Topo

Lito Cavalcanti

Alemanha, um GP decisivo para muita gente

Sebastian Vettel em Silverstone - Andrej Isakovic/AFP
Sebastian Vettel em Silverstone Imagem: Andrej Isakovic/AFP

22/07/2019 12h10

O Grande Prêmio da Alemanha, neste próximo fim de semana, marcará a metade da temporada. Será o 11º dos 21 que compõem um campeonato que, a não ser por uma reviravolta das mais intensas, já tem primeiro e segundo colocados, mais precisamente os pilotos da Mercedes, Lewis Hamilton e Valtteri Bottas.

Os holofotes, porém, estarão firmemente focados nos pilotos de outra equipe, a Ferrari, por motivos opostos. De um lado, o jovem Charles Leclerc em plena ascensão; do outro, o veterano Sebastian Vettel, que vive a pior fase de sua longa, e até recentemente, triunfante carreira.

Não vem de hoje a crise que Sebastian Vettel está enfrentando. O primeiro sinal veio no GP do Azerbaijão de 2017. Irritado com o que interpretou como provocação de Hamilton, ele colocou sua Ferrari ao lado da Mercedes do inglês e a abalroou. Os comissários lhe impuseram uma parada nos boxes de 10 segundos e ele terminou em quarto uma corrida em que, por momentos, lutava pela vitória. O caso, esquecido até o último GP da Alemanha, voltou à tona quando ele errou bisonhamente uma freada e deixou a vitória (e o pentacampeonato) nas mãos de Hamilton, seu único adversário real na luta pelo título de 2018.

Outros momentos infelizes se seguiram: a rodada depois de uma colisão leve com Hamilton em Monza; a rodada em uma disputa com Daniel Ricciardo nos Estados Unidos; a colisão com Max Verstappen no Japão; a rodada inexplicável no GP do Bahrein desse ano ao tentar retomar uma posição de Hamilton; a saída de pista que lhe valeu a punição no GP do Canadá; e agora a batida em Verstappen na Inglaterra.

Um total de sete incidentes inexplicáveis desde o último GP da Alemanha. Ainda assim, ele retém o posto de primeiro piloto da Ferrari, que dispõe em Leclerc de um piloto mais rápido e, pelo menos nas últimas provas, mais eficiente. Por isso, a Casa de Maranello vem sofrendo duras críticas por parte não só da passional imprensa italiana.

Luca Baldisserri, que foi engenheiro chefe de pista nos tempos de Michael Schumacher, propagou aos quatro ventos que Vettel é superestimado e deveria estar a serviço de Leclerc, como Kimi Raikkonen esteve para ele até o ano passado.

Criador da Academia Ferrari, onde se aperfeiçoam os jovens em que Maranello vislumbra mais potencial, Baldisserri tem ampla experiência na parte psicológica dos pilotos. Talvez tenha razão ao apontar a saída do foco como o remédio ideal para este momento de Vettel.

O tetracampeão, porém, prefere acreditar que é vítima da má sorte e se diz ansioso para disputar o grande prêmio do seu país. Sim, geograficamente é o grande prêmio de seu país, mas no ano passado o público presente a Hockenheim vibrou intensamente quando ele saiu da pista, abrindo caminho para a vitória e o segundo lugar da Mercedes - pelo visto, mais amada do que ele pelos alemães.

Talvez a explicação da Ferrari manter a prioridade de Vettel não esteja no campo afetivo, e sim no financeiro. Desde 2007, quando estreou na F1, até 2018, ele é o piloto que trouxe as maiores premiações para suas equipes: nada menos de 511,9 milhões de dólares, segundo a respeitada publicação Forbes. O pentacampeão Hamilton, com um total de 449,6 milhões, está bem atrás dele.

Mal ou bem, Vettel ainda soma mais pontos do que o jovem Leclerc no atual campeonato - apenas três no momento, mas ainda assim muitas vozes preveem sua recuperação - entre elas as de Hamilton e Verstappen. Hockenheim seria o palco ideal. Não precisaria nem vencer, já que as Mercedes parecem imbatíveis. Chegar em terceiro, batendo Leclerc e Verstappen, seria um ótimo recomeço.

As características da pista não são favoráveis, mas também não chegam a ser contrárias: elas exigem mais dos pneus traseiros, e por consequência protegem os dianteiros, calcanhar de Aquiles da Ferrari SF90. Por outro lado, de suas 11 curvas oito são de baixa velocidade, terreno em que a Mercedes atinge seu ponto mais alto.

Considerando a escolha de pneus, tanto Vettel quanto Leclerc escolheram nove jogos do tipo mais macio; Hamilton, Bottas, Verstappen e Gasly, oito cada um. Isso indica que os pilotos da Ferrari devem largar com esses pneus. Mais aderentes, eles podem proporcionar um começo de corrida mais agressivo; menos duráveis, eles obrigarão seus usuários a trocá-los mais cedo. Isso se não houver intervenção do Safety Car - a média histórica revela 50 por cento de chances. Nesse caso, as táticas tendem a se embaralhar e tudo pode acontecer.

