Sobre as condições dos maiores negócios envolvendo as SAFs
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Sobre as condições dos maiores negócios envolvendo SAF´s: mais um levantamento do IBESAF
POR RODRIGO R. MONTEIRO DE CASTRO
O IBESAF - Instituto Brasileiro de Estudos e Desenvolvimento da Sociedade Anônima do Futebol promoveu levantamento com o propósito de mapear as condições mais relevantes de operações societárias que envolveram determinados clubes e suas SAF's. Nesse primeiro ensaio, embrião de futura pesquisa que deverá abraçar todas as operações ocorridas em times das séries A a D do campeonato brasileiro de futebol, foram selecionados sete casos: (i) Associação Portuguesa de Desportos; (ii) Botafogo de Futebol e Regatas; (iii) Club de Regatas Vasco da Gama; (iv) Clube Atlético Mineiro; (v) Coritiba Foot Ball Club; (vi) Cruzeiro Esporte Clube; e (vii) Esporte Clube Bahia.
Escolheram-se, inicialmente, três aspectos principais para catalogação e consolidação: (i) tipo de operação (algo que já constara da 2ª Pesquisa do IBESAF, cujo resultado foi publicado neste espaço); (ii) condições gerais da operação; e (iii) tratamento/destinação de equipamentos esportivos, como estádios e centros de treinamento.
Os pesquisadores João Vítor Codelo e Iago Espírito Santo acessaram e utilizaram apenas informações públicas, disponíveis a qualquer pessoa, em sítios e mídias dos próprios clubes envolvidos e na imprensa em geral. Não consultaram, portanto, qualquer documento celebrado pelas partes envolvidas nas operações e, por enquanto, também não formularam perguntas para esclarecimentos dos clubes ou investidores.
A técnica empregada não compromete o resultado, ao contrário, pois os pesquisadores se depararam com um conjunto informacional relevante e coerente, entre as diversas fontes públicas acessadas.
O resultado obtido, ainda que a partir de uma base relativamente pequena, porém, envolvendo clubes expressivos e as sete maiores negociações realizadas com base na Lei da SAF, já indica a recorrência de algumas práticas jurídicas e negociais, que podem servir como referências, positivas ou negativas, conforme o caso, e adaptáveis, ou não, a situações futuras.
Destaca-se que a transferência de ativos do clube para a SAF se operou, em todos os casos, via drop-down. A coincidência, por razões jurídicas já explicadas neste espaço em textos anteriores, para por aí.
Em relação aos outros dois quesitos, há, sim, recorrência, mas o resultado, plotado abaixo, indica que as modelagens atendem às características do clube, ao perfil do investidor e à combinação, ou não, do negócio esportivo com o imobiliário - negócio esse que, em regra, costuma extrapolar o interesse apenas futebolístico e tratar o equipamento esportivo como uma unidade específica de negócios a desenvolver.
Além disso, a inclusão do centro de treinamento, local que, ao contrário do estádio ou arena, costuma ter finalidade única, também varia em função das perspectivas econômicas do negócio.
Destaca-se, por fim, a reprodução de uma prática inaugurada no caso Cruzeiro, consistente na apropriação, como parcela do preço de aquisição, de montantes que não são providos diretamente pelo investidor (ou adquirente), mas provenientes de receitas futuras, auferidas pela SAF. É o que se passou a chamar de receita incremental.
Tal estrutura parte da estipulação de valores de referência de determinadas linhas de receitas (tais como patrocínio, negociação de jogador e naming rights), que coincidem com as mesmas linhas de receitas auferidas pelo clube antes da realização do negócio, e reconhece, como incremento viabilizado pela SAF (ou pela estrutura do investidor), os montantes que excederem aquelas referências. O excesso é deduzido do preço de aquisição (ou subscrição). Sob outro ângulo, o excesso é considerado parte do preço e redutor da obrigação de aporte pelo investidor.
Eis a consolidação das informações:
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Clube
SAF
Tipo de Operação
Tratamento do Estádio/CT
Condições Gerais da Operação
1) Associação Portuguesa de Desportos
Portuguesa Sociedade Anônima do Futebol
Drop Down - Art. 3° da Lei da SAF
O Estádio do Canindé não teve a sua propriedade transferida para a SAF, mas sua reforma e posterior gestão/exploração serão realizadaspela SAF (em especial por uma das acionistas do Investidor). Além disso, o CT é de propriedade do governo estadual e o termo de permissão de uso deve ser objeto de cessão para SAF.
Alienação de 80% das ações da SAF para o Investidor. O Investidor se comprometeu a investir até R$ 1,2 bilhão no clube, da seguinte forma: (i) R$ 450 milhões para quitação da dívida do clube (cujo valor deve ser reduzido no âmbito da recuperação judicial); (ii) R$ 500 milhões para o Estádio do Canindé; e (iii) R$ 263 milhões* para o departamento de futebol, com desembolsos ao longo de cinco anos (2025 a 2029), divididos da seguinte forma: (iii.i) R$ 44 milhões para o futebol de base; (iii.ii) R$ 50 milhões para contratação de jogadores; (iii.iii) R$ 18 milhões para o CT; e (iii.iv) R$ 144 milhões para a folha salarial dos cinco anos.
