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01/06/2006 - 09h00

Copa promove criação de personagens "eternos" fora de campo

Marcius Azevedo e Paulo Luis Santos
Em São Paulo
Uma Copa do Mundo acaba inesquecível não apenas pelo título ou até mesmo fracasso da seleção brasileira. Muitas vezes, personagens marcam nossas vidas e superam lembranças que temos até dos próprios jogos.

Em 1986, um deles em especial se tornou um ícone de uma geração que acompanhou o Mundial do México. O documentarista José Antônio de Barros Freire, que passou uma década filmando e fotografando guerras civis em diversos países, foi convidado pela Rede Globo para gravar vinhetas para a emissora e personificou "Arakém, o showman".

ARAKÉM, O SHOWMAN

Reprodução/
Arakém conversa com São PedroReprodução/
E entra no céu para pedir ajuda

VEJA O VÍDEO DO ARAKÉM
A idéia partiu dos diretores Alexandre Machado e Mimito Gomes, que receberam da emissora a missão de criar um personagem animado, descontraído e divertido para agradar os telespectadores das classes C e D.

A princípio, Arakém foi usado para anunciar a nova programação da linha de shows da emissora em 1983. O sucesso do personagem ampliou o horizonte de atuação que, após grande aceitação, também passava mensagens de utilidade pública.

"Foi uma coisa extraordinária. As pessoas se identificaram com o personagem. Era como um brasileiro comum", relembrou Barrinhos, como é conhecido José Antônio. "A Globo recebeu muitas cartas, telegramas, telefonemas para manter o personagem no ar", acrescentou.

O personagem, cujo o nome foi uma homenagem de Alexandre Machado a um antigo professor de matemática, permaneceu seis anos no ar e obteve sucesso absoluto na Copa, atingindo picos de 60 milhões de telespectadores em criação de Nelson Gomes, da Globotec. A campanha recebeu vários prêmios e entrou para o imaginário popular, principalmente das crianças. "Muita gente assistia aos jogos na TV Bandeirantes e, após isto, colocava na Globo para ver a vinheta".

Com a camiseta da bandeira do Brasil estilizada - que virou moda entre os torcedores -, Arakém personificava o torcedor brasileiro, envolto a mulheres e em situações hilárias. As vinhetas eram, na sua maioria, relacionadas aos adversários derrotados pela seleção.

"O Arakém criticava a seleção assim como todo torcedor queria fazer", comentou Barrinhos. "Então se criou uma identificação muito grande", emendou.

À época, Barrinhos usou o sucesso do seu personagem para fazer campanhas para doação de sangue, recadastramento eleitoral e alfabetização. "Eu lembro que, após o Brasil ganhar da Espanha [na estréia, por 1 a 0], eu estava comemorando no Farol da Barra e uma equipe da TV Globo resolveu me entrevistar. Ao invés de falar da vitória, do personagem, eu alertei para os problemas do país. A reportagem foi usada pelo Jornal Nacional e me deixou orgulhoso", relembrou.

Hoje, aos 54 anos, o documentarista mora no interior de São Paulo e trabalha com produção de vídeos de responsabilidade social e programas para televisão. O projeto mais recente é sobre música erudita e popular para jovens, que deverá ser exibido pela TV Cultura. Além dele, Barrinhos trabalha em um documentário sobre a Opera Yoruba, que será exibida na Nigéria, ao lado da professora da Unicamp Inaicyra Falcão.

Outro trabalho relembrado com carinho pelo documentarista é sobre o fotógrafo francês Pierre Verger, que produziu "Carnaval Brasil anos 40" e, até hoje, tem uma fundação com o seu nome na Bahia. "Quem lembra do Arakém não sabe que existe um profissional sério por trás dele. Tive muito prazer de ter feito o personagem, que ficou marcado para muitas gerações, mas também fico feliz pelos trabalhos que fiz na minha vida", afirmou Barrinhos.

O GAÚCHO DA COPA

Arquivo
Ao lado de Jorginho, em 90Arquivo
Na decisão da Copa de 1994Arquivo
Abraçando Franz BeckenbauerArquivo
Beijando a réplica da taça da CopaArquivo
Marcando presença em Weggis

Já em 2002, quando a seleção brasileira comandada pelo gaúcho Luiz Felipe Scolari conquistou o pentacampeonato, um conterrâneo do treinador também se tornou um personagem inesquecível e até considerado insuportável por alguns torcedores. Clóvis Fernandes personificou o "Gaúcho da Copa".

