Topo

Tales Torraga

REPORTAGEM

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

Campeão mundial vítima da covid: como o argentino Luque foi parar no Santos

Luque apresentado no Santos em 1983 - Reprodução Site Futebol Portenho
Luque apresentado no Santos em 1983 Imagem: Reprodução Site Futebol Portenho

Colunista do UOL

16/02/2021 12h00Atualizada em 16/02/2021 13h33

Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail

Email inválido

Raçudo, cabeludo e com seu inconfundível bigode, o atacante Leopoldo Luque foi um dos símbolos da seleção argentina campeã do mundo em 1978. O histórico parceiro de Mario Kempes morreu ontem (15) em Mendoza, vítima da covid-19, aos 71 anos.

Sua última passagem por um clube grande foi pelo Santos, em 1983. A contratação foi anunciada por Milton Teixeira, vice-presidente de futebol do clube, no dia 12 de janeiro. "Virá por empréstimo até o fim de maio, 35 mil dólares pagos ao Deportivo Tampico, do México", declarou Teixeira ao jornal "Folha de S.Paulo", explicando que Luque dificilmente ficaria depois daquele Brasileiro - o Santos foi o vice, perdendo para o Flamengo no explosivo Maracanã com 155.253 torcedores, maior público da história da competição.

Luque chegou ao Santos para ser reserva de Serginho Chulapa e compor um elenco forte que contava também com os pontas Paulo Isidoro e João Paulo - e jogadores esforçados que davam conta do recado como o volante Dema e o lateral-direito Toninho Oliveira. O técnico era o histórico Chico Formiga.

O argentino encontrou pouco espaço ao lado de colegas tão bons. Estava fora de forma, desmotivado e longe da seleção desde 1981. Profissional desde os 18 anos, se queixava do desgaste aos 34 (passou o aniversário sozinho na Praia do Gonzaga e no Boqueirão). Feroz no Rosario Central (1972) e River Plate (1975 a 1980), já vivia o manso declínio do inexpressivo Tampico, no México, em 1981, e do Racing, em 1982, onde jogou 11 vezes (e fez só 2 gols).

Antes de desembarcar na Baixada, Luque conversou com César Luis Menotti, seu técnico no Mundial 1978 e protagonista de uma passagem relâmpago pelo Santos em 1968. "Minha vida foi muito lutada, depois dos 30 não consegui render, mesmo quando tinha uma estrutura ótima, como no Brasil", contou Luque à revista El Gráfico quando anunciou sua aposentadoria em 1986.

O cabeludo argentino vestiu a camisa branca do Santos só três vezes em 1983 - dois empates fora de casa, com Cruzeiro e Moto Club, e um 4 a 1 no Paysandu na Vila. Não fez gols e foi titular só uma vez, contra o Cruzeiro, sem terminar em campo. "O gol saiu na sua única jogada útil", relatou a "Folha".

Entre a saída do Santos e o adeus aos gramados três anos depois, só times pequenos. Ao deixar a Baixada, passou por Boca Unidos, Chacarita e Deportivo Maipú. Tentou ser técnico, mas nunca chegou nem perto da elite.

Look - Reprodução Twitter Masahide Tomikoshi - Reprodução Twitter Masahide Tomikoshi
Com a camisa ensanguentada no título da Argentina em 1978, Luque ergue os braços como Perón
Imagem: Reprodução Twitter Masahide Tomikoshi

Sua impressão final não condiz com a figura de 1978 - tanto que a definição "lendária" é destaque nos principais jornais de agora nas bancas portenhas.

Luque disputou cinco partidas e marcou quatro gols. Luxou o cotovelo contra a França e seguiu em campo - neste dia, o irmão que viajava de carro para vê-lo jogar morreu em um acidente na estrada: "Passarella me deu dinheiro para o velório. Falam que a ditadura nos ajudou, não ajudaram merda nenhuma".

Contra o Brasil, levou uma cotovelada de Oscar e ficou com o olho todo preto. Contra a Holanda, trocou tantos socos com os zagueiros que terminou todo ensanguentado: "Não gosto de ver aquela final, parece uma luta de UFC".

Em 1980, foi sequestrado pela ditadura e abandonado num matagal. "Queriam me assustar numa negociação com o River", declarou. Manteve-se firme, como nas batalhas contra o Estudiantes nos anos 1970 em La Plata: "Muito antes do Branco, metiam droga na água e deixavam do lado do campo. Eu e o Mostaza Merlo passávamos perto e chutávamos aquela porra na arquibancada".