*Não há informação sobre o enquadramento dos R$ 263 milhões em receita efetiva ou receita incremental.
2) Botafogo de Futebol e Regatas
S.A.F. Botafogo
Drop Down - Art. 3° da Lei da SAF
Não envolveu a transferência de estádio, mas houve a cessão da posição contratual da concessão do Estádio Nilton Santos, do clube para a SAF.
Alienação de 90% das ações da SAF para o Investidor, ao preço de R$ 400 milhões: (i) R$ 50 milhões oriundos de mútuo celebrado antes do fechamento da operação; e (ii) R$ 350 milhões ao longo de 4 anos (R$100 milhões em 2022; R$ 102,2 milhões em 2023; R$ 113,9 milhões* em 2024; e R$ 50 milhões em 2025). Há informações de que o Investidor tenha realizado outros investimentos na SAF para além dos valores acordados.
3) Club de Regatas Vasco da Gama
Vasco da Gama Sociedade Anônima do Futebol
Drop Down - Art. 3° da Lei da SAF
Não envolveu a transferência do Estádio, que foi alugado em conjunto com um dos centros de treinamento. O outro centro está vinculado à prefeitura e há previsão de assinatura de termo de permissão de uso.
Alienação de 70% das ações da SAF para o Investidor, por R$ 700 milhões, sendo: (i) R$ 70 milhões referentes à conversão de mútuo; e (ii) R$ 630 milhões ao longo de 4 anos (R$ 120 milhões em 2022; R$ 120 milhões em 2023; R$ 270 milhões em 2024; e R$ 120 milhões em 2025).
4) Clube Atlético Mineiro
Atlético Mineiro S.A.F.
Drop Down - Art. 3° da Lei da SAF
A Arena MRV e a Cidade do Galo (CT) foram transferidas para a SAF.
Alienação de 75% das ações da SAF para o Investidor, com aporte inicial de R$ 913 milhões, sendo (i) R$ 313 milhões para conversão de dívida da Arena MRV; e (ii) R$ 600 milhões em novos recursos. Além disso, a SAF assumiu dívidas do Clube, que somavam, à época, aproximadamente R$ 2,1 bilhões.
5) Coritiba Foot Ball Club
Coritiba Sociedade Anônima do Futebol
Drop Down - Art. 3° da Lei da SAF
O Estádio Couto Pereira permanece com o clube e foi cedido por 50 anos para a SAF, prorrogável por mais 50 anos. O centro de treinamento, por sua vez, foi transferido para a SAF. Está no âmbito do acordo a construção de um novo CT (obrigatório) e a reforma do Couto Pereira (depende de condições).
Alienação de 90% das ações da SAF para o Investidor. As ações da SAF foram adquiridas em UPI, no âmbito do processo de RJ, com o comprometimento de quitar a totalidade da dívida do clube, avaliada em R$ 270 milhões, ao longo de 10 anos.
Compromisso de investimento pelo Investidor de até R$ 1,3 bilhão, sendo: (i) R$ 100 milhões para construção do novo CT (obrigatório); (ii) R$ 270 milhões para quitação das dívidas do clube (obrigatório); (iii) até R$ 450 milhões para reforços e capital de giro, que serão utilizados ao longo de 10 anos para incremento de receita caso a atividade de futebol não atinja o orçamento mínimo (não obrigatórios, depende da receita); e (iv) R$ 500 milhões para reforma do Estádio.
6) Cruzeiro Esporte Clube
Cruzeiro Esporte Clube - Sociedade Anônima do Futebol
Drop Down - Art. 3° da Lei da SAF
Envolveu, após renegociação, a transferência dos centros de treinamento do clube para a SAF.
Alienação de 90% das ações da SAF para o Investidor, por R$ 400 milhões, sendo: (i) R$ 50 milhões em dinheiro; e (ii) R$ 350 milhões em novas receitas em até 5 anos.
7) Esporte Clube Bahia
Esporte Clube Bahia S.A.F.
Drop Down - Art. 3° da Lei da SAF
A Arena Fonte Nova pertence ao Estado da Bahia. Por outro lado, tanto a Cidade Tricolor (atual CT), quanto o antigo centro de treinamento passaram para a propriedade da SAF.
Alienação de 90% das ações da SAF para o Investidor. O Investidor se comprometeu a investir até R$ 1 bilhão no Bahia, ao longo de 15 anos, sendo: (i) no mínimo, R$ 500 milhões para contratação de jogadores; (ii) R$ 300 milhões para pagamento de dívidas; e (iii) R$ 200 milhões para infraestrutura, categorias de base, capital de giro, entre outros (único item não obrigatório).
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