Bate-bola com quem propõe uma SAF para o Corinthians
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Portas fechadas para ex-dirigentes, fim dos bilhões em dívida, obrigatoriedade da maior folha salarial da América do Sul, SAF do Fortaleza e muito mais. Entrevista exclusiva com BRUNO PAIVA, "mandatato" pelo grupo que quer transformar o Corinthians em SAF
P: Como surgiu a história de tentar transformar o SCCP em uma sociedade anônima do futebol e adquirir esta SAF?
R: A iniciativa é de quatro corintianos ultra bem-sucedidos e inconformados com a forma com a qual o clube é gerido há 115 anos. Não é uma leitura de oportunidade de negócio e sim uma "intervenção" de um grupo de apaixonados que estão cansados do amadorismo proporcionado pelo modelo associativo.
Mais ou menos como aconteceu no Flamengo, mas em um outro formato.
P: E por que em outro formato? Não seria possível seguir modelo semelhante a reconstrução do Flamengo?
R: Primeiro porque a legislação agora permite, e, principalmente, porque não há possibilidade de se eleger na política do SCCP. Nenhum deles tem tempo ou disposição pata se submeter ao necessário para angariar votos com os sócios do clube social. E mesmo que tivessem, o modelo associativo não outorga a autonomia necessária para se fazer o que precisa ser feito em um clube em situação de risco de continuidade operacional.O que foi feito no Flamengo, foi feito em outra época, com outras linhas de receita, e, principalmente em um momento em que existia uma outra realidade em termos de despesas para se tocar as atividades do clube.
P: Quem são os integrantes deste grupo?
R: O grupo é liderado pelo Marcelo Goldfarb. Os outros três membros do grupo, até que exista uma possibilidade concreta de negócio, preferem manter seus nomes em sigilo.
P: Por qual razão os outros três membros não querem aparecer neste momento?
R: Por entenderem que podem ter uma exposição desnecessária em um mundo com uma comunicação e narrativa quase sempre enviesadas.Vou te dar um exemplo para melhor entendimento: quando a notícia saiu em julho do ano passado, não sei se por mera dificuldade interpretativa ou por má intenção, muitos "entenderam" que a compra do clube seria feita pelas Lojas Marisa, empresa fundada pelo Bernardo Goldfarb, avô do Marcelo, e controlada pela família do Marcelo até hoje.Imagine se uma empresa que tem como objeto o vestuário/moda, iria ter interesse em adquirir um clube de futebol. O sujeito precisa ter muita dificuldade em interpretar texto ou ser muito mal intencionado para ter tido este entendimento.É evidente que a atuação é exclusiva do Marcelo Goldfarb, em sua pessoa física, e não da família toda e muito menos da Marisa. O Marcelo tem menos de 1% de participação na Marisa atualmente e nunca fez parte do dia a dia da gestão.O Marcelo tem cerca de outros 30 negócios, onde ele tem percentuais mais altos do que ele tem na Marisa.Daí o desconforto dos outros três membros do grupo, que são igualmente interessados pela SAF em suas pessoas físicas, mas que suas famílias também carregam sobrenomes importantes e também são controladoras de empresas enormes e listadas em bolsa de valores. E no caso destes outros três, ainda há o agravante de trabalharem no dia a dia das empresas da família, ao contrário do Marcelo.
P: Por falar em narrativa enviezada, depois que a notícia foi dada, também foi dito por alguns que o Andrés Sanchez fazia parte deste grupo ou que de alguma forma estava por trás disso. O que dizer sobre isso?
R: Esta é ainda mais risível do que a que citei há pouco.Aliás, é impressionante como as pessoas levam as narrativas para aquilo que é conveniente a elas. Eu e o Marcelo ouvimos durante anos que nós tínhamos algum problema com o Andrés ou com o grupo político ao qual ele pertence, quando tratávamos de qualquer negociação com o SCCP que não acabava da forma que o torcedor esperava. Desde o Felipe goleiro há muitos anos, até o Paolo Guerrero mais adiante.Agora, como o conveniente para quem não quer a SAF é nos associar ao Andrés, buscam fotos de 15 anos atrás para credibilizar uma narrativa para lá de desonesta.A verdade é que nunca foi uma coisa nem outra. Nunca tivemos qualquer mínimo problema com o Andrés e tampouco ele tem qualquer tipo de envolvimento nesta inciativa de SAF.Temos grande respeito por quem está hoje e por todas as pessoas que já estiveram sentadas na cadeira de presidente do clube. Mas nenhum deles faz ou fará parte deste projeto.Aliás, um dos pontos desta SAF é a proibição por governança do grupo de que qualquer ex-dirigente do clube faça parte da inciativa, seja como parte do grupo controlador ou como executivo contratado.
P: E qual o seu papel nesta história, Bruno?
