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O Nadalismo nunca foi tão forte

Reuters
Imagem: Reuters

Colunista do UOL

06/06/2022 04h00

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Rafael Nadal conquista Roland Garros pela 14ª vez. Aos 36 anos, tornou-se o homem mais velho a levantar o troféu na história do torneio. E mais: fez isso sem a preparação adequada, prejudicado por uma fratura por estresse em uma costela que lhe tirou de Monte Carlo e Barcelona, e mais prejudicado ainda por uma lesão crônica no pé que exigiu injeções de cortisona para que fosse possível competir no slam do saibro. E fez isso tudo passando por uma chave duríssima, derrotando quatro tenistas do top 10 em sequência: Félix Auger-Aliassime (#9) nas oitavas, Novak Djokovic (#1) nas quartas, Alexander Zverev (#3) nas semifinais e Casper Ruud (#8) na decisão deste domingo.

Um dia antes, Iga Swiatek, número 1 do mundo e fã declarada de Rafa desde sempre, conquistou o título entre as mulheres. Foi a segunda vez em três anos que a polonesa levantou o troféu em Roland Garros. Este ano, de forma ainda mais impressionante, somando 35 vitórias consecutivas no circuito, vencendo quatro WTAs 1000, um WTA 500 e igualando a maior sequência de triunfos do século para a WTA (Venus Williams em 2000). Sim, o domínio do tênis feminino pertence a uma adepta do Nadalismo.

E o que dizer do vice-campeão masculino, o norueguês Casper Ruud? Outro fã assumido do espanhol desde sempre e que se tornou um dos melhores saibristas do circuito desenvolvendo um estilo de jogo modelado à imagem e semelhança do do ídolo, com uso nada moderado de top spin e bolas de alta porcentagem. Ruud é sobretudo um tenista que constrói pontos e gosta do xadrez do saibro, ou seja, de como cada golpe busca não necessariamente a definição imediata do ponto, mas melhorar sua posição e permitir que o golpe decisivo seja desferido na hora certa, na melhor condição possível. Não por acaso, Casper estabeleceu base na Rafa Nadal Academy, em Maiorca, em 2018, e desde então treina nas instalações de seu ídolo.

De volta à chave feminina, é preciso contar a história de Daria Kasatkina, a ex-top 10 que despencou no ranking e vem, aos poucos, reencontrando as vitórias. Nesta edição de Roland Garros, a russa de 25 anos conseguiu o melhor resultado de sua carreira em um slam, chegando às semifinais (perdeu para Iga). E sim, Kasatkina também é uma adepta do Nadalismo. Não só é fã de Rafa desde criancinha como nunca escondeu que sempre tentou copiar o estilo do espanhol. Hoje, joga com muito spin e paciência, buscando bolas de alta porcentagem em vez de juntar-se à pancadaria de rivais que batem mais forte na bola.

E vale ainda citar um quinto exemplo que, se não joga ao estilo do 14 vezes campeão de Roland Garros, juntou-se ao Nadalismo quando contratou Toni Nadal, tio e mentor de Rafa, para ser seu técnico. Falo de Félix Auger-Aliassime, número 9 do mundo que, não por acaso, foi quem mais deu trabalho ao campeão nesta edição do torneio. Nas oitavas, levou Rafa ao quinto set - foi apenas a terceira vez em sua história no evento que Nadal precisou ir tão longe para vencer uma partida.

Não se engane, caro leitor. Não há nada de coincidência entre essas histórias felizes e o fato de quelas aconteceram justamente em Roland Garros, a Meca do Nadalismo. Se Rafa se destaca mais no saibro do que em outros pisos, é justamente porque a terra batida, combinada com o formato de melhor de cinco sets, recompensa algumas de suas maiores qualidades: o espírito de luta, o trabalho do dia a dia, a capacidade de interpretar uma partida e fazer ajustes técnicos e táticos, e a força mental para lidar com os altos e baixos técnicos e físicos durante um embate longo.

Rafa é mestre nisso tudo, e os nomes citados acima - aos quais podemos juntar o jovem Carlos Alcaraz, outro admirador de longa data - não são apenas fãs. São seguidores que tentam reproduzir quando não o estilo de jogo, a postura do veterano dentro e fora dos torneios. Buscando a evolução um dia após o outro, procurando soluções nas partidas e encarando momentos difíceis sem descontar a raiva em árbitros, bolas ou raquetes.

Numa época em que tenistas catimbam e mentem descaradamente, ficam de mimimi por um punhado de pontos no ranking, batem nas cadeiras de árbitros, chamam oficiais de corruptos, vão parar nas páginas policiais por suspeita de agredir namoradas ou fazem pouco caso de um vírus mortal (sim, eu escrevi um parágrafo quase igual uns dias atrás), é bonito ver que o bom exemplo de Rafa, cedo ou tarde, traz resultados aos adeptos.

E não se trata apenas de influenciar ou servir de espelho. Constatar que muitas de suas características hoje são base para a formação de atletas de sucesso e, sobretudo, bom caráter, diz muito sobre o tamanho de Rafael Nadal e seu legado. Muito depois de Rafa se aposentar e deixar o circuito - quando quer que isso aconteça - o Nadalismo viverá nos Ruuds, Aliassimes e Alcarazes da vida. E isso, caros leitores, nem 30 slams conseguem comprar.

Vida longa ao Nadalismo.

Coisas que eu acho que acho:

- Não tanto pelos títulos, mas pela forma como eles vieram, o Australian Open deste ano e o Roland Garros que acaba de se encerrar precisam estar na prateleira de feitos mais memoráveis de Rafa. Digo mais: isso precisa ser levado em conta no debate sobre o melhor de todos os tempos. De qualquer modo, postarei meu ranking dos principais feitos de Nadal em breve.

- Som de hoje no meu Kuba Disco: Dreaming, dos britânicos da Night Flight, por que "did you catch yourself dreaming again?"

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