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Alexandre Pires, o Bola de Ouro da nossa música

Alexandre Pires durante apresentação da turnê "Baile do Nêgo Véio" - Divulgação
Alexandre Pires durante apresentação da turnê 'Baile do Nêgo Véio' Imagem: Divulgação

10/12/2020 04h00

O futebol e a música são duas importantes manifestações culturais do Brasil. Há décadas trazem consigo uma relação íntima. Tanto que canções de artistas famosos se tornaram parte da trilha sonora dos fanáticos pelo esporte mais admirado no país. E, claro, a minha história não poderia ser diferente.

O cantor se identifica muito com o jogador, porque gosta de futebol ou de algum outro esporte. Já o jogador tem fortes laços com a música porque encontra nela formas de se expressar, tanto no auge quando na queda. São carreiras que têm muita afinidade e têm como particularidade a aproximação com a população, principalmente com as classes mais carentes, que veem a possibilidade de transformação por meio destas atividades culturais.

Tenho relações e laços de amizades com vários músicos, mas há um em especial que mexe comigo: o Alexandre Pires. Sou fã dele e o tenho como um grande amigo.

Nos conhecemos há muito tempo, mas só estreitamos os laços depois da minha aposentadoria dos gramados. À época, ainda trabalhava como gestor no Cruzeiro e havia perdido o meu voo de Florianópolis para Belo Horizonte, onde iria acompanhar uma partida. Sabendo da minha situação, um amigo nosso em comum ligou para o Alexandre e contou o que havia ocorrido. De imediato, o Alexandre se ofereceu para me dar uma carona no seu avião particular, pois ele estava indo para Uberlândia, sua terra natal.

Por serem duas cidades mineiras, muitos acreditam que sejam próximas. Mas salvo o engano. A distância entre elas é de mais de 580 km, ou seja, uma viagem de mais de sete horas de carro. O Alexandre mudou o seu trajeto para me deixar em Belo Horizonte e ali começou uma grande amizade.

Foi algo surreal, pois de repente estava frente a frente com um cara famoso e que eu admirava muito. Acompanhava a trajetória do Alexandre desde a década de 1990, quando ainda estava no 'Só Pra Contrariar'. Quando fui jogar no Japão, lembro que fui atrás de DVDs e CDs da banda para levar comigo. E isso se repetiu quando me transferi para Portugal e Alemanha, já perto do fim da minha carreira.

Apesar da sua ótima condição financeira, ele é uma pessoa simples e não perdeu a humildade dos tempos em que morava na roça. Conversamos sobre inúmeros assuntos, contamos as nossas histórias de vida.

Recordo que na minha infância e adolescência, me chamava a atenção os artistas que me representavam na mídia. Apesar da nossa pequena diferença de idade, de apenas dois anos, o Alexandre Pires me inspirava porque era um negro da roça de numa cidade do interior de Minas Gerais. Por eu também ser negro, me orgulhava ao ver o seu posicionamento e talento, que o levou a ganhar inúmeros prêmios no meio musical ao longo de mais de 30 anos de carreira.

Acredito que ele nunca tenha se atentado ao fato, mas o Alexandre também ditou moda por ter o cabelinho e o bigode na régua e pela postura de se vestir. Ele interferiu muito na minha geração, e sei de inúmeros outros jogadores de futebol que dizem o mesmo.

Assim como eu, o Alexandre também é muito família. Tanto que por ser filho de um baterista, João Pires, e de uma cantora, Maria Abadia, ele começou cedo na música. Aos 13 anos, incentivado pelos pais, começou a tocar cavaquinho e pouco tempo depois já havia se tornado famoso ao criar o SPC, ao lado do irmão Fernando e do primo Juliano.

George W. Bush e Alexandre Pires em evento na Casa Branca, em Washington, EUA (02/10/2003) - Reuters - Reuters
George W. Bush e Alexandre Pires em evento na Casa Branca, em Washington, em 2003
Imagem: Reuters

E estas mais de três décadas dedicadas à música tornam o Alexandre Pires um dos principais ícones da música brasileira mundo afora. Tanto que, em 2003, ele se apresentou numa cerimônia na Casa Branca, em Washington, em celebração ao mês da Descendência Hispânica, que é uma importante ocasião para se cortejar o voto da comunidade latina nos Estados Unidos.

