Yara Fantoni

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Opinião

De torcedor no Maracanã ao gol pela seleção: o conto real de Paulo Henrique

Há um mês, Paulo Henrique estava nas arquibancadas do Maracanã, um rosto entre tantos torcendo pela seleção brasileira nas Eliminatórias, vivendo o ritual de quem ama futebol: dividir o jogo com a pessoa amada, respirar o estádio, sonhar baixinho. Hoje, ele tem história para contar aos netos. Em Tóquio, de camisa titular, o lateral do Vasco estreou como titular da seleção e marcou. Não foi só um gol no amistoso contra o Japão. Foi o carimbo de um percurso improvável, desses que lembram que o futebol ainda sabe recompensar quem insiste.

PH tem 29 anos e um mapa de estrada no currículo: formado no Londrina, rodou Operário-PR, Paraná, Tubarão, Juventude. Em 2022, virou notícia por um pique de 37,42 km/h no Couto Pereira, estatística de videogame para quem, na vida real, se acostumou a atravessar estádios com o crachá de "operário". Foi essa soma de passos que o levou ao Galo e, depois, a São Januário. Quando Carlo Ancelotti procurou no Brasil um lateral que cruzasse intensidade com coragem para atacar espaço, encontrou um jogador que não tem medo de começar a correr de trás.

A convocação não chegou com pompa. Encontrou Paulo Henrique dentro de um avião, rumo a Santa Catarina, pronto para uma rara folga em família na Data Fifa. Trocar o descanso pelo sonho não foi uma dúvida; foi um gesto instintivo. Recalcular rota, avisar a esposa, refazer mala e voar para Seul. O futebol gosta dessas viradas de última hora, mas é no detalhe que a história fica bonita: há poucas semanas, ele era plateia; agora, foi protagonista, após passe de primeira de Bruno Guimarães.

O Brasil perdeu por 3 a 2, e isso conta. Mas há jogos em que o placar não esgota o significado. Em campo, Paulo Henrique exibiu a versão que o Vasco aprendeu a valorizar: leitura para atacar o espaço, perna firme na recomposição e, sobretudo, personalidade. A comemoração de Ancelotti no gol foi menos um afago e mais um reconhecimento de aposta bem colocada. O italiano sabe que Copas se constroem com certezas, mas também com boas surpresas. PH ainda é a segunda coisa e, para quem quase sempre chegou como coadjuvante, pode ser o começo de uma virada de papel.

No Rio, a torcida do Vasco explodiu, e não por acaso. O último gol de um jogador do clube pela seleção tinha saído em 2012, com Rômulo. Ver Paulo Henrique, hoje referência do time de Fernando Diniz, marcar em amarelo e verde é também enxergar um clube inteiro saboreando o próprio trabalho. O "conto de fadas" que ele mesmo admitiu viver tem o suor de São Januário nas entrelinhas.

Agora, a vida volta a ser corrida. A pressa é para estar à disposição contra o Fortaleza. A seleção segue seu calendário, Ancelotti ajusta listas, e Paulo Henrique retorna ao chão que o ergueu. Entre um voo e outro, fica o essencial: o futebol é um lugar onde a biografia pesa, mas não aprisiona. Quem foi torcedor no mês passado pode ser manchete no seguinte. E quem recebe a chance tardia pode tratá-la como o começo, e não como o ápice.

Há algo profundamente humano nessa trajetória. Não é sobre consagração relâmpago, é sobre merecimento que chega no tempo possível. Paulo Henrique não driblou só um zagueiro em Tóquio; driblou a estatística, o ceticismo, a burocracia de uma carreira que sempre pareceu exigir pedágios extras. Se ele estará na Copa? Ninguém sabe. Mas há certezas que a planilha não mede: quando a oportunidade lhe pediu coragem, ele já estava correndo. E, quando o passe veio limpo, não pensou duas vezes. Gol. Rede. História vivida.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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