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OPINIÃO

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Quem vigia o vigia?

Rogério Caboclo, presidente afastado da CBF - Jorge Adorno/File Photo/Reuters
Rogério Caboclo, presidente afastado da CBF Imagem: Jorge Adorno/File Photo/Reuters

11/06/2021 04h00

A Confederação Brasileira de Futebol voltou a ser alvo de escândalo nos últimos dias com o afastamento do presidente Rogério Caboclo, acusado de assediar uma funcionária da entidade. Este é o quarto capítulo da contestável sucessão presidencial na CBF.

Antes do mandato tampão de Antônio Carlos Nunes, conhecido como Coronel Nunes - e que voltou ao cargo máximo da entidade pelo afastamento de Caboclo — os três presidentes anteriores da confederação — Ricardo Teixeira, José Maria Marin e Marco Polo Del Nero — tiveram problemas com a Justiça e acabaram banidos do futebol pela Fifa.

No nosso país, muitas vezes damos mais atenção aos resultados esportivos que os judiciais e isso reflete na gestão dos clubes brasileiros, pois a CBF é o espelho para as equipes e federações estaduais.

Sob a vigilância da Fifa, a entidade máxima do futebol nacional estipula inúmeras regras, como exigir cursos para que os técnicos profissionais possam obter as Licenças A, B, C e PRO e ficar à beira do gramado, mas quem é que supervisiona este vigilante chamado CBF?

Temos tantos técnicos, jogadores, ex-atletas, profissionais de marketing, entre outros, à disposição do futebol brasileiro, mas a caneta que estipula, dá ordens e comanda o nosso futebol está nas mãos de figuras que nunca tiveram envolvimento real com a bola. A CBF possui no seu quadro de funcionários profissionais gabaritados nas áreas técnicas, mas na administração não sabemos da onde surgiram os que comandam o esporte. Isto se repete nos clubes, pois não há nenhuma exigência para que uma pessoa assuma um cargo de executivo.

Quem assina, organiza a metodologia e coordena o dia a dia de um clube não precisa apresentar nenhum diploma, nenhum curso, basta ter alguma amizade ou laço político para sentar na cadeira da diretoria.

Já um ex-jogador que atuou por duas décadas em ligas de ponta, como Itália, Espanha, Alemanha ou Inglaterra, tem muito mais know how que qualquer um que recém tenha deixado uma sala de aula após algumas horas de curso. Porém, eles são menosprezados e não são convidados para gerir o nosso futebol.

Hoje a CBF, por meio da CBF Academy, organiza vários cursos de formação de treinador, executivos, analistas de desempenho, marketing e gestão financeira, entre outras atividades, e que custam entre R$ 2 mil e R$ 20 mil. Mas nada disto adianta se os cargos de confiança perpetuarem no futebol, pois profissionais capacitados são ignorados em troca favores e amizades.

Há alguns clubes, mas poucos, que estão tentando profissionalizar os seus departamentos de futebol. Vejo que ocorreram mudanças também dentro da CBF, mas a escolha para assumir o cargo de presidente segue nebulosa. Atualmente, o mandatário da entidade é escolhido por meio de votos das 27 federações (votos com peso 3), dos 20 clubes da Série A (peso 2) e dos 20 times da Série B (1).

Isso significa que as entidades regionais representam 57,5% do montante dos votos, além dos 28,3% das equipes da elite do Brasileirão e 14,2% dos times da segunda divisão. Na prática, se as 27 federações escolherem o mesmo candidato, serão 81 votos. Caso os clubes se unam, terão 60 votos. Desta forma, diminuíram ainda mais o peso dos protagonistas do espetáculo.

No último pleito, em abril de 2018, Rogério Caboclo foi candidato único. Me pergunto por que presidentes de clubes, com vasta experiência na gestão do futebol, não são postulantes para assumir a presidência da CBF? Claro, há todo um jogo político e picuinhas por trás disto tudo, pois é necessário ter apoio de outros cinco clubes das Séries A e B do Brasileirão para que a candidatura seja aceita.

Edu Gaspar é anunciado como novo diretor do Arsenal  - Divulgação  - Divulgação
Edu Gaspar foi coordenador técnico da seleção principal por cerca de três anos e hoje é diretor do Arsenal
Imagem: Divulgação

Com o retorno do Coronel Nunes à presidência, o torcedor brasileiro volta a se deparar com uma figura nada conhecida, visto que não sabemos qual é o envolvimento dele com o futebol no passado. Não estou o julgando, mas temos pessoas que poderiam contribuir, e muito, como Paulo Roberto Falcão, Dunga, Cafu, Romário, Zico, Leonardo, Edu Gaspar, Gilberto Silva, entre outros. Eles nos trariam muito mais credibilidade, confiança, segurança e acesso ao que ocorre nos bastidores do futebol.

Há ainda muitas siglas mamando nas tetas do futebol, como a Federação das Associações de Atletas Profissionais (FAAP), que fatura anualmente mais que grandes clubes da Série A. De acordo com a Lei Pelé e com chancela da CBF, a FAAP fica com 0,8% dos valores de transferências de atletas.

Essa mudança tem que partir da CBF, mas também passar pelas federações estaduais e pelos clubes.

*Com colaboração de Augusto Zaupa