R: A OTB Sports, empresa de agenciamento a qual sou um dos donos junto com o Marcelo Goldfarb, foi contratada para conduzir as conversas com o clube. Fomos "mandatados" para tentar fazer o negócio acontecer.Aliás, esta é outra explicação importante. Falei há pouco sobre "interpretações" equivocadas ou mal intencionadas, e outra delas foi a de que a compra seria feita pela OTB Sports. Imagine se uma empresa de agenciamento de atletas, cujo seu valor de mercado, segundo nossa última avaliação independente, representa cerca de 1/6 da dívida do clube, seria capaz de adquirir um ativo como este.Isto sem falar em um claro e óbvio conflito de interesses.
P: A questão do conflito de interesses é um ponto que precisa ser abordado. Como o Marcelo Goldfarb faria para equilibrar a participação em uma empresa de agenciamento e a gestão do clube, sem gerar desconfiança por parte do torcedor?
R: Já existe um acordo formalizado entre mim e o Marcelo, que em caso de negócio concretizado com o clube, eu efetuarei a compra do percentual dele na OTB. Este documento será público tão logo, a compra do clube aconteça.Além disso, a OTB estará proibida formalmente de fazer novos negócios com o SCCP por um prazo de cinco anos contados da assinatura da SAF.E por fim, a remuneração da OTB na intermediação da compra da SAF será paga exclusivamente pelo grupo de investidores, sem que saia um centavo do clube. Todos estes documentos serão divulgados publicamente.E ao invés de pensarmos em um conflito de interesses, que já expliquei que não existirá, deveríamos enxergar o ganho que o clube teria com isso. Veja a dificuldade histórica que pessoas do mundo corporativo, sem experiência com futebol, carregam ao sentar em uma cadeira do nosso mercado. Não vou citar nomes aqui por uma questão ética, mas é uma lista quilométrica. O futebol, assim como outros mercados, tem suas especificidades, demora para você conseguir entender o mecanismo. E o Marcelo Goldfarb, com seus 25 anos de experiência no futebol, não terá este problema. Irá conseguir aliar a enorme experiência corporativa a toda experiência do futebol e colocar a serviço do clube.
P: Já houve contato com o Corinthians?
R: Sim, almoçamos com uma pessoa que tinha voz ativa nas decisões da atual gestão, que por razões éticas, e por confiança e respeito mútuo com esta pessoa com a qual tenho anos de relacionamento, prefiro guardar o nome.
P: E houve alguma evolução?
R: Ele foi claro no sentido de que não há interesse do atual presidente em seguir para uma SAF neste momento. A partir de então, esperamos acabar o 2º semestre, em respeito a situação do clube, que ainda corria risco no Campeonato Brasileiro, e também o Campeonato Paulista deste ano, e agora vamos buscar esta retomada.Caso essa negativa se mantenha, vamos buscar outros caminhos que viabilizem a operação.O fato é que agora somos uma terceira via clara. E a única realmente independente. Existe a situação, a oposição, e agora o grupo pró-SAF.E esperamos que tenhamos concorrência de outros grupos pró-SAF. Que estes apresentem seus projetos e que o melhor para o clube seja escolhido. Me refiro a grupos reais e não a estas invenções de Fundos Arábes que são tão fantasiosas que é inacreditável que tenha quem acredite. Grupos com empresários de verdade e que tenham as mesmas condições que o grupo que represento de transformar o clube na maior potência da América. Faço este "convite", porque como disse no começo da entrevista, não se trata de fome de poder, e sim de quatro apaixonados pelo clube que não aguentam mais ver a instituição se arrastando.
P: Você há pouco citou uma cláusula da proposta, que veta a presença de ex dirigentes. Você pode detalhar um pouco mais a proposta?
R: A proposta, além da proibição de qualquer pessoa que teve cargo estatutário no clube em fazer parte da SAF, prevê outros inúmeros tópicos, sendo os principais: a resolução integral da divida do clube, abertura de capital na bolsa de valores para compra de parte das ações pelos torcedores, e um montante de investimento bem alto, destrinchado em várias partes. Uma destas partes é a obrigatoriedade dos donos da SAF em prover recursos suficientes para que o clube tenha absolutamente todo ano a maior folha de pagamento do futebol na América do Sul. O que fará o clube contratar alguns Memphis Depay's, mas sem passar pelo constrangimento de estar devendo ao resto do mundo ao mesmo tempo.
P: Não existe outra forma de ajudar sem ser adquirir o controle do clube, caso o Corinthians teime em seguir seu atual caminho?