Na plateia estava o presidente George W. Bush, que fez questão de cumprimenta-lo e tirar fotos após o Alexandre tocar e cantar 'Garota de Ipanema'. Este episódio, aliás, mostra a sua humildade e amor pelo Brasil.

Num almoço na casa do seu empresário, o Alexandre recordou que, durante a passagem de som, dedilhou e cantou alguns versos de 'Garota de Ipanema'. A equipe que estava presente no local montando os equipamentos e estrutura para o evento parou para vê-lo e o elogiou. Naquele momento, decidiu que iria se apresentar com este 'hino da música brasileira', o que chamou a atenção do mestre de cerimônia, pois o Alexandre havia sido convidado por ter emplacado três músicas entre as 15 mais tocadas nas rádios latinas dos Estados Unidos.

Alexandre Pires e músico Wyclef Jean cantam na cerimônia de encerramento da Copa do Mundo, no Maracanã - AFP PHOTO / FABRICE COFFRINI - AFP PHOTO / FABRICE COFFRINI
Alexandre Pires e Wyclef Jean cantam na cerimônia de encerramento da Copa do Mundo de 2014, no Maracanã
Imagem: AFP PHOTO / FABRICE COFFRINI

O Alexandre é um artista que tem o dom de se reinventar. Ele se destaca no samba e no pagode, mas também navega em muitos outros gêneros musicais. Tanto que já cantou ao lado de Djavan, Milton Nascimento, Gilberto Gil, Caetano Veloso, Jorge Ben Jor, Martinho da Vila, Chitãozinho e Xororó, Seu Jorge, Thiaguinho, entre outros. Além de estrelas internacionais, como o guitarrista Carlos Santana; as cantoras Kelly Clarkson, Gloria Gaynor, Gloria Estefan, Rosario Flores e Shakira; e os cantores Alejandro Sanz e Rod Stewart.

É muito difícil se manter no topo por mais de três décadas. Assim como os jogadores de futebol que ficam no topo por quatro ou cinco temporadas, em boa parte dos casos, os artistas que não se reinventam acabam consumidos depois de dois ou três anos de sucesso. Mas o Alexandre Pires é empreendedor e se adapta ao mundo moderno. Mesmo sendo um artista com a carreira consolidada internacionalmente, ele faz questão de participar de todas as etapas dos seus projetos. É um astro 360°. O sucesso não para por aí. Em novembro de 2021, fará sua estreia em um cruzeiro temático: o Navio do Alexandre Pires. A atração também terá a participação de mais de dez artistas.

E também há tempo para a solidariedade, pois o Alexandre promove ações sociais. Contanto com o apoio de familiares, artistas e atletas renomados, ele organiza e promove há 20 anos o 'Futebol Contra a Fome', evento beneficente que arrecada cerca de 120 toneladas de alimentos a cada edição.

Alexandre Pires recebe craques para o evento beneficente Futebol Contra Fome - Divulgação - Divulgação
Alexandre Pires recebe craques, como Neymar, Kaká, Denilson, Falcão e Elano, para o evento beneficente Futebol Contra a Fome
Imagem: Divulgação

Em abril, durante a pandemia, o Mineirinho promoveu a live do 'Nego Veio' (turnê de sucesso que realizou mais de 220 shows), que durou cerca de cinco horas e contou com a participação de vários artistas. O evento arrecadou 309 toneladas de alimentos, máscaras e álcool em gel.

Música e futebol andam, sim, lado a lado. Ambos trazem a sensação de festa e comemoração. Basta lembramos que alguns dos nossos craques já se arriscaram no meio musical, e Pelé é o principal expoente. O Rei do Futebol é autor de mais de 100 músicas e parceiro em outras. Interpretou e gravou um compacto ao lado de Elis Regina, além de ter participado de especial de Natal do Roberto Carlos.

Então, como fã, vou embarcar no 'Navio Alexandre Pires' para navegar nos mares de sucesso de grandes artistas.

*Com colaboração de Augusto Zaupa