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McEnroe: 'É melhor que os tenistas mostrem emoção, mas da maneira certa'

John McEnroe em filme publicitário da cerveja Michelob Ultra - Divulgação
John McEnroe em filme publicitário da cerveja Michelob Ultra Imagem: Divulgação

Colunista do UOL

18/05/2022 04h00

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"Só vale se for para curtir" é o mantra da campanha que a cerveja americana Michelob Ultra adota para se colocar no mercado como uma bebida light (78 calorias e 2,4 carboidratos na latinha de 350ml e 74 calorias na long neck de 330ml) e que dá ao consumidor a oportunidade de manter um estilo de vida ativo e saudável sem deixar de apreciar uma cerveja de qualidade.

É um slogan que pode soar como muitos outros do mundo publicitário, mas que encaixa como uma luva na campanha produzida com o ex-número 1 do mundo John McEnroe. E não foi uma campanha nada comum. O filme "McEnroe vs. McEnroe", que será exibido nos EUA nesta quarta-feira, na ESPN, traz uma partida de tênis entre o John de hoje, de 63 anos, e várias versões mais jovens do tenista. Algo que só foi possível com o uso de uma tecnologia de inteligência artificial imersiva (veja o trailer abaixo).

O que isso tem a ver com o blog? Tem a ver que Michelob me convidou para falar dez minutinhos com McEnroe, e o papo, embora rápido, foi delicioso. John falou sobre momentos diferentes de sua carreira e de sua vida e de como nem sempre conseguiu aproveitar e curtir as grandes conquistas dentro de quadra; contou também sobre o esforço para se tornar um ser humano melhor e como a idade - e ter filhos - ajudou no processo.

Sim, lembramos de seu comportamento polêmico em quadra - que lhe rendeu o apelido de superbrat, que em português seria algo como "super malcriado". E aproveitei meu último minutinho para perguntar sobre a nova geração do tênis, os recentes casos de mau comportamento em quadra e como o John de hoje vê isso tudo. Após criticar especialmente Zverev, que recentemente deu uma raquetada na cadeira de um árbitro e quase a acertou a perna do oficial, e Shapovalov, que deu uma bolada violenta no olho de um árbitro, McEnroe disse que gosta, sim, de tenistas que mostram emoções, mas que eles precisam aprender a demonstrar isso de uma maneira mais inteligente em quadra.

Leia a conversa e, mais abaixo, mais detalhes sobre a campanha e o filme "McEnroe vs McEnroe", que estreará no Brasil no dia 24, às 20h30min (de Brasília), na ESPN2, e também estará disponível no Star+.

Eu não consegui ver o filme [houve uma pré-estreia no fim de abril] porque estou no Brasil, mas parece que esse projeto, mais do que qualquer outra coisa, é uma celebração da sua carreira. Então "parabéns" antes de mais nada.

Obrigado.

Qual foi a parte mais interessante para você nesse projeto com a Michelob?

Provavelmente, o que você disse: uma celebração da minha carreira, mas também uma celebração da minha vida neste momento. Acho que o mantra da Michelob Ultra, que é "só vale se for para curtir" é meio como estou tentando viver há algum tempo. Eu acho que não fiz isso tão bem quando estava no circuito profissional. O projeto foi uma grande experiência porque me permitiu ambos. Eu não tinha como perder, e isso é bom. Estamos sempre preocupados em ganhar ou perder e, desse jeito [em um jogo McEnroe x McEnroe], eu ganharia. E também pude olhar para o passado de uma maneira positiva e meio que me divertir com isso. E, assim, olhar para o presente e pensar em mim mesmo olhando para o futuro. Foi a ocasião perfeita.

Você não costuma complicar demais as coisas, mas pensando nesse projeto e em como ele foi concebido, você em algum momento parou para pensar no quanto você mudou como pessoa e também na sua relação com o tênis? Pergunto isso porque todos sabemos da história de Andre Agassi e de como ele fala que odiou o tênis por um tempo. Você nunca odiou o esporte, certo?

Primeiro, é muito mais fácil ser um comentarista do que estar lá, jogando. A recompensa é muito maior, claro, quando você consegue vencer Wimbledon ou o US Open, mas há obviamente estresses e a pressão que você coloca em si mesmo, assim como as pressões que vêm de fora e todo tipo de coisa acontecendo. Você meio que é engolido pelo momento, e quando percebe, já passou. E você pensa: "Por que não curti isso mais?" Então desde que eu parei de jogar, tento trabalhar - quero dizer, eu já tentava quando estava jogando, mas não fazia isso bem. Eu tentava olhar para cada ano da minha vida e me perguntar: "Eu sou um ser humano melhor este ano do que no ano passado?" Acho que ter filhos me ajudou de muitas maneiras em termos de apenas ter paciência, por exemplo. Se você me viu jogar, não parecia que eu tinha muita paciência. O apreço pelas coisas mais simples da vida, que são mais importantes do que se você ganha ou perde um jogo. Eu sinto orgulho de que, pelo menos na minha opinião, eu melhorei um pouco. Pode ser lento, gradativo e com seus altos e baixos, como uma montanha-russa, mas acho que me esforcei e deu resultado. É por isso que coisas assim, este tipo de experiência [o filme com a Michelob] vieram a acontecer, na minha opinião. Acho que outras pessoas também veem isso [a evolução como pessoa], e é ótimo.