R: Não existe. No atual modelo de gestão, o dinheiro escorre pelo ralo. O apoiador perde o valor que colocar e o clube não sai do buraco. A dívida precisa ser liquidada na íntegra, essa é a única forma de o Corinthians parar de tentar viver uma realidade que não é a dele. No atual contexto, em breve os principais jogadores começarão a ser vendidos por valores abaixo de mercado e sem a reposição adequada, para que se consiga saldar compromissos feitos sem a real condição de fazê-los. Prática esta já utilizada há décadas. Nenhum bom time do Corinthians foi mantido por sequer mais de dois anos seguidos desde que comecei a acompanhar futebol há cerca de 35 anos. Me lembro de ver aquele time do meu pai (Mário Sérgio Pontes de Paiva) de 1993, com invencibilidade recorde, e que no ano seguinte o clube não teve caixa para comprar Rivaldo junto ao Mogi-Mirim, ao final do empréstimo. Apesar da contundente indicação de meu pai em adquirir Rivaldo, a diretoria foi buscar o Souza no Rio Branco, que era uma operação mais barata, era a contratação que cabia no bolso. O restante da história todos já conhecem: Rivaldo foi adquirido pela Parmalat, à época patrocinadora do Palmeiras, por algo em torno de R$ 2,4 milhões, naquele mesmo ano de 94 foi protagonista de título nacional contra o próprio Corinthians e se tornou um dos maiores jogadores da história do futebol brasileiro.Estamos falando de 1993/1994 e o modus operandi seguiu idêntico ao longo dos anos. Veja por quantos desmanches o clube passou ao longo do tempo.Um projeto como este que represento, iria propiciar elencos incomparavelmente mais fortes e perenes, sem que o clube viva um eterno recomeço.
P: O que você acha do processo que corre para o impeachment do presidente Augusto Melo, que voltará a ser votado no próximo dia 26?
R: A resposta é simples: tirar o Augusto para colocar quem? Certamente alguém a quem estarão pedindo a cabeça em poucos meses. Até que algo fique provado contra ele, o impeachment só tornará o ambiente político do clube mais instável e o clube ainda menos crível perante ao mercado.
P: Mas e agora com as contas reprovadas por uma dívida enorme feita em apenas um ano de gestão?
R: Eu não tenho subsídios técnicos para opinar. Precisaria me debruçar no balanço e no estatuto. Qualquer opinião em relação a isso seria "chute". Mas repito: seria com o Augusto, com o Zé, com o João…. o presidente que sentar nesta cadeira no atual modelo associativo só irá aumentar a dívida e não competirá esportivamente à altura do que o clube merece.
P: Se o objetivo é o de "salvar o Corinthians", podemos dizer que não existe chance alguma do grupo partir para compra de uma outra SAF no Brasil?
R: Eu bem que tentei… Como sei que o nome que o Marcelo Goldfarb quer para CEO da SAF do Corinthians é o Marcelo Paz, tentei levar a ideia para o Fortaleza.
O Goldfarb vive dizendo que acha o Marcelo Paz o maior dirigente do futebol brasileiro, então confesso que tentei levar o negócio para lá…
P: E não evoluiu?
R: Tenho um compromisso assinado que não me permite destrinchar o assunto. Mas é óbvio que tenho a total consciência do nível de dificuldade de convencer quatro apaixonados a mudarem a rota desta forma. Teria que antes de qualquer coisa convencê-los a fazer um negócio na acepção da palavra, que como já expliquei não é o que os motiva.Seria muito bacana ver o Marcelo Goldfarb e o Marcelo Paz atuando juntos. Estivemos jantando recentemente e você vê pelo nível da troca de ideias que é uma dupla capaz de contribuir muito para transformação e profissionalização do nosso futebol. O Paz é sem dúvida um dos dirigentes mais competentes que conheci nos meus 25 anos de trajetória no futebol. Mas, como já disse, tenho total consciência da enorme dificuldade em fazer isso acontecer. Pelo menos agora no Fortaleza.
P: Para finalizar, algum recado pro torcedor que tem no assunto SAF um debate tão intenso?
R: Falar apenas que o torcedor que não tem familiaridade com negócios e acompanha apenas futebol, não tem ideia do quanto o clube é mal tratado, sem qualquer tipo de exagero, desde a sua fundação. O Corinthians é uma força da natureza. Qualquer outro clube que tenha passado por tantas gestões caóticas como o Corinthians, não seria capaz de se manter de pé. E se mantém única e exclusivamente em função do engajamento do torcedor.Este mesmo torcedor, que tem sido extremamente mal tratado nos últimos tempos e que não tem ninguém olhando por ele. O lamentável episódio do Maracanã há algumas semanas é prova disso.Tem tanto a ser feito e tanta possibilidade de se fazer, que será uma pena muito grande se esta união não acontecer.Os membros do grupo consomem SCCP em todas as frentes (Meu Corinthians BMG, Fan Token sócios.com e tudo mais que o Corinthians lança ou licencia….) e vivem reportando, por exemplo, como estes produtos são todos inclassificáveis de ruins… fontes de receitas importantes jogadas fora por serem concebidas por pessoas sem a menor condição de estrutura-las. E isso é só um pingo em um oceano. Estas pessoas são realmente capazes de gerar riqueza e administra-las com uma capacidade ímpar.Por fim, conheço o clube mais do que muito torcedor fanático. Frequentei o SCCP por meses diariamente com meu pai (Mário Sérgio Pontes de Paiva) nas passagens dele como treinador, e sei da força incomensurável da torcida e da marca. Seria uma união praticamente imbatível uma torcida tão atuante e apaixonada como essa, com um grupo tão preparado para fazer a instituição atingir seu potencial máximo.
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