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Mark Thompson/Getty Images

Di Grassi afirmou que foco é ser piloto de testes da Pirelli para voltar à F-1 em 2012

03/03/2011 - 13h00

Sem vaga, Di Grassi ataca como piloto de testes do projetista da F-1

Rafael Krieger
Em São Paulo

Após quatro temporadas na GP2 e cinco anos como piloto de testes na Renault, o brasileiro Lucas di Grassi finalmente ganhou uma vaga na Fórmula 1 no ano passado, mas não conseguiu continuar na Virgin em 2011. Com tempo livre, ele tenta se manter no meio de outra maneira, longe das pistas.

DI GRASSI E SEUS DESENHOS

É uma coisa que eu gosto de fazer, e que pode ajudar o automobilismo se for feita do jeito correto

Autor do desenho do circuito do kartódromo onde Felipe Massa organiza o Desafio das Estrelas em Santa Catarina, Di Grassi revelou em entrevista ao UOL Esporte que está trabalhando com o principal arquiteto das pistas da Fórmula 1, o alemão Hermann Tilke.

O brasileiro tem ideias para melhorar circuitos, e contribuiu para as alterações que serão feitas neste ano na pista de Abu Dhabi, muito criticada pela dificuldade para ultrapassar. Di Grassi explicou que ajuda a “mudar essas pistas que de uma forma ou de outra estão tornando a Fórmula 1 mais monótona”.

Além disso, Di Grassi confirmou que está trabalhando para conseguir uma vaga de piloto de testes na Pirelli, a fabricante de pneus da Fórmula 1, visando voltar à categoria em 2012. Ele também falou sobre a falta de apoio no Brasil e a vontade de ser dono de equipe.

Veja, em vídeo, trechos de Lucas di Grassi e, logo abaixo, o melhor da entrevista:

UOL Esporte - Quais são as suas opções no momento para tentar voltar a correr?
Di Grassi - O ano de 2011 vai ser um período de transição para mim. Corri no ano passado pela Virgin, foi uma temporada difícil, com o carro abaixo do esperado, e terminei na frente do meu companheiro de equipe. Estou reestruturando todo o meu management, tentando também achar alguma empresa parceira brasileira que queira entrar na Fórmula 1, queira apoiar os jovens pilotos, e estou muito confiante de que consigo voltar em 2012. Conseguir fazer testes pela Pirelli para fazer desenvolvimento do pneu seria muito positivo, e esse é o meu foco.

UOL Esporte - Outras categorias, nem pensar?
Di Grassi - Tenho interesse. A Indy está passando por um processo de reestruturação, acabaram de anunciar uma corrida em Lãs Vegas que pode valer US$ 5 milhões, estão entrando mais equipes tentando mudar o formato. A Nascar também é uma categoria legal, que tem muito público, é muito diferente da Fórmula 1, mas com as suas qualidades. Quem sabe Le Mans, DTM, existem tantas categorias top... Lógico, Fórmula 1 é o objetivo principal, é o top que pode acontecer, mas me vejo no futuro em outras categorias. Mais no futuro, eu acho que a Stock Car no Brasil é um excelente caminho de volta aqui para a minha terra natal, que é onde eu quero morar para o resto da minha vida. Não quero morar na Europa para sempre.

UOL Esporte - Depois de perder a vaga por falta de patrocínio, você acha que seria o momento oportuno de a Petrobras voltar à Fórmula 1 apoiando algum piloto, ou outra grande empresa?
Di Grassi - Sem dúvida, existem várias empresas no Brasil que têm capacidade e qualidade para estar na Fórmula 1, que reúne as maiores empresas e o maior nível de exposição do mundo, maior do que qualquer outro esporte. Existem inúmeras empresas no Brasil que poderiam me ajudar, ajudar os outros pilotos. Não só chegando na Fórmula 1, mas também chegando nas categorias de base, os pilotos que estão tentando seguir carreira e têm talento, mas não têm suporte financeiro. O automobilismo é um esporte caro, a Fórmula 1 é mais cara ainda.

UOL Esporte - Por tudo isso, você acha que está mais difícil para os pilotos brasileiros chegarem à Fórmula 1?
Di Grassi - Sim, acho que a gente corre um risco de nos próximos anos ter uma queda drástica no número de pilotos brasileiros na Fórmula 1, e se não houver um reajuste de estratégias das empresas brasileiras, quem sabe a gente pode ter um período na Fórmula 1 sem nenhum piloto brasileiro. A gente tem grandes pilotos lá hoje em dia, o Rubinho e o Massa têm total capacidade de continuar por mais alguns anos, mas a gente nunca sabe o que pode acontecer. Estou lutando para voltar, e fico me esforçando 24 horas do meu dia para conseguir esse lugar na Fórmula 1 de volta, porque acho que mereço estar lá por uma equipe em que eu possa mostrar meu trabalho.

ABU DHABI TERÁ MUDANÇAS

 
  • A pista de Yas Marina, em Abu Dhabi, decidiu o título do ano passado em uma prova que consagrou Vitaly Petrov, que ficou na frente de Fernando Alonso e impediu o título do espanhol.

