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Lito Cavalcanti

Alguém vai passar vergonha neste fim de semana

Charles Leclerc, da Ferrari, durante o GP dos Estados Unidos, em Austin - Clive Mason/Getty Images/AFP
Charles Leclerc, da Ferrari, durante o GP dos Estados Unidos, em Austin
Imagem: Clive Mason/Getty Images/AFP

11/11/2019 12h31

Palco de competições do mais alto nível na pista, Interlagos verá as atenções divididas entre a pista e o paddock. Nestas disputas estarão envolvidas as três grandes equipes: Ferrari, Mercedes e Red Bull.

O tema é o desempenho dos carros de Maranello no GP dos Estados Unidos, duas semanas atrás, mais uma vez o centro de suspeitas das adversárias. Naquele fim de semana, a Red Bull encaminhou à FIA um pedido de esclarecimento que teve como resposta uma normativa técnica que declarava ilegal qualquer sistema que burle intencionalmente a medição do fluxo de combustível enviado para o motor de um carro de F-1.

A suspeita da Red Bull (que tem pleno apoio da Mercedes) é a enorme velocidade que os carros da Ferrari desenvolvem nas retas, o que significa, em média, uma vantagem de sete a nove décimos de segundos. Quase sempre derrotada nas provas de classificação e nas corridas ao longo do ano, a equipe austríaca apresentou um questionamento à FIA sobre a legalidade de se usar um artefato elétrico capaz de anular por curtíssimos espaços de tempo a medição do fluxo, evitando a detecção de um acréscimo da gasolina enviada para o motor e aumentando momentaneamente sua potência.

A resposta da FIA esclareceu que qualquer tentativa neste sentido seria ilegal - mas não apontou culpados. Isso, porém, não impediu que as más línguas, incentivadas por declarações de membros da Red Bull e da Mercedes, insinuassem que a suposta irregularidade seria a causa do fraco desempenho da Ferrari nos Estados Unidos. Max Verstappen foi mais longe, dizendo com todas as palavras que a Ferrari vinha trapaceando nas etapas anteriores.

O argumento se referia à atuação de Charles Leclerc na corrida - sem considerar que um vazamento de óleo havia forçado a troca de seu motor da Geração 3 por um da Geração 2, que desenvolve 10 cavalos a menos. Para piorar a situação, esse motor já tinha quilometragem avançada e só deveria ser usado nos treinos livres. Com ele, o piloto de Mônaco foi o quarto no grid e chegou ao final na mesma posição, a quase um minuto do vencedor, Valtteri Bottas.

A Ferrari argumentou que não era o desempenho de Leclerc que devia ser usado como parâmetro, e sim o segundo tempo de Sebastian Vettel na prova de classificação, quando ficou a apenas 0s012 (doze milésimos de segundo) da pole position de Bottas. E que a vantagem nas retas havia caído dos habituais 7 a 9 décimos de segundo para apenas 3 porque seus engenheiros adotaram uma maior inclinação do aerofólio traseiro, que aumentava a resistência do ar nas retas em troca de melhor aderência nas curvas.

De pouco adiantou. Preferiu-se dar ouvidos às acusações de burla à medição de fluxo. Esse sistema mede a quantidade de gasolina que passa dentro de um tubo em um determinado espaço de tempo. Sensores dispostos no começo e no fim de um tubo emitem sinais ultrassônicos intervalados, permitindo a medição de quantos centímetros cúbicos de gasolina passam pelo tubo entre um sinal e outro.

Além de forçar uma competição entre os fabricantes de motores no sentido de extrair a melhor eficiência possível com a mesma quantidade de combustível, o sistema também evita que os pilotos poupem combustível na parte inicial das corridas, que assim se tornariam competições de economia, não de velocidade. Com a limitação do fluxo, de nada serviria ter combustível de sobra na fase final para só então acelerar a fundo.

Outras suspeitas não deram em nada

Não é a primeira vez que a Casa de Maranello é vítima dessas suspeitas. No ano passado, o alvo era o sistema de baterias gêmeas usado pela Ferrari; nenhuma irregularidade foi achada pela FIA. Veio à tona então a hipótese de uma mistura de óleo ao combustível que aumentaria sua capacidade calorífica, transformando-a em uma super hiper gasolina. Mais uma vez, nada foi provado.

Agora, porém, a Red Bull fez estudos e testes detalhados com um sistema capaz de silenciar os sinais ultrassônicos enviados pelo medidor. Nesses segundos de "silêncio", o fluxo seria aumentado e proporcionaria acelerações ainda mais fortes e velocidades ainda mais altas.

Indignado, o chefe da Ferrari, Mattia Binotto, descartou toda e qualquer palavra neste sentido. Segundo ele, os engenheiros receberam a nona normativa, leram e guardaram em uma gaveta. Absolutamente nada teria sido mudado em seus carros e o desenrolar da corrida teria sido muito diferente não fossem os problemas de Leclerc e a quebra da suspensão que fez Vettel abandonar na sétima volta.

Era tanta sua irritação que o normalmente cavalheiresco Binotto chegou a dirigir palavras pouco amistosas ao chefe da Red Bull, o inglês Christian Horner. Ironicamente, pesa sobre as costas de Horner a desclassificação de seu piloto Daniel Ricciardo do segundo lugar no GP da Austrália de 2014 - por desrespeito ao limite do fluxo de gasolina...

Da Junção ao "Esse" do Senna, a verdade

Desde as primeiras voltas em Interlagos, na manhã da sexta-feira, olhos e cronômetros estarão atentíssimos aos tempos de Vettel e Leclerc no trecho da pista que vai da curva da Junção à freada do Esse do Senna. Longo e em subida, ele exige toda a potência dos motores.

A resposta definitiva virá na prova de classificação, mais especificamente na sua terceira fase, o Q3. É nela que os carros estarão nas condições ideais: com o mínimo possível de combustível e com pneus novos, do tipo que dá maior aderência e tração.

Sobre os pilotos não pairam dúvidas: Vettel, Hamilton e Bottas detêm pole positions no circuito paulistano. Leclerc não, mas é o piloto que mais vezes largou em primeiro neste ano. De Max Verstappen não se espera mais do que a segunda fila no grid. Mas depois da quase vitória de 2018, desperdiçada no choque com Esteban Ocon, não seria prudente descartar qualquer surpresa.

No fim da tarde, um desses dois chefes de equipe terão motivos para se orgulhar ou para se envergonhar do que fizeram e disseram. Já Toto Wolff, o chefe da Mercedes, preferiu não vir ao Brasil. Será sua primeira ausência de um GP desde 2013 - ele a explica pela necessidade de cuidar de assuntos importantíssimos relativos à sua equipe.

Seria extremamente leviano dizer que a verdadeira motivação dessa ausência seria evitar eventuais perguntas desconfortáveis...