Clóvis aparecia em todos os jogos do Brasil na Copa do Japão e da Coréia do Sul com uma réplica da Taça Fifa que, segundo ele, pesa quase 8 quilos. A paixão pela seleção começou em 1990, antes do Mundial da Itália.

"Um dia eu estava em casa. Aí vi uma matéria da cidade onde o Brasil iria jogar na Itália e pensei: eu vou ver esta Copa. Falei com minha esposa [Débora] e, 15 dias depois, eu estava desembarcando no aeroporto de Milão e indo de trem para Turim", contou.

Depois disso, o gaúcho acompanhou o Brasil nas Copas de 1994, 1998 e 2002 e, neste ano, já está em Weggis, na Suíça, para acompanhar o período de preparação da seleção de Carlos Alberto Parreira e, em seguida, o Mundial da Alemanha.

O sentimento pela seleção quase supera o amor pela esposa. "Ele sempre diz ter três paixões: eu, a neta [Eduarda] e a seleção", revelou Débora. "Tenho dúvida, mas acho que sou a primeira [paixão dele], pois ele me conhece desde os 17 anos e já estou com 50. Esta maluquice começou na Copa de 90, mas já estou acostumada", acrescentou.

Em entrevista por telefone, direto de Weggis, Clóvis não foi tão convincente. "Eu acho que hoje minha esposa é minha terceira paixão, atrás da seleção e da minha neta", brincou o gaúcho, que elogia também a cidade suíça que serve de quartel general para o Brasil. "Aqui é o lugar ideal para alguém morar. Estou apaixonado", contou.

Clóvis, que é empresário do ramo alimentício, não costuma colocar a mão no bolso para viajar. O sucesso do "Gaúcho da Copa" despertou o interesse de empresas e amigos. "Um dá passagem, o outro o ingresso... Não tenho tanto dinheiro para ficar viajando", afirmou o gaúcho, que acompanhou o Brasil na Copa América de 2004, no Peru, e na Copa das Confederações de 2005, na Alemanha, bancado pela CBF.

Reprodução

Rosenery lançou o rojão, teve seus 15 minutos e foi apelidada de "Fogueteira"

Nem chegou na Copa...
Já Rosenery Mello do Nascimento Barcelos da Silva ficou marcada negativamente como 'personagem' da seleção brasileira só que antes mesmo de uma Copa. Na partida contra o Chile, no dia 3 de setembro de 1989, pelas eliminatórias para o Mundial da Itália, a carioca lançou um sinalizador no gramado e deu início ao episódio que ficou conhecido como "Farsa do Maracanã".

À época, aos 24min do segundo tempo, quando o Brasil vencia por 1 a 0, gol de Careca, o goleiro Roberto Rojas aproveitou o aterfato lançado por Rosenery para cair no gramado e simular um ferimento supostamente causado pelo sinalizador, utilizando-se de um tipo de lâmina que guardada na luva para se cortar.

O árbitro argentino Juan Lostau aguardou em campo durante 20 minutos após os chilenos deixarem o gramado carregando o goleiro e encerrou o jogo, cujo placar oficial foi 2 a 0, já que foi considerado W.O. O Chile precisava da vitória para se classificar ao Mundial, mas ficou fora não só do de 1990 como do seguinte.

Isso porque a Fifa analisou os fatos e, com base no exame de corpo de delito do goleiro que não confirmou queimaduras ou presença de pólvora no ferimento, mas somente uma laceração perfuro-cortante, puniu o Chile, que ficou proibido de realizar jogos internacionais e, por isso, perdeu a Copa dos EUA.

Arquivo/FI

No gramado do Maracanã, Rojas simula ferimento em meio à fumaça do rojão

Rojas, que posteriormente trabalhou muito tempo na comissão técnica do São Paulo, foi banido do futebol, e Rosenery, que ficou conhecida como "fogueteira do Maracanã", teve os seus 15 minutos de fama. À época, aos 24 anos, ela posou nua para a revista Playboy, sendo capa da edição 172, em novembro de 1989.

Oito anos depois da "Farsa do Maracanã", em entrevista à Revista Placar, reconheceu que não soube aproveitar os benefícios da fama e que, ao invés de investir o dinheiro em imóveis, gastou tudo com viagens.

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