    Para tentar amenizar essa dificuldade para ultrapassar em Yas Marina, Di Grassi ajudou a desenvolver algumas mudanças na pista.

    “Mudarão as curvas que antecedem a reta principal de 1,1 km, que é o principal ponto de ultrapassagem. Vai ser uma mudança mais geométrica na pista, para dar aos pilotos a chance de escolher um traçado”, explicou o ajudante de Hermann Tilke.

UOL Esporte - O que você faz nesse período em que você está sem correr?
Di Grassi - É um período complicado, mas continuo andando de kart toda semana, vou para a academia duas vezes por dia e seis vezes por semana, fazendo preparo físico tanto do pescoço quanto da parte aeróbica. Quem sabe faço algumas corridas nesse ano, experimento outras categorias para saber exatamente para que lado ir, mas mantendo o foco 100% na Fórmula 1. Se eu conseguir fazer alguns testes com a Pirelli, vai ser fundamental. Um dos meus focos é continuar ativo para conseguir essa vaga em 2012.

UOL Esporte - Como foi a sua saída da Virgin? Explicaram a situação, falaram para você que foi por falta de dinheiro?
Di Grassi - A conversa foi muito simples, desde quando o contrato foi assinado eu sabia que sem o patrocínio seria difícil a minha continuação. Isso eles não precisaram me falar, já estava escrito desde o começo. Tentei renovar o patrocínio, tentei achar outras empresas, mas não aconteceu. O que eu posso fazer? Fiz todo o meu trabalho do melhor jeito que eu poderia, e agora tenho que lutar mais uma vez para tentar voltar à Fórmula 1.

UOL Esporte - Você ainda fala com o pessoal da Virgin?
Di Grassi: Minha relação com a Virgin ainda continua muito boa, eles gostaram muito do meu trabalho, e ainda sou muito próximo deles. Inclusive eu converso sobre o carro deste ano, de uma maneira informal, mas tento manter essa boa relação que eu tive durante o ano passado. Eu que fiz todo o desenvolvimento do simulador, de toda a parte virtual da equipe, e grande parte do desenvolvimento do carro na pista. Então eu conheço melhor do que ninguém o que está acontecendo lá dentro.

UOL Esporte - Em uma equipe menor há mais descontração? É verdade que você foi guia noturno da Virgin no GP do Brasil?
Di Grassi - Não, não procede isso, não fui guia nenhum. E não existia brincadeira. O nível de seriedade da Virgin era o mesmo. Lógico que existem os momentos de descontração, quando a gente ia jantar, ou estava fora da pista, mas quando o trabalho tinha que ser feito, acho que os mecânicos da Virgin se esforçavam tanto quanto ou mais que os de qualquer outra equipe.

DI GRASSI E O JOGO DE EQUIPE NA VIRGIN

  • Houve favorecimento a Timo Glock?

    Sem dúvida, no começo ele estava liderando o desenvolvimento porque já tinha experiência. Mas isso se reverteu ao longo do ano, e inclusive eu terminei na frente dele. Não é jogo de equipe, porque a equipe é obrigada a escolher, em algum momento do campeonato, um piloto em que ela tem que apostar. Isso é totalmente reversível, como foi no meu caso. É natural, e faz parte do esporte.

UOL Esporte - Você se considera melhor do que o Jerome D’Ambrosio, que ficou com a sua vaga na Virgin?
Di Grassi - Acho que essa resposta eu não preciso dar. Quem quiser ver, pode olhar os fatos dos três anos que a gente disputou em GP2. Eu disputei três anos em três equipes diferentes, e ele também. [Nota da redação: Di Grassi foi 17º em 2006, vice-campeão da GP2 em 2007 e terceiro colocado nos dois anos seguintes; D’Ambrosio tem um nono lugar como melhor posição]

UOL Esporte - Você chegou a se irritar com o carro da Virgin, porque pifava ou não andava?
Di Grassi - Não, se irritar é para quem não é profissional. Você pode ficar frustrado, chateado, mas tem que focar no seu papel, que é pilotar e desenvolver o carro, e fazer o que pode fazer. Se o tanque de combustível não era suficiente para completar uma corrida no começo do campeonato, ou se existiam várias falhas mecânicas que fizeram a gente abandonar em posições muito boas durante o ano, acontece. Inclusive eu errei também, em uma ou duas corridas. Não tem muito que fazer, tem que manter o foco e continuar.

UOL Esporte - Você cresceu mais como piloto de testes da Renault ou como piloto da Virgin?
Di Grassi - Acho que é um processo de aprendizado, não posso falar que um ano de faculdade é melhor do que três anos de colégio. Não se compara uma coisa com a outra. Fiz o meu trabalho na Renault da melhor forma possível, fui considerado dentro da equipe, passei por um processo de evolução, da mesma forma que na Virgin. Os dois lados têm seus retornos e seus benefícios.