Esta aposta tem seus riscos, mas a Ferrari precisa adotar táticas diferentes da Mercedes e agora de uma revigorada Red Bull para virar o jogo. Ambas têm optado por largar com pneus médios, que têm menos aderência mas lhes facultam permanecer na pista por mais tempo até a primeira parada para troca - a ponto de eventualmente dispensar uma segunda. Como lá o desgaste dos pneus é moderado, os macios podem ser uma boa escolha.

UM NOVO GASLY E A LUTA CRUENTA ENTRE MAGNUSSEN E GROSJEAN

Outro ponto de atenção na Alemanha será o francês Pierre Gasly, que teve na Inglaterra, enfim, a atuação que dele se esperava desde o começo do ano. Mas uma vez não basta, e ele precisa confirmar em Hockenheim o brilho que mostrou em Silverstone. Caso contrário, toda a pressão para que seja substituído na Red Bull voltará com força ainda maior.

Ele conta com a valiosa proteção do nem sempre tolerante Helmut Marko, a eminência parda da equipe anglo-austríaca. Assessor do austríaco Dieter Mateschitz, um dos fundadores da empresa de bebidas energéticas que dá nome à equipe, Marko é um ex-piloto de F1 com um dedo de ouro para identificar talentos nas categorias de base e com um coração de pedra para dispensá-los quando suas expectativas não se cumprem.

No GP da Inglaterra, Marko proibiu os engenheiros de Gasly de adotarem acertos diferentes dos usados por Verstappen - apenas pequenas variações sobre o mesmo tema. Segundo ele, a falta de experiência do francês o levava a optar por mudanças tão significativas que não lhe permitiam chegar a lugar nenhum. Deu certo. Depois de uma atuação combativa, Gasly obteve sua melhor colocação na F1, um quarto lugar.

Em Hockenheim, será a hora da confirmação. O bom trato dos pneus é a melhor qualidade do chassi da Red Bull na luta contra a maior velocidade da Ferrari. Mesmo que não reproduza os bons tempos do velocíssimo companheiro Verstappen, Gasly seria recebido com palmas se terminasse a corrida à frente de Leclerc ou Vettel. Isso é o que Helmut Marko parece esperar.

No outro extremo, mas também ameaçados por suas atuações, estão o franco-suíço Romain Grosjean e o dinamarquês Kevin Magnussen. A bordo do decepcionante Haas VF-19, esses dois vêm contribuindo intensamente para transformar em desastroso um ano por si só bem ruim. E são personagens principais na chamada Silly Season, cuja tradução é algo como Temporada de Besteiras, como o paddock denomina as especulações sobre quem vai para onde nos próximos meses.

A equipe, um sonho do bilionário americano Gene Haas (também proprietário de uma equipe da NASCAR), está em seu quarto e pior ano na F1. Mal vista pelas adversárias por construir quase nada de seu carro, ela inovou ao ingressar na categoria comprando tudo que o regulamento permite. Usa motor, câmbio, suspensões, volante, painel e etc. da Ferrari; seu carro é construído pela italiana Dallara.

Por isso, seu orçamento é bem inferior ao das demais, o que não a impediu de bater várias delas no campeonato mundial de construtores. Oitava no ano de estreia, esteve à frente da Renault e da Sauber; também oitava no ano seguinte, superou McLaren e Sauber; quinta em 2018, foi melhor que McLaren, Force India, Sauber, Toro Rosso e Williams.

Assim, não surpreende a Haas ser alvo de galhofas e zombarias neste ano, quando ocupa a nona colocação, superando apenas uma Williams que se debate no que parece ser seu estertor. Para agravar a situação, seus pilotos já se autoeliminaram em dois GPs, o da Espanha e o da Inglaterra - neste último, na quinta curva da primeira volta.

O chefe da equipe, Gunther Steiner, conhecido pelas soluções pragmáticas e eficientes, admite não saber o que fazer. Furibundo, ele não permitiu aos pilotos sequer explicar a batida. Isso porque naquela prova a equipe optou por instalar no carro de Grosjean o pacote aerodinâmico usado no primeiro GP do ano, a fim de compará-lo com o atual, usado por Magnussen.

Após a colisão, se intensificaram as especulações de quem substituirá um de seus pilotos - no caso Grosjean, o mais cotado para a demissão. Mas uma olhada superficial em volta não encontra soluções. Há dois nomes com certa velocidade e experiência em disponibilidade: um é o mexicano Esteban Gutierrez, que não convenceu no primeiro ano da mesmíssima Haas e foi substituído por Magnussen.

O outro é o francês Esteban Ocon, que protagonizou diversas colisões nos dois anos em que integrou a Force India. A maioria foi com o companheiro de equipe, Sergio Perez; a mais famosa, com Verstappen no GP do Brasil, quando era retardatário. Para complicar, Ocon é vinculado à Mercedes. Toto Wolff, o chefe da escuderia alemã, se diz disposto a liberá-lopara outra equipe, desde que seja reembolsado pelo investimento feito no promissor (e um tanto desastrado) piloto Ocon...

Como se vê, o Grande Prêmio da Alemanha promete pratos saborosos para todos os gostos.

Todos esses assuntos serão atualizados por mim e pelo Cassio Politi na próxima edição do podcast Rádio Paddock. Ele pode ser acessado a partir das 11 horas das quartas-feiras no Spotify e em vários outros agregadores. Você também pode ver minha análise de outros fatos sobre a Fórmula 1 no meu canal no YouTube.