de amplitude, mas reforçando sua autenticidade brasileira, é "da Silva", como em "solteirinho da Silva".

Cruzando-se as duas expressões, vê-se que a maioria dos Silvas são torcedores do Flamengo, que são a maioria dos brasileiros. E que a maioria dos torcedores do Flamengo são Silvas, que igualmente são a maioria dos brasileiros.

Estudiosos atribuem a enorme difusão do sobrenome Silva (comum em Portugal, mas de raízes romanas) no Brasil à sua atribuição, forçada, a milhões de escravizados durante a colonização.

Sua etimologia remete a Selva.

Curiosamente, os termos acabaram diferenciando dois jogadores de futebol.

O centroavante Leônidas da Silva foi um dos maiores craques brasileiros.

Fez história nos anos trinta e quarenta, sobretudo no Flamengo, no São Paulo e na Seleção Brasileira.

De estilo refinado, é considerado por muitos o inventor da bicicleta, lance que lhe deu fama por ter feito um gol dessa forma em 1932.

Já o também centroavante Manoel Pereira, do histórico time do América-RJ dos anos cinquenta, ficou conhecido como Leônidas da Selva, por ter semelhança física com o outro Leônidas, mas sem o mesmo estilo apurado.

Também jogou no Flamengo, o do bairro de Estreito, em Florianópolis, onde iniciou a carreira.

E também fez fama com um gol de bicicleta.

Só que o lance foi executado ao reverso, porque, num cruzamento, por já ter passado da linha da bola, ele lançou o corpo à frente e, com as mãos no chão e os pés para cima, tocou-a com o calcanhar.

De frente e de costas, dois gols genuinamente brasileiros.

De dois jogadores - como você e a torcida do Flamengo sabem - brasileirinhos da Silva.
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Luiz Guilherme Piva publicou "Eram todos camisa dez" e "A vida pela bola" - ambos pela Editora Iluminuras