UOL Esporte - Na época em que você era piloto de testes da Renault, chegou a se comentar que você estava ameaçando a vaga do Nelsinho Piquet...
Di Grassi - Independente se a vaga era de um piloto ou de outro, eu estava sempre tentando subir, dar o próximo passo dentro da equipe. Fiz o possível para conseguir correr pela Renault. Por uma série de fatores que não vêm ao caso, eu não consegui. Mas, no ano seguinte, eu fui para a Virgin, então isso não causou nenhum problema. Sou super grato à Renault por ter me dado a oportunidade de ter estado nesses anos com a equipe. De repente, no futuro, quem sabe, exista uma oportunidade de eu correr para eles.

UOL Esporte - Você chegou a projetar um circuito em Florianópolis, onde acontece o Desafio das Estrelas de kart. Como você entrou nessa?
Di Grassi - Projetei o circuito inteiro no papel, desenhando, e depois pedi conselhos do Felipe [Massa], e de outros pilotos. A gente acabou fazendo um circuito em que deu tudo certo, o pessoal adorou o traçado, foi muito elogiado pelo [Michael] Schumacher. Tenho interesse, inclusive neste ano estou trabalhando um pouco em parceria com o [Hermann] Tilke em alguns projetos, para dar o meu feedback como piloto, do que eu acho que é legal ou não é, e tentar mudar essas pistas que de uma forma ou de outra estão tornando, ou podem tornar a Fórmula 1 mais monótona.

 

QUEM É HERMANN TILKE

  • Autor de todos os circuitos recentes da Fórmula 1, o arquiteto alemão Hermann Tilke tem a confiança do chefe da categoria, Bernie Ecclestone, que prefere recorrer sempre a ele na hora de pensar em novas sedes para o campeonato.

    A pista da Índia, que vai estrear neste ano, é de sua autoria. Assim como a da Coreia, que entrou no calendário no ano passado.

    Os circuitos do Bahrein, China, Malásia, Turquia, Cingapura, Valência, Abu Dhabi e até o de Austin, que ainda nem foi construído, também estão no seu currículo.

    Suas pistas passaram a ser conhecidas como "tilkódromos", pela dificuldade de se ultrapassar e pela semelhança entre elas.

UOL Esporte - Você participou das mudanças que serão feitas no circuito de Abu Dhabi?
Di Grassi - Participei. Houve uma reunião, cada um deu a sua opinião, e eu dei a minha opinião sobre o que deveria ser feito também. É uma coisa que eu gosto, então estou trabalhando junto com ele, quando tenho tempo, nessa área de consultoria do lado da pilotagem nas pistas.

UOL Esporte - Então, enquanto você ainda não é piloto de testes da Pirelli, pode ser considerado piloto de testes do Hermann Tilke?
Di Grassi - É, eu acho que é uma área de trabalho que ocupa muito pouco do meu tempo, talvez uma ou duas horas por semana, não é nada demais. É uma coisa que eu gosto de fazer, e que pode ajudar o automobilismo se for feita do jeito correto, então só vejo como positivo para mim o fato de ter esse contato direto com o Tilke.

UOL Esporte - Você acha que isso pode ajudar na sua carreira?
Di Grassi - Não, acho que a carreira como piloto não tem nada a ver com a carreira como projetista de pista. Quem sabe no futuro eu possa ter alguma coisa relacionada com projetos de pista, mas no momento o foco é correr, que é o que eu gosto.

UOL Esporte - Mas conhecer as pistas e ser próximo ao Hermann Tilke não pode ser visto como uma vantagem pelas equipes?
Di Grassi - Não, nada a ver com o Tilke. Acho que você entender a pista, ter a capacidade de pensar algumas linhas de trajetória, pode dar benefício em uma curva ou outra. Mas não acho que seja uma vantagem grande o suficiente para fazer alguma diferença.

UOL Esporte - Você é o único piloto que trabalha com ele?
Di Grassi - Não, os pilotos dão opinião o tempo todo. De uma forma mais detalhada, pode ser que eu seja o único, porque hoje em dia eu tenho essa capacidade e esse tempo hábil para fazer isso. Mas, de uma forma geral, acho que todos os pilotos, durante o circuito, dão as opiniões sobre o que cada um acha sobre as pistas.

UOL Esporte - Você já falou em ser dirigente ou dono de equipe no futuro. Acha que um projeto como esse poderia ser feito aqui mesmo no Brasil?
Di Grassi - Acho que o Brasil tem capacidade de ter uma equipe de Fórmula 1, tem público que gosta, muita gente do Brasil adora carro e adora a Fórmula 1. Mas, ao mesmo tempo, o centro do automobilismo é na Inglaterra, é difícil você competir com eles lá. Mas, quem sabe... Sou sócio hoje de uma equipe de GP3, tentando conseguir subir para ser uma equipe de GP2, e quem sabe no futuro ser dono ou estar dentro de uma equipe de Fórmula 1, na parte gerencial, e não de pilotagem. Isso é bem mais para o futuro.

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