Uma das coisas que eu vi com frequência buscando notícias sobre você nos anos 1980 é que frequentemente eu esbarrava na palavra "superbrat", e acho que destacar isso meio que colocava em segundo plano o nível de tênis que você jogava. Olhando para trás agora, o que você sente sobre isso?

É uma boa pergunta. Eu não leio coisas velhas. Eu não olho para trás. Foi a primeira vez [na campanha da Michelob] que fiz algo assim em muito tempo. Acho cômico se me chamarem de superbrat agora, com 63 anos. Mas, ao mesmo tempo, se eu não fosse... Eu vejo isso de duas maneiras: 1) Eu não estaria falando com você agora se algo daquilo não existisse; e 2) Acho que se eu não ganhasse muitas partidas importantes e slams e muitos torneios, eles não se importariam. Se eu fosse número 200 do mundo, eles me descartariam. Tenho que olhar pelo lado positivo. Parte daquilo era minha culpa. Não vou te olhar e dizer "é tudo culpa deles". Parte daquilo foi responsabilidade minha. Eu gosto de pensar que aprendi com aquilo e usar alguns daqueles limões para fazer uma limonada. Gosto de pensar que fiz isso.

Não gosto de comparar épocas porque o tênis muda e a sociedade muda, mas como você vê o tênis de hoje em termos de comportamento dos jogadores? Vimos Zverev quase acertar uma raquetada na perna de um árbitro outro dia, houve Djokovic acertando uma bolada em uma juíza de linha, Kyrgios quase acertou um boleiro outro dia, Shapovalov disse que os árbitros são todos corruptos...

Eles estão terríveis hoje! É preciso olhar para cada caso de maneira individual. Com Djokovic, foi um acidente. E também foi assim com Shapovalov [quando o canadense deu uma bolada no olho de um árbitro de cadeira]. Foi burrice. Você está procurando problemas se bate na bola por frustração daquela maneira. Eu fiz isso muitas vezes. Tentava sempre acertar a grade do fundo de quadra e não um ser humano. Você está em apuros se fizer isso. Zverev perdeu a cabeça. Não sei o que ele estava pensando ao bater com a raquete na cadeira do árbitro. De forma geral, eles se comportam muito melhor (risos). Quando eu jogava, eu, Connors e Nastase éramos como os pacientes tomando conta do hospício! Foi por isso que deixaram as regras mais rígidas. De certo modo, fico feliz... Não estou dizendo que eles [os jovens de hoje] não devem ser punidos, especialmente o Zverev. Não sei o que ele estava pensando. Mas, de modo geral, acho que é melhor para os jogadores que eles mostrem emoção. Honestamente, precisamos mais disso. Só precisamos que eles façam isso da maneira certa.
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Para fazer o filme, a produtora primeiro vestiu McEnroe com um traje de captura de movimentos que registrou seu jeito de sacar, andar e jogar, golpe a golpe. Foram captadas 308 cenas para representar suas características, inclusive frases a serem utilizadas durante a partida. Em seguida, centenas de horas de partidas do americano, de 1979 a 1992, foram analisadas por um software que fez o avatar de McEnroe andar, falar e se irritar como o da vida real. Em outras palavras, foi como criar um personagem de videogame.

Colocar em prática os duelos foi um desafio à parte. Foi criado um telão de fumaça com 10 metros de largura, e o McEnroe computadorizado era projetado ali para que o McEnroe da vida real pudesse ver contra quem estava jogando e de onde vinham as bolas. E as amarelinhas eram disparadas por quatro lançadores automáticos (canhões) sincronizados com o McEnroe computadorizado e posicionados atrás do telão de fumaça. E cada lançador tinha a capacidade de disparar bolas com backspin, topspin e tudo mais exigido para imitar o McEnroe da vida real. Veja abaixo uma prévia:

Coisas que eu acho que acho:

- Tem muito de marketing, sim, na campanha, mas o que diferencia esse tipo de ação é sempre a mensagem e sua capacidade de se provar mais do que um slogan para vender um produto. O "só vale se for para curtir" cai bem no mundo corrido de hoje, onde tantas pessoas buscam tanto ao mesmo tempo e acabam sem tempo de festejar até as pequenas vitórias do dia a dia. Com ou sem Michelob, a reflexão é mais do que válida, e a experiência de McEnroe, que passou por isso e admite na entrevista não ter aproveitado tanto quanto podia, é um recado poderoso. É preciso curtir a jornada.

- A programação do blog voltará ao pré-Roland Garros no fim de semana. O UOL Esporte publica um megaespecial sobre Carlos Alcaraz, o garotão que se transformou na maior sensação do tênis nos últimos dois meses, e o Saque e Voleio traz um texto de prévia do torneio.

- Som de hoje no meu Kuba Disco: Rockin' in the Free World, de Neil Young, porque enquanto eu pesquisava sobre John McEnroe encontrei este vídeo do tenista cantando ao lado de Patty Smyth.

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